Fernando Medina culpa o Tribunal de Contas

Obras de Lisboa estão a ser feitas com empréstimo do BEI que o Tribunal de Contas contesta

Nos idos de outubro de 2016, António Costa e Fernando Medina, em cerimónia de encher o olho, fizeram vir a Portugal os banqueiros do Banco Europeu de Investimento, os quais, no Páteo da Galé, anunciaram ao país e ao mundo que Lisboa era a primeira cidade da Europa a receber a honra de ter um grande empréstimo. 

Era assim uma espécie de ‘tango sensual’ dançado entre Fernando Medina e o Sr. Juncker.

António Costa, nesse dia 24 de outubro, anunciou às televisões que ia ser um maná. Lisboa seria uma verdadeira capital europeia. Anunciou escolas, creches, parques de estacionamento, o plano de drenagem. 

Falou de um gigante empréstimo de 250 milhões de euros, com a contrapartida de a CML gastar outros tantos 250 milhões. Ao todo, 500 milhões de euros a serem gastos entre 2016 e 2020, para serem pagos em vinte anos. Chamaram-lhe, naquela habilidade tão socialista de inventar nomes sonantes para banha da cobra, ‘grande plano de investimento’. 

Esse dia, para além de ser um dia aziago por se pedir dinheiro a credores, ainda ficou registado nos anais democráticos. 

É que nada daquilo tinha sido discutido, nem autorizado, pelos órgãos autárquicos. O presidente da CML só levou a proposta à Assembleia Municipal de Lisboa depois do anúncio público. E soube-se que o empréstimo serviria três eixos: regeneração urbana, habitação social e plano de drenagem. Sem mais pormenores. 

Fernando Medina, aliás, aceitou ser protagonista de um filme publicitário do Banco Europeu de Investimento em que, em inglês, explicou – como Eça de Queiroz – que Lisboa era uma choldra e que só o dinheiro do BEI a ia resgatar. Em legenda, o BEI diz que felizmente para Medina o Banco estava lá para o salvar. Está na net para quem quiser ver. Eu senti vergonha por, sendo portuguesa e residente em Lisboa, de alguma forma me ver envolvida naquilo.  

Eis senão quando o mês de março de 2017 nos trouxe novidades. Deu entrada na Câmara uma proposta de alteração do contrato celebrado com o Banco Europeu de Investimento. Era necessário modificar o contrato já celebrado. Por indicação do Tribunal de Contas, que levantou umas duvidazinhas pertinentes. 

Em primeiro lugar, disse que a cidade de Lisboa estava demasiado endividada. Portanto, o município tinha feito um contrato em que a primeira tranche do empréstimo iria até 100 milhões de euros, mas tal não seria autorizado. Autorizado só seria metade desse valor (51 milhões de euros).

Em segundo lugar, o Tribunal de Contas queria maior detalhe sobre os projetos a financiar. Sem surpresa, descobriu-se que estava lá tudo o que anda a ser feito na cidade: desde as obras no eixo central, às obras nos bairros municipais.

É tudo com dinheiro emprestado. Mas se as obras estão a ser feitas com dinheiro emprestado, então pergunta-se: para onde vai o dinheiro do IMI, os impostos, as taxas do turismo, as vendas de património?

Fernando Medina cumpriu o que o Tribunal de Contas ordenou, com o ar de quem estava a engolir óleo de fígado de bacalhau, mas chamou-lhe «força de bloqueio». Já avisou que até vai falar com António Costa para mudar a lei. O primeiro-ministro é homem bem capaz de lhe fazer a vontade.

sofiarocha@sol.pt