Geração i. Os millennials são os líderes do futuro

A energia é típica da juventude mas eles acreditam que a proatividade e o desejo de mudança não vão mudar com a idade. Assumem cargos de liderança mais cedo e preferem colaborar com os colegas do que competir com eles. São os jovens da Geração i, de influente.

Em Portugal, Francisco Goiana da Silva, de 28 anos, dirige uma plataforma de millennials portugueses ligada ao Fórum Económico Mundial. Começou cedo a querer ter uma palavra a dizer e até conseguiu um lugar no Vaticano.

Em 2020 os millennials vão representar 40% da força de trabalho e, em 2025, serão já 75%. A estimativa foi divulgada recentemente pela “Forbes”, num tom quase de ameaça aos atuais gestores. “Quer vocês gostem quer não, os millennials são críticos em relação ao sucesso e à sustentabilidade dos vossos negócios. Se eles não quiserem trabalhar para vocês, as vossas empresas vão morrer”.

Segundo a publicação norte-americano, os mitos em torno desta geração são vários: “só gostam de selfies”, “são apaixonados por eles próprios”, “são competitivos e são preguiçosos”. Quem é que nunca ouviu, por parte das gerações anteriores, ideias como “têm a papinha toda feita?”. Pode ser o que dizem os nascidos antes dos anos 80, mas os estudos em torno dos millennials têm apontado um retrato que vai além das primeiras impressões. Semanalmente, à quinta-feira, temos retratado estes jovens, a que chamámos Geração i. Desta vez, explorámos a forma como se posicionam perante os agentes de decisão. Podem só agora estar a chegar ao mundo do trabalho, mas começam cedo a querer ser influentes.

Flexibilidade e Mudança

“Quando se olha para os millennials, em particular no local de trabalho, eles têm um desejo subjacente de moldar o sítio onde trabalham. Querem contribuir e sentir que o papel que desempenham traz um benefício para a sociedade“, disse à “Forbes” Jim Link, diretor de recursos humanos da Randstad da América do Norte.

Link mostrou-se surpreso e fascinado ao analisar os dados de um estudo desta multinacional aos millennials de dez diferentes mercados de todo mundo, realizado em 2016. Os resultados sugeriam que os jovens millennials e os da geração Z – a dos que nasceram entre os anos 1994 e 2010 – são os primeiros na história a considerar mais importante o facto de um emprego garantir flexibilidade no trabalho do que, por exemplo, permitir acesso a um seguro de saúde.

Caroline Stroles, fundadora da Forward.co, uma agência de recrutamento centrada na inovação e liderança, também contribuiu há pouco tempo para o retrato desta geração. Depois de ter treinado jovens CEO’s e empreendedores da geração Y, a dos_millennials, descreve-os como “uma  geração de talentosos, bem educados, maravilhosamente humanos, internacionalmente experientes, eficientes”. Para Stroles, têm ainda outra vantagem: trabalham bem uns com os outros mas também com as gerações anteriores.

A “coach” notou ainda diferenças no que diz respeito à liderança._“São altamente adaptáveis. Constroem soluções com uma mentalidade rápida e com uma determinação de realizar o que os outros acreditam que é impossível”. Entre as razões poderá estar o tempo em que cresceram. “Foram atingidos na viragem de diminuição de recursos e existência de dívidas”, assinalou num comunicado da empresa. Ainda assim,são “socialmente conscientes, interessados em ganhar a vida e em fazer a diferença no mundo. Esperam que as empresas sejam flexíveis, eficientes e socialmente responsáveis”.

 

Os números

O mais recente estudo da Deloittte sobre esta geração veio confirmar as ideias de Stroles. O estudo “The 2017 Deloitte Millennial Survey” analisou as perspetivas de futuro de aproximadamente 8000 millennials em 30 países, com diferentes contextos económicos e sociais. Foram inquiridos apenas os millennials com curso superior e que se encontravam a trabalhar num emprego a tempo inteiro.  No geral, apenas 36% dos inquiridos esperam melhorias nas situações sociais e políticas dos seus países num período de 12 meses. E especialmente os millennials mais velhos, das economias europeias, têm sérias preocupações sobre os rumos político e social que os seus países estão a tomar.

A incerteza do desenvolvimento de conflitos, bem como outras questões que incluem crime, corrupção e desemprego, são as preocupações centrais. Mas os millennials estão longe de se assumir como meros observadores: cada vez mais consideram ter o potencial de mudar o mundo em seu redor, sobretudo de forma colectiva.

Outro pormenor é que pensam que é mais realista a mudança acontecer através do emprego que exercem: 76% dos millennials inquiridos consideram que os negócios são uma força positiva com impacto social e 74% que o mundo dos negócios tem o potencial de resolver os problemas que assombram esta geração. Se depositam toda a fé no trabalho, estão desiludidos com o governo das empresas. Apenas 59% dos inquiridos acredita que a mudança necessária está a ser feita pelos atuais líderes das multinacionais.

