FC Porto-V.Setúbal. Rir da desgraça alheia sempre foi coisa feia. E já todos sabem porquê

O Dragão engalanou-se para celebrar a subida à liderança, mas do outro lado havia um adversário valente. Alicerçados numa vontade férrea, os sadinos arrancaram um precioso 1-1 e terminam a época sem perder com os dois primeiros

No futebol como na vida, há máximas que se devem levar a preceito. Coisas repetidas vezes sem conta, ladainhas dos tempos dos nossos avós que são, na verdade, ensinamentos preciosos. Há um especificamente que tem muitas variantes: uns conhecem-no como o provérbio “não faças aos outros o que não queres que te façam a ti”; outros aplicam o mais simplista “cá calharás”; outros ainda, os mais misticistas, falam de karma. Tudo isto a propósito da corrida acérrima pelo título nacional de futebol, que neste fim de semana, em teoria, reservava um confronto complicado para o líder Benfica (visita a Paços de Ferreira) e outro nem tanto para o perseguidor FC Porto (receção ao Vitória de Setúbal).

Como se previa, o encontro das águias foi, de facto, muito difícil e terminou como começou: a zeros – curiosamente, o mesmo resultado que o próprio FC Porto havia conseguido na Mata Real. Depressa choveram piadas, memes e gifs nas redes sociais a troçar dos encarnados, que há umas semanas pareciam caminhar tranquilos para a conquista do inédito tetracampeonato, mas que agora, de súbito, viam a liderança fugir pela primeira vez em vários meses.

certezas de café

A subida azul-e-branca à liderança, pela primeira vez esta temporada, era vista como uma certeza inquestionável por portistas e muitos sportinguistas, que vibraram mais com o tropeção do rival de Lisboa do que com a própria vitória caseira sobre o Nacional (2-0), mercê de mais um bis do salvador Bas Dost. Esqueceram-se, como tantas vezes acontece por entre os adeptos de futebol – todos, sem exceção –, que nenhum jogo está resolvido nem nenhum desfecho está certo antes de o jogo começar.

E a verdade é que ainda faltava ao FC Porto superar, de facto, o Vitória de Setúbal dentro do campo. O estado de euforia era imenso, o Dragão estava a rebentar pelas costuras. Sem poder contar com os castigados Maxi Pereira e André André, Nuno Espírito Santo escalonou os mexicanos Layún e Corona – este, uma meia surpresa: não aparecia no onze desde que se lesionou com o Boavista, a 26 de fevereiro. Mas foi precisamente Corona a desbloquear um encontro que começava a assumir contornos de desesperante para os dragões: muitos remates, muitos calafrios para a baliza de Bruno Varela… mas a bola não entrava – quer pelo acerto do guardião formado… no Benfica, quer pela desinspiração dos atacantes azuis-e-brancos – Brahimi ainda agora deve estar a pensar naquela bola que Vasco Fernandes cortou em cima da linha…

Mas, lá está, havia Corona para resolver: em cima dos descontos, o mexicano apontou um golaço, sem deixar a bola cair na relva após cruzamento da esquerda de Óliver. E a toada manteve-se com o início da segunda parte: um FC Porto calmo, a controlar as operações e a rondar a baliza dos sadinos, com Brahimi e Corona mais uma vez a cheirar o golo.

Eis que, de repente, surge o golo do Vitória de Setúbal… no único remate que os comandados de José Couceiro fizeram na segunda parte. O lance começou com uma investida de Nuno Pinto: o lateral esquerdo subiu pelo seu flanco e, a chegar ao último terço, cruzou para a área. Aí, aconteceu o pecado mortal: Felipe escorregou, deixando João Carvalho receber a bola sem qualquer oposição. O reforço de janeiro – emprestado… pelo Benfica – irrompeu pela área e, com classe, picou a bola sobre Casillas, fazendo um golo até àquela altura quase impensável.

A partir daqui, voltou tudo ao mesmo: um FC Porto a massacrar, mas sem grande lucidez, e um Vitória quase imaculado no capítulo defensivo. André Silva ainda cabeceou ao poste, antes de dar lugar a Depoitre – a entrada do belga, regra geral, é sempre sinal de desespero portista. E foi essa a imagem final de um encontro que teve sete minutos de compensação (a juntar aos cinco da primeira parte). No final, a desilusão foi evidente entre os atletas azuis-e-brancos – Felipe acabou ajoelhado – e nem Nuno o escondeu. “Frustração, tristeza, deceção, são sentimentos que refletem como estamos. Agora temos de saber o que se passou, reagir animicamente e levantar-nos rápido”, foram as palavras do técnico portista na véspera do clássico na Luz (como quem diz, pois só se jogará a 1 de abril).

Uma palavra para o Vitória de Setúbal, que “acaba” a temporada sem perder com Benfica e FC Porto: uma vitória e um empate com as águias e dois empates frente aos dragões. É a única equipa que o pode dizer – e também a que mais pontos roubou aos dois primeiros classificados do campeonato.

 

duas boas surpresas Nos outros jogos deste domingo, destaque para as reviravoltas de Feirense e Marítimo. Os fogaceiros estiveram a perder por 2-0 na receção ao Chaves, mas acabaram por vencer por 3-2 e assegurar quase a 100 por cento a permanência; já os madeirenses bateram o Arouca por 3-1 e cimentaram o sexto lugar, agora com cinco pontos de vantagem sobre o Rio Ave, que caiu na visita ao quinto, o Vitória de Guimarães: 0-3.