Quem é Salvador Sobral?

Do Bravo Bravíssimo aos palcos de Kiev, quem foi Salvador Sobral, o músico que pôs milhares de estrangeiros a cantar em português?

Quem é Salvador Sobral?

"Só quero viver uma vida sossegada. Espero que isso possa acontecer, tenho a certeza que sim. Talvez no princípio seja um pouco agitado", disse Salvador Sobral na conferência de imprensa após a vitória no Festival Eurovisão da Canção. Mas ‘sossegada’ não é o adjetivo que melhor descreve a vida do músico português de 27 anos, que desde muito novo está habituado ao mediatismo, mas que, nos últimos anos, tem vindo a rejeitar.

Era muito novo quando começou a pisar os palcos da escola e a ter ouvido para a música. Numa entrevista ao jornal espanhol El País, recordou as viagens em família e as canções que ouviam nos percursos: dos Beatles aos Genesis, passando pela dupla Simon & Garfunkel, os êxitos dos anos 60/70 eram aqueles que cantarolava com os pais e a irmã, a também cantora e compositora Luísa Sobral.

Já nessa altura mostrava ter um bom ouvido e um sentido rítmico acima da média. Daí que, quando tinha cerca de 10 anos, o passo natural a seguir tenha sido inscrever-se no concurso de talentos da SIC ‘Bravo Bravíssimo’. Com 18 anos, voltou à televisão para participar num programa semelhante, no qual a irmã já tinha participado e alcançado o terceiro lugar: os ‘Ídolos’. Os empresários Manuel Moura dos Santos e Roberta Medina, o diretor de programas Pedro Boucherie Mendes e o músico Laurent Filipe renderam-se ao talento do adolescente. Salvador conseguiu captar a atenção do público português, mas não o suficiente para conquistar o pódio.

A procura de um ritmo e algo mais Depois, seguem-se tempos mais calmos: após um período de maior mediatismo, Salvador começou a estudar Psicologia e guardou a música para si. Durante uma viagem a Maiorca, ao abrigo do programa Erasmus, descobriu os palcos dos bares, onde voltou a dar um pouco de si ao público. Mas Maiorca não lhe deu apenas os palcos: numa entrevista a Fernando Alvim, no Canal Q, Salvador admitiu que foi nesta ilha espanhola que começou a consumir drogas de uma forma mais regular. “Em Maiorca houve deboche. Cogumelos e não sei o quê…”, afirmou.

Maiorca ofereceu-lhe também uma nova visão do panorama musical. Enquanto cantava em bares, Salvador foi descobrindo grandes nomes do jazz, como o trompetista e cantor Chet Baker, uma das suas maiores influencias: "Deslumbrou-me. Parecia uma angústia misturada com esperança, com melancolia, tudo numa só pessoa. Identifiquei-me totalmente com ele e com o seu estilo", disse na entrevista ao El País.

A vontade de continuar a pisar palcos e de viver a música de uma forma intensa fez com que desistisse do curso que estava a tirar e se inscrevesse na escola Taller de Músics, em Barcelona. Foi nesta altura também que o cantor garante que deixou de consumir estupefacientes. Um ano depois, já fazia parte do cartaz Vodafone Mexefest. No ano seguinte, surge o festival EDP Cool Jazz. A vida como músico profissional começava finalmente a singrar.

Em março de 2016, Salvador lançou o álbum ‘Excuse Me’, um disco que o valoriza tanto como intérprete como autor, que vai buscar referências não só ao jazz como à bossa-nova, que revela um Salvador Sobral um pouco mais distante das interpretações de Stevie Wonder feitas em concursos de talentos e mais próximo de uma toada à Caetano Veloso ou Vernon Duke.

'Amar Pelos Dois' e por todos os que sentem com ele O álbum passou despercebido, mas isso não afetava Salvador, que, agora sim, queria ter uma vida “sossegada”, acompanhada apenas dos seus ritmos. Mas tudo mudou em março deste ano quando, contra todas as expectativas, venceu o Festival da Canção e o Festival Eurovisão da Canção, dando pela primeira vez a vitória a Portugal. ‘Amar Pelos Dois’, composta pela sua irmã, era uma canção completamente diferente daquelas que costumam surgir neste concurso. Remete "um pouco para o cancioneiro americano e, ao mesmo tempo, para a bossa-nova", descreveu Salvador ao jornal Público. A música chegou a milhões de pessoas de todo o mundo, com jovens ucranianas a interpretá-la, crianças espanholas a aprenderam-na nas aulas, estrelas de todo o plante a elogiá-la.

Pelo meio ficam questões de saúde. No mês passado, uma publicação avançava que Salvador Sobral tinha de fazer um transplante de coração e que o seu estado de saúde deteriorava-se a um ritmo acelerado. A verdade é que o músico chegou mais tarde à Ucrânia, onde se realizou o festival, e foi Luísa Sobral que teve de fazer o seu lugar durante alguns ensaios técnicos. Numa entrevista à RTP, não confirmou nem desmentiu a necessidade de se submeter a um transplante de coração, admitindo que tem um problema de saúde e dizendo apenas que está tudo bem: “Eu vou lidando com as coisas. Sempre lidei".

Por agora, a doença fica para trás. Seguem-se os momentos de louvor, a aclamação do público, o estatuto de herói nacional. "Nunca quis saber dos votos, só quis cantar uma canção bonita como ela é", afirmou após a vitória na Eurovisão, que ficou marcada também pelo seu apoio aos refugiados que têm chegado à Europa nos últimos meses. O cantor português usou uma camisola onde se lia ‘S.O.S. Refugiados’, uma mensagem que não passou despercebida a ninguém, muito menos à organização do evento. “Recebemos um e-mail da organização a dizer que não podia continuar a usar aquela camisola", explicou Salvador Sobral, por não serem permitidas mensagens políticas ou comerciais: "Pensei que era estranho. E se vestir uma camisola da Adidas, é uma mensagem comercial? Era apenas humanitária”.

O próximo objetivo de Salvador? Realizar os concertos agendados para o verão. Uma tournée europeia? É uma hipótese que não foi descartada, mas que ainda não se confirma. ‘Amar Pelos Dois’ vai pertencer ao repertório? Talvez, mas o cantor confessou que já estava farto de cantar a música nos ensaios do festival. Mas com Salvador nunca se sabe: há sempre uma nova emoção, uma nova tirada, uma nova interpretação.