Existe, porém, diferenças nos níveis de confiança conforme a geografia. Nos países com mercados considerados mais maduros, só 51% dos millennials veem os líderes dos negócios nacionais como empenhados em lidar com os problemas que a sociedade enfrenta. Nas chamadas economias emergentes, há mais esperança: 73% dos millennials são positivos quanto ao nível de compromisso das pessoas que lideram os negócios nos seus países. 

Dois anos antes desta última edição, no estudo da Deloitte de 2015, a empresa estava interessada em perceber o interesse desta geração no mundo da liderança e os números apontavam para a existência de grandes níveis de ambição, já que 53% dos jovens sonhavam com posições de comando nos atuais empregos. Porém, muitos assumem que ainda não estão à altura disso. Apenas 27% dos homens e 21% das mulheres se viam com fortes capacidades de liderança.

 

Os millennials à mesa com os líderes mundiais

Quem começa a não querer perder tempo e aproveitar o que eles têm a dizer são alguns líderes mundiais. O fundador do Fórum Económico Mundial (WEF na sigla em inglês), Kalus Shwab, foi um dos pioneiros. “Estamos cada vez mais conscientes de que as soluções para os nossos desafios globais devem envolver os jovens, a todos os níveis – local, regional, nacional e globalmente. Esta geração tem a paixão, o dinamismo e o espírito empreendedor para moldar o futuro”. Em 2011, o WEF lançou, nesse sentido, a Global Shapers Community – uma plataforma que visa juntar indivíduos “altamente motivados que têm um grande potencial para futuros papéis de liderança na sociedade”. Destina-se a jovens entre os 20 e os 30 anos de idade, de vários países do mundo e que passaram a ter assento no Fórum Económico Mundial e uma palavra a dizer sobre as políticas mundiais. Só neste fórum existem ainda outras grandes comunidades de jovens mobilizados para a mudança como a Young Global Leaders, the Global Agenda Councils ou a the Schwab Foundation for Social Entrepreneurs.

 

Em Portugal

Lisboa é uma das capitais representadas por millennials no Fórum Económico Mundial, com a comunidade Global Shapers Lisbon Hub, que tem como objetivo recrutar jovens com intervenção em diferentes áreas da sociedade. É o caso de Francisco Goiana da Silva, de 28 anos, que atualmente trabalha como adjunto do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde.

Além do trabalho no ministério, assumiu a liderança do Global Shapers Lisbon Hub este ano. Em conversa com o i, conta que desde miúdo começou a pensar fora da caixa. Jovem criativo, escultor, considera-se rebelde e proativo. Estudou Medicina mas desde cedo percebeu que o sistema de gestão de saúde precisava “urgentemente” de mudança. Foi especializar-se no Imperial College London em gestão hospitalar, depois de organizar uma exposição com as suas esculturas para pagar as propinas. 

Tinha apenas 24 anos quando esteve presente em Davos, no Fórum Económico Mundial. Lá viria a conhecer o secretário do então recém-empossado Papa Francisco, com quem manteve contacto. Um dia, depois de muita insistência, conseguiu uma visita ao Papa, de quem ficou amigo. Mais tarde, no final do mestrado em Londres, viria a ser convidado para assumir o cargo de assessor na área da saúde no Conselho Pontifíce para a Injustiça, trabalhando como assessor do cardeal Peter Turkson.

“Somos uma geraçâo de pontes, de conexões”, diz ao i Francisco, com um sorriso na cara. “Esta geração é que vai trazer esperança às anteriores. Vamos tornar o sistema muito mais eficiente. Se vamos tornar a sociedade melhor? Já é o que estamos a fazer, vamos cimentar valores que para nós são mais do que normais e que para as gerações anteriores ainda são uma luta. Falo da meritocracia, por exemplo. Ouvimos que a maçonaria está a definhar porque o pessoal desta geração não acredita nesses sistemas, a não ser claro, aqueles a que eu chamo de ‘novos velhos’ – que foram formatados pelas famílias e não conseguiram fugir ao sistema”, explica.

O jovem de Santo Tirso, garante que não tem ligações partidárias e que isso é fundamental para poder ser independente. “Nos Shapers, temos pessoas de direita e de esquerda, mas há valores que esta geração já nem discute: o respeito pela diferença, a igualdade de género… Não aceitamos discursos como os do racismo, homofobia ou xenofobia. Queremos todos uma sociedade inclusiva e de igualdade em que a diferença é valorizada”. Francisco considera-se um sonhador. E acredita que é preciso que esta geração crie e alimente redes entre si para que o sistema não engula essa proatividade e o ritmo deles, próprio da juventude.