Nuno Crato: ‘tenho a pior opinião possível sobre a comissão europeia’

Nuno Crato, ex-ministro de Passos, critica a burocracia europeia e diz que o Brexit será pior «para nós do que para eles». Os «sindicatos mais radicais» têm uma influência na educação «muito além dos que estão sindicalizados».

Para aqueles que achavam que só os eurocéticos andavam descontentes com o projeto europeu, Nuno Crato providenciou um esclarecedor jantar/debate no Grémio Literário, a convite do Clube de Impresa dirigido por Dinis de Abreu.

Pelos vistos, até os europeístas se encontram insatisfeitos com o estado da União Europeia e pretendem mudanças. Crato, que foi ministro de um Governo fortemente defensor da linha europeia, disse mesmo ter «a pior opinião possível sobre a Comissão Europeia» em resposta a questões oriundas de uma mesa que não a sua. O jantar foi peixe, a sopa era de camarão. O tema em torno de Portugal na Europa.

«Tive reuniões várias vezes humilhantes com funcionários de quarta categoria na União Europeia», revelou o antigo governante com a pasta da Educação. «O comissário aceitava e o funcionário não». Diziam-me: «Não pode por isto no programa de Governo!», lamentou o académico, sobre o processo negocial dos governos em Bruxelas.

Acerca do futuro da União Europeia, Crato recomendou «bom-senso e desburocratizar».

«Era muito importante rever a burocracia europeia», na medida em que «há pessoas com vidas privilegiadas em Bruxelas que aumentam a burocracia» de modo a manterem esses privilégios. Para Crato, a ‘capital’ da União Europeia «reúne todo o tipo de vida de corte que existe no funcionalismo europeu no mesmo sítio».

«Precisava de uma volta mas não estou a ver que aconteça…», disse ainda.

Sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, Nuno Crato previu que «o Brexit será mais prejudicial para nós do que para eles». Os ingleses, afirmou o orador: «Fazem falta à Europa», tendo em conta que «não são tão românticos quando os franceses nem tão distantes quanto os alemães».

E a UE no futuro? «É impossível a Europa federal. Tem de ser uma Europa de Nações».

No início da intervenção, saudou Guilherme d’Oliveira Martins, que entrou para o liceu no mesmo dia que Nuno Crato, e citou, com algum humor, a benção que os padres davam às escolas locais cada vez que inaugurava uma como ministro. «Casa do saber e a casa da verdade», recordou Crato, que se diz muito orgulhoso dos resultados do PISA em 2015.

«Tenho imenso orgulho. Foram os melhores resultados de sempre. Estivemos à frente da OCDE e dos alunos finlandeses. A taxa de retenção [os chumbos] baixou em 2,2%». Contou o ex-ministro que «as pessoas estão interessadas em saber o que se passou com Portugal».

«Há um país que fez tudo certo, que é Portugal, disse a OCDE. Há um país que percebeu coisas antes de nós, disse um ministro inglês». Crato considerou que o que correu bem foi «a melhor atenção aos resultados», em algo que é «fator decisivo para o progresso das nações: a educação».

O professor recordou o «antigamente» em que «os bens pensantes da educação perguntavam ‘que interessa isso do ranking internacional?’ e em que era proibido divulgar os resultados das escolas».

O que o seu ministério trouxe, defendeu, foram «programas e metas exigentes».

«Nós progredimos quando temos metas. Inovação acho ótimo. Melhoria acho melhor. Inovação para destruirmos é que não. Um tipo com sentido crítico sem conhecimento é um tirano ou um fala-barato», realçou também.

Questionado acerca do protagonismo sindical na pasta da educação, o independente respondeu: «Muitas vezes alguns sindicatos mais radicais têm uma influência na educação muito além dos que estão sindicalizados. Parece que capturaram os interesses da educação como se fossem os deles e não deve haver um domínio assim».

A seu ver, o problema é outro. «Não existe pressão suficiente da opinião pública para criar consensos sobre a educação». «Os direitos dos professores são fundamentais, mas também é do interesse dos professores que os seus alunos aprendam», não hesitou. No que diz respeito a políticas públicas, Crato disse ter uma visão: «A perspectiva liberal funciona. A perspectiva de por o Estado a decidir não funciona. Não podemos pensar que cada concelho tenha uma universidade».

Oliveira Martins interveio e saudou o orador. «Não tive qualquer dúvida em estar ao lado do meu amigo Nuno Crato. A educação é uma questão nacional. A exigência, o rigor, o conhecimento e a avaliação são absolutamente fundamentais».

Para Oliveira Martins, «os resultados são a médio prazo e é indispensável garantir as questões de durabilidade ao investimento da educação» para formar cidadãos livres, responsáveis e conhecedores.

Crato retomou a palavra e falou sobre ideias para o futuro. «O ensino profissional é decisivo e em contacto com as empresas». Durante o seu mandato, organizou programas com cinco mil empresas no primeiro ano e 12 mil empresas no segundo ano de Governo. «Não para elas ganharem dinheiro mas para elas terem pessoal qualificado no futuro», justificou.

«Daqui a dez anos, 25% dos professores estão reformados. Daqui a 15 anos, 40% dos professores estão reformados. É preciso formar a melhor geração de professores que já tivemos», propôs, em conclusão de discurso.