Reino Unido. A campanha deixa o luto

A política agarrou o ataque em Londres pelos colarinhos. Um dos terroristas fora denunciado à polícia e entrou num documentário britânico.

A campanha britânica para as eleições de quinta-feira entrou esta segunda-feira em plena marcha e no seu centro estava o rescaldo do atentado terrorista do fim de semana em Londres. Os trabalhistas abriram fogo de manhã e determinaram o tema para o resto do dia ao falarem dos cortes ao número de polícias realizados pela primeira-ministra Theresa May nos seus seis anos como ministra do Interior. Um dado que ganhou relevância assim que se descobriu que pelo menos um dos terroristas de sábado foi denunciado várias vezes às autoridades, que, tal como fizeram com o bombista que de Manchester, o desvalorizaram em nome de ameaças mais credíveis. O debate político cedo se tornou uma prova entre os dois candidatos sobre qual é mais capaz de conter a ameaça terrorista e reforçar a segurança nas cidades britânicas. O luto foi relegado para a vigília que se realizou ao final da tarde em Londres.

Não é fácil perceber qual será o impacto do atentado terrorista de sábado à noite nas eleições britânicas. Theresa May continua à frente segundo a maior parte das sondagens, embora a gigante vantagem de quase 20 pontos que lhe era atribuída quando convocou eleições antecipadas se tenha entretanto evaporado para cerca de oito, segundo a média das consultas agregadas pelo portal BritainVotes. As mais recentes experiências de sondagens britânicas, desde as anteriores eleições legislativas ao voto do Brexit, mostram no entanto que as consultas não são inteiramente de fiar. Mas a ascensão de Corbyn – ou, como grande parte dos analistas argumenta, a queda de May – parece inegável e acende a corrida a apenas três dias dos voto.

Corbyn veste um argumento securitário que não lhe parece natural, uma vez que o líder trabalhista vem assumindo sobretudo uma perspetiva de combate ao terrorismo mais direcionada para temas como a ação militar de países ocidentais no Médio Oriente – aludiu a esse fator no rescaldo do atentado de Manchester, para uma chuva de críticas conservadoras. Esta segunda-feira, porém, Corbyn carregou com o número de polícias e os cortes orçamentais de Theresa May. “O pessoal dos serviços de emergência afirma que os cortes nos números da polícia nos tempos que ela passou no Ministério do Interior foram terríveis e é isso que tem de ser criticado”, disse à BBC.

May ripostou com o seu programa de resposta dura ao terrorismo, em parte anunciado domingo, quando avançou com penas mais pesadas para crimes desta natureza e sugeriu que as comunidades muçulmanas no Reino Unido vivem em relativo isolamento e mostram “demasiada tolerância para o extremismo”. Mas entre os sindicatos da polícia que surgiram ao lado de Corbyn e os números dizendo que nos últimos sete anos o país perdeu cerca de 20 mil polícias, May pareceu sem muito fôlego político. Essa ideia ficou mais forte ao revelar-se que um dos atacantes fora não apenas denunciado, mas também expulso da mesquita local pela comunidade muçulmana em que se integrava.

Khuram Butt

As atenções voltavam-se esta segunda para um dos dois nomes dos atacantes revelados: Khuram Butt, nascido no Paquistão mas crescido no Reino Unido, onde ficou de tal forma conhecido como um apoiante das correntes radicais e antiocidentais do islão que apareceu mesmo num documentário britânico chamado “Os vizinhos jihadistas”. Pelo menos numa ocasião um amigo denunciou-o à rede de alerta para radicais, mas a investigação a Khuram Butt caiu em nome de outras prioridades. “Não vi ainda nada que me sugira que foi tomada uma má decisão”, disse ontem o oficial britânico de topo no combate ao terrorismo, Mark Rowley, que enfrenta críticas por terem sido ignorados sucessivos alertas sobre Salman Abedi, o homem que se fez explodir em Manchester há duas semanas. O outro terrorista de sábado é de nacionalidade marroquina e líbia e trabalhava em Dublin como cozinheiro numa pastelaria, segundo fontes da polícia irlandesa ao “Guardian”.

As batatas quentes que passvam esta segunda entre as mãos dos políticos e também entre as dos responsáveis pela segurança  ficaram longe da vigília liderada por Sadiq Khan, o presidente da Câmara de Londres que é também muçulmano e que por isso representa uma voz rara na habitual paisagem da resposta ao terrorismo em países ocidentais. “Como mayor de Londres quero enviar uma mensagem nítida aos extremistas doentios e malvados responsáveis por estes crimes hediondos: vamos derrotar-vos, vocês não vão vencer”, disse, numa cerimónia com líderes de vários grupos religiosos, centenas de pessoas e entre elas muitos muçulmanos como o próprio Khan. “E como um orgulhoso e patriótico muçulmano britânico, digo isto: não cometerão estes atos nojentos em meu nome.”