‘Violação’ em autocarro: outra vez o mensageiro

Tem suscitado grande escândalo a divulgação, pela CMTV, de um vídeo onde se reconhece a cara de uma jovem envolvida em contactos sexuais num autocarro, por ocasião da Queima das Fitas no Porto.

Mais uma vez, a tentação é matar o mensageiro.

Tenho criticado em diversas ocasiões o Correio da Manhã (e a sua televisão) por decisões que considero menos corretas, mas aqui estamos a pôr a realidade de pernas para o ar.

O que está mal não é a divulgação das imagens – o que está mal é a prática de certos atos em público.

Isso é que é chocante.

Nessa cena, a jovem não só não resiste à invasão da sua privacidade como agarra o rapaz pelo pescoço, puxando-o para si. Por isso, não há violação nem violência – há consentimento.

Poder-se-á dizer que a jovem estava alcoolizada, não se encontrando na plena posse das suas faculdades. Mas aí a responsabilidade é de quem? Não é também sua?

Ao contrário do que se tem dito e escrito, acho que a divulgação de imagens como estas é positiva, alertando as pessoas – jovens e menos jovens – para a necessidade de protegerem a sua privacidade. E sobretudo a sua dignidade.

Nos últimos tempos, tem-se generalizado nas redes sociais a circulação de episódios sexuais (alguns coletivos) em locais públicos – desde discotecas a jardins.

A evolução das novas tecnologias, a facilidade com que se faz um vídeo, a rapidez com que este é posto a circular na internet, torna tudo mais fácil.

E as pessoas sabem-no.

Assim, de duas uma: ou os participantes nessas cenas querem mesmo ser expostos ou andam muito distraídos.

Por isso, a divulgação do vídeo do autocarro pode ter um efeito profilático: constituir um aviso para quem ainda não percebeu que a dignidade de cada um tem de ser o próprio a protegê-la.

Não pode esperar que sejam os outros a fazê-lo.

 

P.S. – Após a publicação deste artigo, um responsável do Correio da Manhã esclareceu-me que nenhum dos intervenientes neste episódio é reconhecível no vídeo publicado.

De facto, a versão que ouvi do mesmo tinha os rostos ‘pixelizados’. Mas, estando toda a gente a dizer que a rapariga se reconhecia nas imagens, admiti que tal acontecesse numa versão anterior à que eu tinha visualizado.