O futuro chegou a voar

As imagens da entrega da bola no final da Taça de Portugal, no passado domingo, foram notícia no mundo. Culpa de Alexandru Duru, o engenheiro que voou sobre o Jamor. «Uma experiência fantástica», conta ao SOL.

Catalin Alexandru Duru – o engenheiro canadiano que, no domingo passado, voou numa prancha sobre o Jamor para entregar a bola da partida da final da Taça de Portugal – tinha quatro anos quando estreou, em 1989, o segundo filme da trilogia Regresso ao Futuro – e onde foi, pela primeira vez ‘avistado’ um destes aparelhos voadores, conhecidos desde então por hoverboard. «Só vi o filme depois dos vinte anos e, nessa altura, ainda não estava dedicado às hoverboards», diz Alexandru ao SOL.

Mas já estava interessado noutros projetos – e aqui entra a máxima ‘desde pequenino, se torce o pepino’. «Uma parte que ajudou muito foi que o meu pai, Dan Duru, é engenheiro eletrotécnico e ensinou-me muitas das coisas que sabia desde tenra idade. Ele tinha um mini-laboratório em casa e foi assim que me comecei a interessar por projetos deste tipo», revela o engenheiro de 32 anos que nasceu na Roménia e se radicou no Canadá.

Duru filho seguiu pela metade as pisadas de Duru pai – tornou-se engenheiro mas optou pela informática. E, há cerca de cinco anos, começou a perseguir o sonho de voar numa hoverboard. «Prendi uma hélice a uma bota de snowboard [inserida numa prancha] e tentei elevar-me».

Foi a primeira experiência na busca pelo protótipo de hoverboard que utilizou para entregar a bola do jogo entre o Benfica e o Vitória de Guimarães. «Foi preciso uma combinação de muitas aptidões para conseguir avançar para uma coisa assim», explica. «É preciso cruzar conhecimento de eletrónica, engenharia mecânica e software». Em Lisboa, Alexandru protagonizou um cenário de verdadeira ficção científica para os comuns mortais. As imagens depressa começaram a correr o mundo, mais céleres e célebres do que a vitória do Benfica ou do outro apontamento tecnológico que marcou a partida: este foi o primeiro jogo em que foi utilizado o sistema vídeo-árbitro.

Foi a primeira vez que Alexandru esteve em Portugal. A estadia de cerca de uma semana – que incluiu dois voos de treino antes da partida – deu para a equipa conhecer um bocadinho de Lisboa, até porque correu tudo «conforme planeado». «Logo no primeiro dia, quando chegámos, andámos por Algés e vimos o mar. Penso que não são as melhores praias de Portugal mas, em Montreal, nem isso temos!», conta, com humor, ao SOL.

Mas até chegar a um ponto em que se arrisca a voar perante milhares de pessoas, houve um caminho que o engenheiro não percorreu sozinho. Em Portugal, fez-se acompanhar por três elementos da sua empresa, a Omni Hoverboards, que se dedica a desenvolver e aperfeiçoar os protótipos deste veículo que ainda espera pelas patentes.

 

Hoverboards no mundo

Alexandru já cumpriu mais de cinquenta voos na sua hoverboard. Em 2015, bateu o recorde do Guinness ao voar 275.9 metros sobre o lago Ouareau no Quebec, Canadá, a maior distância alguma vez percorrida numa destas pranchas. Mas não é o único a trabalhar nesta área.

Desde pelo menos 2014 que surgem, na imprensa, notícias sobre hoverboards e já vários vídeos com uma prancha voadora semelhante se tinham tornado virais na internet.

 Por exemplo, o francês Franky Zapata também desenvolveu um protótipo de uma prancha voadora – a que chamou Flyboard – e que, por usar motores de combustão [a prancha de Alexandru usa baterias de lítio e tem uma autonomia de dois minutos] consegue aguentar-se no ar dez minutos e atingir uma altura de 30 metros. Recentemente, Zapata foi proibido usar o aparelho em França devido ao vazio legal sobre o este tipo de veículo e atividade.

A questão entre a inovação científica e os limites legais põe-se, aliás, com cada vez mais frequência. O SOL contactou a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC) sobre a eventual regulamentação deste voo mas não obteve resposta até ao fecho da edição.

Ainda assim, e por se tratar de um protótipo quase único no mundo, é normal que não haja bases legais para balizar este voo. Recorde-se que, por exemplo, o quadro legal sobre os já comuns drones só foi apresentado há cerca de seis meses.

 

Parece, mas não é um brinquedo

A empresa de Duru foi contratada para a final da Taça há cerca de um mês através da Fun Addict, uma empresa de organização de eventos que trabalha com a Federação Portuguesa de Futebol há alguns anos.

De volta ao Canadá, o engenheiro descreve a experiência de «sensacional». «Voar num estádio cheio foi fantástico. Sentia-se a energia de toda a gente a cantar e a aplaudir. Foi realmente uma sensação especial», relata ao SOL.

Durante o voo de domingo, o piloto (ou será passageiro?) chegou a estar a uma altura de nove metros. Duru foi a estrela, mas a sua hoverboard pode, no entanto, ser operada por outras pessoas. Aliás, tal já aconteceu, revela. «Pode ser usada por todos os que pesem até 70 kilos», conta.

No entanto, o engenheiro deixa uma ressalva: as hoverboards serão, provavelmente, usadas no futuro mas nunca serão um brinquedo. «Tenho a certeza de que andar de hoverboard será uma opção. Mas temos que ser realistas: este é um veículo potente com motores poderosos, não é um brinquedo de crianças».

Além disso, há a questão energética. «É sempre precisa mais energia para fazer coisas voar do que andar pelo chão. Por isso, não penso que as hoverboards poderão tornar os carros obsoletos».

Duru não crê que, num primeiro momento, estes aparelhos sejam usados como forma de deslocação, mas antes em atividades pontuais. «Pelo menos num futuro próximo, não acredito que estejam completamente direcionadas para serem um meio de transporte».

Sobre preços e daqui a quanto tempo podemos contar com estes aparelhos no mercado, a resposta de Duru sai rogada. «As hoverboards são fantásticas e estamos a trabalhar arduamente para que possam ser tão seguras e acessíveis quanto possível».

Já sobre o feedback que tem recebido sobre o voo do final da Taça, Alexandru não omite uma certa parte de surpresa. «Tenho de admitir que não estávamos completamente preparados para isto!».