EUA e China. Confronto, normalidade e um foguetão coreano

O governo americano terminou a primeira viagem pela Ásia no território do seu rival declarado, mas sem sinais de confronto. Mesmo perante nova provocação coreana

O primeiro grande contacto entre o novo governo americano e o seu mais que declarado rival estratégico conseguiu ignorar quase por completo as pedras que se vão amontoando nos sapatos da sua já instável relação diplomática. E algumas delas acumuladas nos últimos dias. Rex Tillerson – o empresário virado secretário de Estado – disse ontem ao líder chinês que, ao contrário do que o seu presidente dá muitas vezes a entender, Washington procura melhores laços, diálogo e cooperação com Pequim. Ao seu lado, Xi Jinping escolheu o mesmo tom: “Diz que as relações entre a China e os Estados Unidos só podem ser amigáveis – manifesto o meu agrado por isto”, disse na capital chinesa, a poucas semanas de se encontrar pela primeira vez com Donald Trump no seu resort de golfe preferido, que é, coincidentemente, a sua propriedade favorita.

Tillerson e Xi vestiram ontem a melhor cara dos seus governos. Mas apenas por mútuo acordo. Os dois países não deixam de estar em lados opostos da balança do poder regional asiático e em pé de confronto diplomático pelas reivindicações chinesas no mar Meridional da China. China e Estados Unidos têm outros pontos de conflito e um deles – talvez por estes dias o maior – deu sinais de vida apenas horas antes de Xi e Tillerson falarem aos jornalistas em Pequim. A Coreia do Norte anunciou um teste ao primeiro motor de grande impulsão construído no país, classificando-o, em primeiro lugar, como um “renascer” da sua indústria de propulsão e dizendo depois que pretende usar o novo motor para lançar satélites modernos para o espaço, o que, aos olhos de todo o mundo, é apenas um álibi para avançar com tecnologia de mísseis intercontinentais, o grande receio americano.

Tentar o normal

O encontro entre Tillerson e Xi foi, acima de tudo, uma primeira tentativa de normalidade entre os dois governos depois da eleição de Trump. O presidente chinês, aliás, vê aproximar-se um difícil congresso partidário em que terá de apontar um sucessor que, argumentam os especialistas, pode revelar-se apenas uma fachada para o atual líder prolongar o controlo desde os bastidores. Trump, por seu lado, parece querer preservar alguma normalidade antes do encontro nos Estados Unidos, embora na sexta-feira tenha repetido no Twitter o argumento de que Pequim não faz o suficiente para controlar Pyongyang, que depende das suas contribuições económicas. A imprensa americana, aliás, escreve que Tillerson discutiu sobretudo os preparativos para a visita de Xi.

Para os aliados, porém, a conversa foi outra. Antes de visitar a China, Tillerson passou pelo Japão e Coreia do Sul, anunciando que o novo governo está disposto a considerar todas as escolhas para lidar com a cada vez mais capaz tecnologia balística e nuclear norte-coreana, incluindo, disse, lançar um ataque preventivo. Como escrevia o “New York Times” este fim de semana, porém, os meios militares americanos sabem que a estratégia de um ataque preventivo é altamente arriscada e tem poucos proveitos. Por outras palavras: a ameaça é a própria estratégia. E no sábado, já com Tillerson em solo chinês, Pequim pediu aos americanos que tivessem “frieza”.