43 anos de grandes momentos económicos

Portugal atravessou grandes e dramáticos momentos económicos nestes últimos 43 anos com três resgates internacionais

O último em 2011 e que ainda está marcado na memória dos portugueses por ter implicado sacrifícios mais pesados durantes mais de três anos. O país entrou na Comunidade Económica Europeia em 1986, hoje União Europeia, que teve na sua origem a intenção de fomentar o progresso económico, a liberdade e uma paz duradoura entre os estados vizinhos da Europa.

E há 15 anos começou a circular a moeda única, pondo fim ao escudo, com Portugal a ser um dos 11 países fundadores do euro. Um euro valia e vale 200,482 escudos. As duas moedas circularam em simultâneo entre o dia 1 de janeiro e o último dia de fevereiro de 2002. Quarenta e três anos depois da democracia, 31 da adesão à Europa e 15 de moeda única, a esquerda apoiante do governo, com destaque para o PCP, anda na rua a propor a saída da zona euro.

 

1977. Primeiro resgate financeiro a Portugal

O Fundo Monetário (FMI) aterrou pela primeira vez em Portugal, em 1977, quando Ramalho Eanes era Presidente da República e Mário Soares era primeiro-ministro. Medina Carreira ocupava o cargo de ministro das Finanças. Nessa altura, o cenário não era animador: o país apresentava uma taxa de desemprego superior a 7%, contava com bens racionados, uma inflação crescente, conflitualidade política e o escudo desvalorizado. E devido às dificuldades sentidas em obter financiamento externo, as autoridades portuguesas foram “obrigadas” a efetuar um acordo de estabilização económica com o FMI.

Ao contrário do que aconteceu em 2011, a entrada do organismo internacional em Portugal foi bastante mais discreta, mas apesar de não ter tido grande impacto mediático teve como consequência política um acordo de incidência parlamentar entre o PS e o CDS.

Ainda assim, a entidade internacional implementou várias medidas que se traduziram em redução de salários e subida de impostos, entre outras. Apesar do FMI ter conseguido resolver os problemas a nível de liquidez, não conseguiu evitar totalmente o problema da desvalorização da moeda.

“O acordo era inteligente porque o FMI não nos obrigava a baixar a inflação de forma absurda. Para eles, e para nós também, baixar a inflação era um objetivo secundário. Os objetivos principais eram resolver o problema da balança de pagamentos e conseguir crescimento económico. E conseguimos crescimento económico. Felizmente, no nosso caso, nem eles nem nós pensávamos que era preciso baixar a inflação. E foi ótimo. Poucas vezes o FMI fez acordos com sucesso como aconteceu com Portugal”, chegou a admitir José da Silva Lopes.

 

1983. Ajuda internacional regressa ao país

A segunda intervenção do FMI ocorreu em 1983, durante o período do chamado bloco central – um governo de aliança entre PS e PSD, liderado por Mário Soares. Foi considerado quase um governo de emergência nacional, criado por se considerar que seria a melhor forma de combater a grave situação económica do país. A pasta das finanças estava entregue a Ernâni Lopes e foi negociado um empréstimo de 750 milhões de dólares.

E mais uma vez, o cenário não era animador: o desemprego estava acima dos 11 % e uma dívida externa galopante devido à subida das taxas de juro internacionais. Os remédios da troika voltaram a repetir-se: cortes nos salários da função pública, aumentos de preços, travão ao investimento público e cortes nos subsídios de Natal, entre outras medidas.

O ex-ministro das Finanças, Braga de Macedo, chegou a revelar que não havia escapatória possível e, por isso mesmo, Portugal voltava a precisar da ajuda do FMI. “Havia consenso na classe política? Houve necessidade. Era essencial chamar, porque senão não conseguiríamos sequer pagar as importações. Naquela altura era capacidade de, inclusive, importar comida”, sublinhou.

A verdade é que de acordo com o ex-economista chefe do FMI, Kenneth Roggof, “os programas do FMI em 1977 e 1983 em Portugal tiveram um enorme sucesso. O país cresceu”. Uma realidade encarada de forma diferente por parte dos portugueses, uma vez que, o descontentamento imperava nas ruas. Os trabalhadores protestavam contra o corte do subsídio de Natal, contra os cortes salariais e contra os despedimentos.

 

1986. Portugal adere à CEE

Mário Soares pediu a adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE) em 1977, assinou a entrada em 1985 e aderiu no ano seguinte, em simultâneo com a Espanha, naquele que foi o terceiro alargamento do grupo europeu. O presidente da Comissão Europeia, Jacques Delors, na cerimónia de assinatura do tratado de adesão, realizada no claustro dos Jerónimos, garantia que era um “momento histórico” para Portugal e para a Europa, dizendo mesmo que “a nossa Europa ficaria órfã de pais ilustres” sem a presença de Portugal nas Comunidades Europeias.

