Patriotismo constitucional

De forma quase impercetível, assinalou-se na passada semana um marco relevante da Constituição de 1976, quando esta suplantou a vigência do texto constitucional anterior, prevalecendo temporalmente sobre o documento autoritário que durante 41 anos forneceu uma capa formal de legitimidade à Ditadura. Podemos e devemos, por isso, enfatizar o relevo desta efeméride. 

Em primeiro lugar, porque se trata de um sinal de clara estabilidade e vitalidade do regime democrático. Não se trata de proclamar que temos um regime político perfeito, mas antes de evidenciar o sucesso do primeiro texto constitucional elaborado por uma Assembleia Constituinte eleita de forma democrática. Temos hoje uma Democracia consolidada, que já foi capaz de experimentar inúmeras soluções governativas, assegurar a alternância democrática e que, recentemente, tem experimentado com notável estabilidade (e atrevo-me a dizer, resultados e adesão popular positivos) soluções políticas inovadoras.

Dispomos de um robusto modelo de proteção dos direitos fundamentais, que soube sempre aprofundar a proteção e dar lugar a todos e todas: as mulheres, as pessoas LGBT, as pessoas com deficiência, os membros das confissões religiosas não maioritárias têm hoje pleno acesso, em condições de igualdade, à realização do livre desenvolvimento da sua personalidade. 

Temos um regime de proteção social nas áreas que asseguram de forma determinante o desenvolvimento do país e o bem-estar, assente na escola pública, no serviço nacional de saúde e no sistema de segurança social, matérias que o atual Governo recolocou no centro das prioridades da ação governativa, criando condições para a sua valorização, reconhecendo que só há verdadeira Democracia num quadro de garantia de direitos sociais.

Finalmente, num momento de desafio às Democracias por extremismos, populismos e xenofobias, um pouco por todo o mundo, é determinante reafirmar a importância do constitucionalismo democrático e dos seus casos de sucesso. Bem próximo de nós, parceiros europeus como a Hungria menorizam as suas Constituições e a proteção dos direitos fundamentais, junto das fronteiras da Europa a Turquia atravessa uma evolução que acarreta seríssimos receios de autoritarismo e do outro lado do Atlântico, na Venezuela, as instituições democráticas agonizam com preocupantes consequências para todos aqueles que ali residem.

O exemplo da nossa experiência de estabilidade constitucional, e da consolidação de uma comunidade de valores e de um quadro democrático robusto, composto de uma sociedade civil e de partidos que nele se revêm é um fator de orgulho que devemos disseminar e saudar, valorizando a ideia inclusiva e fortalecedora de patriotismo constitucional.