O camarada banqueiro…

A vida corre bem a Francisco Louçã. Depois de inventar biombos para a liderança do Bloco, vindo a cena quando lhe convém, exibe agora as insígnias académicas, escreve para os jornais, tem tribuna na televisão e arrecada bons cachets, enquanto zurze na ‘direita’, arrimado aos confortos de conselheiro de Estado – por indicação do ‘seu’…

Depois de antever um futuro radioso a Mariana Mortágua como ministra das Finanças (não se sabe, se sucessora de Centeno…), o guru de falas mansas («esse empedernido clérigo do trotskismo luso, subitamente transformado em suposta consciência bem pensante da presente situação», como escreveu Francisco Assis), goza de surpreendentes favores dos media e aproveita-se dos ventos de feição.

Nem lhe faltou a ‘entrevista de vida’, onde entreabriu a intimidade – ao estilo do confrade Varoufakis. E mal se viu designado para o banco central, apressou-se a ‘malhar’ no governador da instituição, retomando uma das primeiras batalhas perdidas de António Costa (que queria a demissão do governador) logo que se viu alçado a primeiro-ministro pela ‘geringonça’. 

Um mínimo de pudor ético deveria tê-lo aconselhado a não hostilizar quem vai servir como conselheiro. Mas seria contrário à sua natureza.

Por isso, Louçã correu, ligeiro, à Lusa, que ouviu religiosamente o ‘economista’ a libertar-se das suas angústias existenciais, apontando Carlos Costa como «um perigo para Portugal». Não é Sócrates (que até já o convidou, outrora, a que tivesse «tento na língua»), nem Ricardo Salgado – que aguarda sentado, na esperança (como Sócrates) de ‘ganhar na secretaria’ à pala de um qualquer arquivamento. 

Louçã poderia simplesmente ser ridículo, mas é patético. 

É patético ver um dirigente comunista do Bloco de Esquerda, cujas qualificações como ‘economista’ nunca foram testadas fora dos corredores teóricos da academia, acusar o governador do BdP de «impreparação técnica». E que diria de Vítor Constâncio, quando o supervisor foi fustigado com o caso do BPN? 

É colocar-se ao mesmo nível de Joe Berardo, que, por curiosa coincidência, também não poupou o governador, numa entrevista à revista Sábado, com a mesma santa inocência que lhe serviu para ser o ‘cavalo de Tróia’ no BCP.

Berardo fez fortuna nos bons tempos das minas de ouro desativadas na África do Sul, enquanto Louçã teve a fortuna a cair-lhe ao colo com a ‘geringonça’, quando menos esperava. 

Graças aos favores de António Costa, o Bloco e o PCP têm assento no Conselho de Estado. A sinecura de Louçã no BdP veio por acréscimo. 

O espírito ‘gonçalvista’ de 1975 parece estar de volta quando um ministro, todo ufano, já preconiza o PCP e o Bloco num próximo Governo. A justificação é sempre a mesma: em democracia não poderá haver excluídos. 

O problema é que há partidos intrinsecamente avessos à democracia e que apenas fingem respeitá-la, como são os casos do PCP e do Bloco. A quem tiver dúvidas, sugere-se a leitura dos respetivos estatutos programáticos. 

Veja-se, entretanto, a Educação. Marcelo Rebelo de Sousa promulgou a contratação de 3.200 professores precários, embora com algumas ressalvas. Em contrapartida, a população escolar tem vindo a ser afetada pela quebra continuada da taxa de natalidade.

Num estudo recente do Conselho Nacional de Educação, concluía-se que «no ensino secundário regular o número médio de alunos por turma é de 24,5», enquanto no secundário profissional baixa para 17,2, e no vocacional não passa de 16,5.

Assim, segundo o mesmo estudo, «no ensino secundário regular (…) cerca de 50% das turmas estão subdimensionadas» e apenas «3% estão sobredimensionadas»; no profissional, são já 69%; e no vocacional «cerca de 96% das turmas estão subdimensionadas».

O quadro é elucidativo sobre a premência de integrar milhares de professores, ao mesmo tempo que prossegue a destruição do modelo de ensino inspirado pela exigência. 

Onde começavam a surgir os primeiros sinais de sucesso em provas internacionais de Português e de Matemática, reduzem-se os tempos letivos, por troca com bagatelas inspiradas pelo Bloco e pelo PCP. É a moeda de troca.

Nuno Crato bem pode lamentar o destino que o seu sucessor quer dar ao ensino público. A sociedade portuguesa ainda não sacudiu o torpor de que está refém. 

A conjuntura é favorável aos populismos e às derivas ideológicas. A vulnerabilidade da banca, as fragilidades dos media, as demoras na Justiça contribuem para uma enorme permeabilidade às arremetidas do poder instalado. 

Costa sabe-o. E conseguiu pôr Louçã ao serviço dos seus desígnios, com a mira apontada ao governador do Banco de Portugal. A cumplicidade nem sequer usa disfarces. Tem a palavra o ‘camarada banqueiro’…