A verdade é que a entrada de Portugal na CEE foi o passaporte que permitiu ao país atravessar a ponte para a modernidade. Ao mesmo tempo que possibilitou o acesso aos mais variados fundos comunitários. Até agora a economia nacional recebeu mais de cem mil milhões de euros, apesar do seu destino ser muitas vezes questionável. O dinheiro vindo de Bruxelas tinha como missão ajudar o nosso país a viver melhor, mas ao longo dos anos existiram os mais variados “erros” na aplicação. Projetos estruturais e de coesão tinham por objetivo desenvolver o país e, acima de tudo, aproximá-lo da média europeia, o que não veio a  acontecer.

O antigo secretário de Estado dos Assuntos Europeus e ex-eurodeputado, Carlos Costa Neves, chegou a considerar que a “execução nacional contribuiu para o desenvolvimento de Portugal, mas há que reconhecer alguns erros cometidos, nomeadamente na aposta excessiva em infraestruturas, principalmente as rodoviárias”.

O que é certo é que Portugal ficou conhecido por muitos como o país do “alcatrão”. E os números vão a esse encontro: só nos primeiros cinco anos do QREN (2007-11), ao abrigo do Feder (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional), o dinheiro europeu ajudou a construir mais de três mil quilómetros de estrada. 

 

2002. Entrada da moeda única

As notas e moedas de euro entraram em circulação em 1 de janeiro de 2002 em 12 países da União Europeia, entre eles Portugal, com o nosso país a ser fundador de um dos símbolos da integração europeia. As contas de conversão eram simples: um euro valia 200,482 escudos. As duas notas circularam em simultâneo entre o dia 1 de janeiro e o último dia de fevereiro desse mesmo ano.

Mas apesar da simplicidade, os portugueses rapidamente sentiram o peso da inflação. E isso é visível em coisas tão simples, como o preço de um café que, de 2001 para 2002 passou de 50 escudos para cerca de 50 cêntimos de euro e levou muitos portugueses a pensar que estavam a pagar o mesmo, quando na verdade estavam a pagar o dobro (cerca de 100 escudos).

O que é certo é que os preços acentuaram-se nos mais variados produtos e serviços, com especial enfoque nos transportes públicos, automóveis e combustíveis.

O presidente da Confederação de Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, chegou a admitir que nesse período “existiu bastante confusão. As pessoas compravam sem ter noção do que é que estavam a pagar. Pouco a pouco começaram a perceber que 1,50 euros, que parece pouco dinheiro, são 300 escudos”.

A moeda única foi-se enraizando, mas é cada vez mais natural ouvir partidos, como o Partido Comunista, a afirmar que é necessário abandonar o euro e regressar ao estudo. E explica: deste a entrada da moeda única a economia cresceu muito pouco, o desemprego aumentou, a dívida agigantou-se e um quarto dos portugueses continua na pobreza.

 

2011. Troika entra pela 3ª vez em Portugal

Há muito que se falava na necessidade em pedir ajuda externa, numa altura em que as finanças públicas estavam de novo à beira da rutura, mas o pedido de ajuda à União Europeia e ao FMI acabaria por ser anunciado por José Sócrates, primeiro-ministro demissionário, a 6 de abril de 2011. “O governo decidiu dirigir à Comissão Europeia um pedido de financiamento”, disse, numa declaração ao país pela televisão, onde apareceu ao lado do ministro das Finanças, Teixeira dos Santos.

Um cenário que já tinha sido avançado nesse mesmo dia pelo ministro das Finanças a um jornsal económico. “O país foi irresponsavelmente empurrado para uma situação muito difícil nos mercados financeiros. Perante esta difícil situação, que podia ter sido evitada, entendo que é necessário recorrer aos mecanismos de financiamento disponíveis no quadro europeu em termos adequados à atual situação política”, explicou Sócrates. Seis dias depois chegava a Lisboa a troika – FMI, Comissão Europeia e BCE -, para negociar um programa de ajustamento em troca de um empréstimo de 78 mil milhões de euros em três anos. O memorando de entendimento, aprovado a 17 de maio pelos ministros das Finanças da zona euro, traduziu-se em medidas com pesados sacrifícios para os portugueses. A bem das contas públicas, mas à custa de desemprego, cortes salariais, aumento de impostos e empobrecimento.

Três anos depois, Portugal saiu do programa de ajustamento de forma “limpa” sem programa cautelar. Ou seja, o país regressou ao mercado de dívida para se financiar, sem mais ajudas externas. O anúncio foi feito por Passos Coelho, primeiro-ministro, em 2014, e justificava esta decisão com o facto de o país ter uma almofada financeira que lhe permitia resistir a eventuais sobressaltos dos mercados. Ainda assim deixava um alerta: Portugal tinha pela frente um longo caminho para percorrer e que o rigor orçamental seria para se manter.