JFK. O estudante indolente que se recriou na guerra europeia

Bonito, inteligente e bem-humorado, o jovem Jack preferia o desporto, as festas e as leituras que mais lhe agradavam aos estudos e aos conselhos dos professores. Uma visita à Europa, em vésperas da ii Guerra Mundial, veio mudar a sua postura e catapultá-lo para voos mais altos

“Não espero demasiado e não ficarei desapontado se não te tornares um verdadeiro génio, mas penso que, com discernimento e conhecimento, poderás ser um cidadão realmente útil.” As palavras pertencem a Joseph Patrick Kennedy e constavam de uma carta dirigida ao seu segundo filho mais velho, John Fitzgerald Kennedy – hoje conhecido pela imortal sigla JFK, na altura simplesmente por Jack, um estudante mediano do colégio interno de Choate que, anos mais tarde, viria a tornar-se o 35.o presidente dos Estados Unidos da América.

Há quem interprete o conteúdo da referida carta como um simples gesto de encorajamento de um pai a um filho indolente, mas há igualmente quem o trate como uma repreensão séria de Joe Sr. à forma leviana como Jack encarava os estudos e menosprezava as outras disciplinas que não as suas favoritas –História e Língua Inglesa. Afinal, o abastado banqueiro e político, de ascendência irlandesa católica, tinha enormes expetativas para o futuro dos seus filhos, alimentadas por uma rígida educação assente nos benefícios da competição constante, abertamente direcionados para o lema sagrado do clã Kennedy: ganhar é tudo na vida. “Ele odeia perder, em qualquer coisa. É a única coisa que o torna realmente emocional, é quando perde”, confirmava a irmã Eunice sobre Jack.

Nascido a 29 de maio de 1917, em Brookline, Massachusetts, John F. Kennedy foi o segundo dos nove filhos de Joe Kennedy e Rose Fitzgerald, tendo recebido o seu primeiro nome do avô materno, John Francis Fitzgerald, um admirado congressista e mayor de Boston. Acima de Jack estava o primogénito, Joe Jr., e abaixo os restantes irmãos e irmãs: Rosemary, Kathleen, Eunice, Patricia, Robert, Jean e Teddy.

A infância e adolescência do jovem JFK foram vividas de braço dado com uma saúde débil e inúmeras doenças. Com pouco mais de dois anos de idade, apanhou escarlatina e os pais chegaram mesmo a temer pela sua vida. Mas essa interminável condição de fraqueza não impediu Jack de experimentar todo o tipo de desportos e mais alguns. Praticou natação e vela e jogou futebol americano, ténis, basquetebol e golfe. Em casa era visto em competições infinitas com o irmão mais velho, encorajadas, claro, pelo pai, e não foram poucas as vezes em que estas disputas foram longe de mais. Uma vez, numa furiosa corrida de bicicletas, Joe e Jack chocaram violentamente um contra o outro, e o segundo teve de levar 28 pontos na cabeça. Nada que preocupasse Joe Sr.

JFK era um rapaz rico, bonito, charmoso e, por isso, muito popular entre os alunos de Choate e as raparigas da sua idade. Para além do mais, tinha um excelente sentido de humor. “Jack foi a pessoa mais engraçada que conheci e acredito que a maioria das pessoas que o conheceram sente o mesmo”, conta Lem Billings, amigo e colega de Kennedy naquela escola situada no estado norte–americano do Connecticut, e, mais tarde, na universidade, que se recorda igualmente de o ver sempre com um livro – escolhido pelo próprio, ao invés dos recomendados pelos seus professores – ou com a edição diária do “New York Times” debaixo do braço.

A saúde frágil não permitiu que Jack estudasse em Londres, pelo que foi em Princeton (um semestre apenas) e em Harvard que, a partir de 1936, o futuro presidente dos EUA prosseguiu os seus estudos, adotando a postura trazida do ensino secundário: brilhante nas disciplinas que lhe suscitavam mais interesse, mas mediano nas restantes matérias. Juntamente com o irmão mais velho, era recorrentemente visto em festas e eventos desportivos e na companhia de mulheres.

Mas a nomeação do pai, no final de 1937, para o cargo de embaixador dos Estados Unidos no Reino Unido veio a ser decisiva para convencer Kennedy a aplicar-se a fundo nos estudos. O jovem estudante ganhou interesse pela política europeia e, após uma viagem, no verão de 1939, que o levou de Inglaterra ao leste do Velho Continente e à Alemanha nazi – escassos dias antes de Adolf Hitler ordenar a invasão da Polónia e dar início à ii Guerra Mundial –, regressou a Harvard resoluto a aprofundar os seus conhecimentos sobre política, história e relações internacionais.

Em 1940, Jack terminou os estudos, apresentando uma ambiciosa tese sobre a impreparação do Reino Unido para lidar com o poderio militar da Alemanha. O sucesso interno de tal trabalho académico e o incentivo do pai levaram Kennedy a aprovar a conversão da sua tese em livro – intitulado “Why England Slept” (“Porque dormiu a Inglaterra”) – que se tornou um êxito imediato, com cerca de 80 mil exemplares vendidos.

Poucos meses depois da formatura, John F. Kennedy decidiu levar à letra o aviso de Joe Sr. naquela carta de censura ou de alento e tornou-se num “cidadão realmente útil”. Não como presidente do país – isso só viria a acontecer em 1961 –, mas como interveniente numa guerra que também arrastou os EUA. Com o uniforme da marinha norte-americana, depois de rejeitado para soldado devido a problemas na coluna, o débil Jack foi destacado para operações de patrulha nas águas do oceano Pacífico e desempenhou, também ele, um papel importante na ii Guerra Mundial. A entrada no serviço público norte-americano viria a ganhar forma com o regresso a casa e os anos que se seguiram testemunharam uma das mais estonteantes ascensões políticas da história dos Estados Unidos.