O ‘príncipe do povo’…

Já se escreveu e disse quase tudo sobre o primeiro ano de mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa. A sua popularidade continua em alta – e ele aparenta estar-lhe rendido. Onde quer que apareça – e aparece muito -, rodeiam-no gente anónima, desejosa de uma selfie, e gente com nome na praça, ciente de…

Foi sem inocência que o primeiro-ministro em exercício optou por  colocar na rede social Twitter uma foto, que correu célere, na qual aparecia nos arredores de Paris, num 10 de Junho chuvoso, a abrigar o Presidente… com o seu chapéu de chuva. 

Valha a verdade que o Presidente lhe retribuiu o gesto, com ‘juros de mora’ e o bom resguardo de um ‘escudo protetor’. 

Para António Costa, urge maquilhar a derrota eleitoral que o persegue. A ‘cambalhota’ que deu, justifica, contudo, uma séria reflexão, até por ter sido salvo, in extremis, por uma esquerda estalinista que, quase um século depois, ainda se recusa a condenar no Parlamento o autor do ‘Holocausto ucraniano’.

Duvida-se que seja virtuoso andar de braço-dado com tais companhias, quando já se ouvem as fanfarras do PCP anunciando as celebrações do centenário da revolução bolchevique, com o Bloco à trela. Será o cair da máscara.

Decorrido um ano sobre a sua investidura presidencial, após uma vitória pessoal retumbante, Marcelo Rebelo de Sousa terá de acautelar a usura da palavra e o desgaste de uma ‘omnipresença’. E precisará de intuir que, até mesmo quem o seguia religiosamente aos domingos nos comentários televisivos – e vibrava com as suas farpas -, começa a sentir cansaço de o ver e ouvir todos os dias, sempre seguido de perto pelos media.  

O estudo de uma empresa especializada sobre a exposição mediática de Marcelo no primeiro ano de mandato é bastante elucidativo. Mais de mil horas de presença nas televisões, o dobro do que aconteceu com Cavaco em período idêntico. É excessivo. 

Se o antecessor pecava pelo porte austero e distante, Marcelo exagera nos ‘afetos’ e no à-vontade com que vai sozinho a banhos em Cascais, ou às compras, em segurança mínima.    

Poderá alegar-se que é um estilo. Comunicador nato, o Presidente domina tão bem as técnicas de enfrentar as câmaras como os contactos de rua. Mas se um dia surgir uma situação séria de crise, que implique dirigir-se ao país de rosto fechado, é fundamental ser ouvido no meio do ruído. Sem interferências. 

Nesse cenário, nem sequer improvável, escusará de contar com o beneplácito da ‘geringonça’. Não será poupado, como já se viu com o destempero de João Galamba quando o acusou de estar «profundamente implicado» no caso da Caixa.

Ora, o caso da Caixa – nunca é demais escrevê-lo -, para além da inacreditável trapalhada e inépcia envolvendo o Governo, é de uma extrema gravidade quando estão em causa prejuízos e imparidades escandalosas no banco público, retrato pungente do Estado clientelar que floresceu em Portugal.

Pode ser apetecível a Marcelo rever-se nos 18.342 artigos que a imprensa lhe dedicou, favoráveis na esmagadora maioria. Pode ser estimulante ‘mudar a agulha’ a favor da presidencialização do regime, sem que o Governo possa opor-se. Pode ser confortável ter um primeiro-ministro na mão, cuja sobrevivência política depende dele em quase tudo. Pode ser, ainda, uma tentação enfraquecer Pedro Passos Coelho na oposição e fazê-lo resgatar a ‘maldade’ do «catavento», mesmo sabendo que não há no PSD uma alternativa credível. 

Mas deverá precaver-se – apesar da genuína espontaneidade popular captada por uma jornalista do Expresso – em relação a quem o compara a um «Príncipe do povo».  

As coisas não confirmam a euforia dos serviçais da propaganda. E os portugueses devem estar preparados para um forte ‘aperto de cinto’  ou, mesmo, para um empobrecimento súbito, se vingarem as teses do PCP, do Bloco e da ala esquerda do PS conducentes à saída do euro e da União.

Uma nova vaga de austeridade será ainda mais penosa e duradoura. Porque o país não resiste por muito tempo a uma dívida pública imparável, já superior a 130% do PIB; nem a custos de financiamento dessa dívida, em escalada contínua, exprimindo as reservas dos mercados; nem a um débil crescimento económico, quando seria necessário um grande salto em frente; nem à competitividade em recuo.

A Europa e o mundo não estão para brincadeiras. E, por cá, a esquerda comunista sente-se já encorajada a celebrar o despertar de uma ditadura. O fracasso da União Soviética, a queda do Muro de Berlim não foram suficientes para dissuadir o PCP. Espreitam hoje o populismo como tábua de salvação dos amanhãs que cantam’  para asfixiarem o futuro. O Presidente que não se distraia!…