Renda acessível, ‘o tanas’

Os empresários são pessoas que criam empresas para ter lucro. E fazem-no com capital próprio ou com dinheiro emprestado pela banca. Nos dois casos, é preciso que o negócio envolva um risco baixo. Caso contrário, nem o empresário investe nem o banco empresta.

É da análise da relação capitais, lucro e risco que nasce, ou não, o interesse em investir e fazer negócio. 
Nesta breve definição de capitalismo não cabem, obviamente, as administrações perdulárias da Caixa Geral de Depósitos que deram milhões a uns amigos às custas de todos nós, os contribuintes. Se tivesse vingado uma lógica racional, económica e capitalista, não estávamos enfiados no buraco onde estamos com a CGD, e restantes bancos. 

A definição de capitalismo devia estar inscrita à porta de qualquer organismo público, à laia de aviso para quem entra no Estado para servir as populações. Serviria igualmente para educar as populações que não fazem contas.

A Câmara de Lisboa anda há dois anos a apregoar uma solução milagrosa para fazer brotar do chão, como cogumelos, cinco mil casas para a classe média. Chamou-lhe ‘Programa de Renda Acessível’. A chave emocional que põe a cabeça das pessoas a disparar é ‘casas’ e ‘classe média’. São as palavras que as pessoas querem ouvir. É como os anúncios das dietas: «Sem esforço» e «a comer a sua comida». Ora, garanto que, se a pessoa continuar a comer batatas, pão e a não se levantar do sofá, não vai emagrecer.

Mas os anúncios continuam a ser feitos, seja de casas, seja de dietas. 

Nesta questão – e segundo documentos oficiais da CML –, a Câmara afeta património imobiliário (terrenos e edifícios), faz as obras de urbanização gerais, escolhe os concessionários e seleciona, por sorteio, as famílias. 

E qual é o papel das empresas privadas de construção civil? De acordo com o mesmo documento da CML, estas empresas têm de: 1 – Fazer os projetos. 2 – Construir e reabilitar os edifícios. 3 – Assegurar a manutenção e conservação dos edifícios durante a concessão. 4 – Receber as rendas em regime de renda acessível (250 euros por um T0, 350 euros por um T1 e 450 euros por um T2) e em situação de mercado. 5 – No final da concessão, entregar ao município, em bom estado, os edifícios construídos ou reabilitados.

Basta olhar para o que se pede às empresas construtoras para perceber que estas não têm interesse nenhum no negócio – porque o negócio não só não dá lucro como é mesmo ruinoso. 

Mas aqui entra outra vez a CML: vai promover a «minimização de riscos da operação e estimula a criação de financiamento bancário».

Ou seja, se isto alguma vez sair do papel, se não for uma promessa ‘engana parvos’ para as eleições, já sabemos como é feito. Com a conivência de construtoras e da banca, para prejuízo de todos nós. Mais do mesmo, portanto.