Lula disse a juiz que a mulher era a interessada no triplex de Guarujá

Durante uma das audições do julgamento em que é acusado de ter recebido subornos, o ex-presidente brasileiro Lula desviou as atenções para a mulher, Marisa Letícia, que morreu há três meses, diz a “Veja”

Num Brasil polarizado – a palavra que tem surgido incessantemente na imprensa deste e daquele lado do Atlântico a propósito da situação social e política do maior país da América do Sul -, Lula da Silva está a ressurgir num dos extremos dos polos. Mas todos os passinhos a caminho da regeneração política do ex-presidente têm a sombra da acusação de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro pela qual continua a responder perante os tribunais – e perante o juiz Sergio Moro, que tutela os processos do caso Lava Jato em primeira instância. E, no mais recente depoimento que o ex-presidente prestou durante o julgamento a propósito do triplex de Guarujá – o imóvel de luxo que Lula terá recebido como suborno da OAS Empreendimentos -, as suas declarações foram encaradas como um tropeção ao indicar que o interesse no apartamento teria vindo da sua mulher.

A edição da revista brasileira “Veja” que chega hoje às bancas relata que, para se defender das acusações de ser o dono oculto do já famoso imóvel [o apartamento 164 do Condomínio Solaris], Lula não se coibiu de apontar o dedo à mulher, Marisa Letícia, que morreu há três meses na sequência de um AVC. Segundo o ex-presidente, terá sido a antiga primeira dama a “demonstrar” interesse pelo triplex, “para fazer um investimento, não para morar nem para passar o verão à beira-mar”. 

Lula explicou durante o depoimento – que durou quase cinco horas – que chegou a visitar o imóvel com a mulher em meados de 2014, mas o ex-presidente diz que acabaram por desistir da compra ainda antes de se tornar arguido da Operação Lava Jato. “Fui ver o apartamento, coloquei 500 defeitos no apartamento, voltei e nunca mais conversei com Léo [ex-presidente da OAS] sobre o apartamento”, defende-se Lula, citado pela “Veja”. O ex-presidente disse ainda desconhecer quaisquer documentos assinados pela mulher relativos à transação do apartamento – que davam ao casal “condições mais favoráveis do que as de outros proprietários de apartamentos no mesmo edifício”, escreve a revista.

A acusação de que seria Lula o verdadeiro dono do triplex de Guarujá partiu exatamente de Léo Pinheiro. O empreiteiro, entretanto detido, confessou que o imóvel não só pertencia ao ex-presidente como teria sido comprado com “dinheiro de propina” – ou seja, de luvas.

Confrontado por Sergio Moro com as escutas telefónicas entre administradores da OAS em que o nome do ex-presidente surge como o beneficiário de remodelações feitas no apartamento, Lula respondeu assim: “Eu não sou obrigado a responder a mensagens que o Ministério Público pegou entre duas pessoas alheias a mim.” 

A defesa de Lula da Silva e o Ministério Público Federal pediram, depois do depoimento, que fossem arroladas novas testemunhas no julgamento. O pedido foi indeferido na segunda-feira por Sergio Moro. Após ser conhecida a decisão, a defesa do ex-presidente emitiu, na terça-feira, um comunicado em que reitera a inocência do arguido. “Além de o triplex não pertencer a Lula da Silva, sua proprietária, a OAS, deu o imóvel em garantia em diversas operações financeiras, conforme referências feitas pelas testemunhas ao longo das audiências”, defendem os advogados de Lula da Silva.