10 de novembro de 1961. Operação Vagô

“Vagô, Romance dos Bichos do Mato”, é um livro de Henrique Galvão. Foi escrito na prisão do Aljube, em 1952, e apreendido pela Pide nas instalações da impressora. Todos os exemplares foram destruídos. Só veria a luz do dia após o 25 de Abril de 1974.

Desde Outubro que a polícia política do Regime tinha informações sobre a possibilidade de uma acção espectacular idealizada por Hermínio da Palma Inácio, o homem que estivera por detrás da sabotagem dos aviões da base aérea da Granja, em Sintra, em 1947. Condenou-se à clandestinidade e, depois, aos curros do Aljube

O próprio dia do golpe estava calculado para 13 de Outubro.

Tratar-se-ia do desvio do avião da TAP que fazia a carreira Lisboa-Tânger-Casablanca-Lisboa.

As medidas de contra-golpe foram accionadas para esse dia: reforço da tripulação, paraquedistas armados junto à porta da cabina dos pilotos, armas distribuídas pelos comissários de bordo.

Entre informações e contra-informações, a PIDE foi levada ao engano.

Praticamente um mês mais tarde, no dia 10 de Novembro, a Operação-Vagô entrou em acção.

Os cabecilhas eram, além de Palma Inácio, Camilo Mortágua, Amândio Silva, Maria Helena Vidal, João Martins e Francisco Vasconcelos.

O Super-Constellation “Mouzinho de Albuquerque” descolou do aeroporto de Casablanca com destino a Lisboa. O comandante chamava-se José Marcelino e a tripulação era composta por 13 pessoas. Cerca de 45 minutos após a descolagem, Palma Inácio invadiu o cockpit e apontou uma pistola à cabeça do comandante. Objectivo do assalto: lançar sobre Faro, Beja, Setúbal, Barreiro e Lisboa cerca de cem mil panfletos denunciando a fraude das eleições para a Assembleia Nacional que teriam lugar de aí a dois dias.

José Marcelino tenta contrariar Palma Inácio. Diz que não tem combustível para sobrevoar Lisboa e regressar a Marrocos. Insiste na impossibilidade de se abrirem janelas de forma a lançar os panfletos. Palma Inácio tinha licença para pilotar aviões comerciais e fora mecânico de aeronáutica. Mantem-se irredutível.

O avião voa a pouco mais de cem metros de altura sobre Lisboa. Os folhetos voam aos milhares sobre a Baixa, o Marquês de Pombal e o Parque Eduardo VII.

Dois caças vêm em sua perseguição. Saíram da base aérea de Monte-Real com ordem de abaterem o “Mouzinho de Albuquerque” no caso deste não aterrar na Portela. Os pilotos dos caças não respeitam a ordem.

O Super-Constellation regressa a Marrocos. O ambiente a bordo é alegre. Os rebeldes confraternizam com os passageiros. São distribuídas rosas às senhoras num gesto cavalheiresco muito próprio de Palma Inácio, conhecido pelos seus dotes de sedutor.

Apesar das pressões do Governo português, os marroquinos não extraditaram os responsáveis pelo desvio da aeronave.

Palma Inácio exilou-se no Brasil.

José Marcelino, o comandante, teve problemas. Suspeito de colaboracionismo, foi interrogado pela PIDE.

Manteve-se ao serviço até aos 80 anos.