Apelidos. Dos Silvas e Sousas aos Janotas e Lindões

A maioria dos apelidos em Portugal têm origem nas profissões dos antepassados, nas povoações onde viviam tetratetravós ou em alcunhas. São nomes para todos os gostos e há casos bem curiosos. O i percorreu os registos do Instituto dos Registos e do Notariado e conta-lhe tudo

José Alho, Cristina Trole, Manuel Pechincha e Joana Banana. Todos estes nomes são fictícios, mas podiam (e podem) existir em Portugal. Existem nomes próprios muito originais no nosso país, mas há também apelidos fora do comum.

O Ministério da Justiça forneceu ao i a lista dos apelidos usados em Portugal no ano passado. Esta é composta por mais de 8 mil termos, mas o i fez uma seleção daqueles que podem suscitar mais surpresa. Com base nestes dados, é apresentada também uma lista dos sobrenomes mais usados no nosso país.

Para tornar a leitura mais fácil (ver páginas seguintes), os apelidos estão divididos por categorias em função da área em que estes nomes costumam ser usados no dia-a-dia, como animais e comida. Se alguns são difíceis de catalogar, outros têm vários sentidos. É a língua portuguesa em todo o seu esplendor.

Origem dos apelidos

Segundo os dados disponibilizados ao i, em 2016 foram registadas 4245 pessoas com o apelido Silva, 2750 com o sobrenome Santos e 2178 com o nome Ferreira. Estes três apelidos ocupam o pódio dos mais populares em Portugal e calham a 10% das crianças nascidas no país, isto tendo em conta o total de cerca de 87 577 bebés nascidos em 2016, segundo dados recolhidos a partir do número de testes do pezinho realizados ao longo do ano passado. Na lista dos nomes mais usados destacam-se ainda 1982 Pereiras, 1841 Oliveiras, 1740 Costas e 1659 Rodrigues.

Se estes são os apelidos mais comuns, existem 5473 sobrenomes que foram registados apenas uma vez durante todo o ano passado: é o caso de Vumbi, Gamelas e Bibe. Além destes apelidos raros, existem outros 1085 sobrenomes que foram registados apenas duas vezes – como Arroz, Bolinhas e Saloio. Há ainda 440 apelidos que foram usados só três vezes – veja-se o caso de Ameixa, Barrote e Galhofas.

Mas, afinal, qual será a origem de todos estes apelidos? É mais fácil encontrar a história dos sobrenomes mais populares mas, através do estudo dos hábitos e tradições do povo português, será possível chegar a uma explicação para a origem de quase todos os nomes.

Até ao século xviii, nas zonas rurais, as pessoas eram, na maioria dos casos, conhecidas pelo nome próprio, no caso dos rapazes, pelo patronímico (nome do lado do pai), e no caso das raparigas pelo matronímico (nome do lado da mãe). No entanto, com o passar dos anos e o crescimento da população, o apelido do pai começou a ser o sobrenome escolhido para identificar os cidadãos.

Para distinguir homónimos, muitos começaram a responder pelas alcunhas, pelas profissões que desempenhavam ou pelas terras onde viviam. Assim, um José filho de um ferreiro teria forte probabilidade de ser registado como José Ferreiro. Famílias nobres muitas vezes acrescentavam o nome da terra que possuíam. Por exemplo, João, dono da terra de Sousa, tinha uma forte probabilidade de se chamar João de Sousa. É de recordar ainda que, até ao século xvii, nem sequer a família real possuía apelidos: os elementos eram tratados apenas pelos nomes próprios e títulos que os distinguiam.

É graças a estas formas de escolher os apelidos que muitos dos termos que, através da descendência, chegaram aos dias de hoje continuam a sugerir os nomes de povoações, profissões, animais, atributos físicos ou até palavras aparentemente sem sentido, como Troco e Tralha.

São várias as obras a debruçar-se sobre a origem dos apelidos portugueses. É o caso de “As origens dos Apelidos das Famílias Portuguesas”, de Manuel de Sousa, ou do “Dicionário das Famílias Portuguesas”, de D. Luís de Lancastre e Távora.

Com base nestes livros é possível perceber a origem de alguns dos sobrenomes mais usados em Portugal. Silva vem do latim silva, que significa selva, floresta ou bosque. Santos era atribuído a pessoas que nasciam a 1 de novembro (Dia de Todos os Santos) e a afilhados de pessoas com estes apelidos.

Para o sobrenome Ferreira é fácil encontrar a origem: estará relacionado com antepassados de lugares onde existia ferro ou minas ou com a profissão de ferreiro. Já Pereira terá nascido numa quinta com o mesmo nome onde existiam muitas destas árvores, propriedade da Casa dos Senhores e Condes da Feira, referem várias obras históricas.