«Estás onde queres estar?»

Esta pergunta, que cruzou o meu caminho no Porto, interroga-nos, de forma inquietante, sobre se cada um de nós está onde quer estar, faz o que quer fazer, é aquilo que quer ser… 

E esta pode ser uma questão incómoda, sobretudo se a resposta for negativa. É muito difícil confrontarmo-nos com a realidade, particularmente quando a realidade não corresponde àquilo que sonhámos, aos projetos que fizemos, àquilo que sempre ambicionámos.

Porém, esta constatação de que não realizámos os nossos sonhos pode ser, igualmente, o ponto de partida para fazermos o que falta para conseguirmos alcançá-los, para vermos o que é necessário mudar, fora ou dentro de nós, para conseguirmos estar onde gostaríamos de estar. Ana Margarida Carvalho diz, no seu romance Não Se Pode Morar nos Olhos de Um Gato, a propósito de uma personagem: «Custava-lhe aceitar situações irremediáveis. Não se dava bem com o insolúvel. Havia remédio para tudo nesta vida». Ora, é esta a atitude que devemos adotar, quando nos apercebemos de que não estamos onde queremos estar.

Efetivamente, precisamos, muitas vezes, deste tipo de interpelações para conseguirmos refletir sobre o modo como vivemos a vida, sobre o sentido que lhe damos e sobre a forma como persistimos na luta pelos nossos sonhos, ou, pelo contrário, os abandonamos, como se não fossem nossos ou fossem já sonhos gastos, usados, de tão cansados que nos sentimos com a vida que vivemos, ou, melhor, ao longo da qual nos arrastamos, nesta sucessão de «dias, semanas, meses, anos, / e os ciclos dos astros indiferentes», nas palavras de Vasco Graça Moura.

Uma das questões que preocupam os filósofos contemporâneos, como Luc Férry, é a relação de equivalência que estabelecemos entre «viver bem» e «ter sucesso». Estes conceitos, que, no passado, não tinham nenhuma equivalência, passaram a ser sinónimos, nos nossos dias. Para a maioria de nós, viver bem significa ter sucesso na realização dos sonhos de sucesso pessoal e profissional, mesmo que este sucesso seja vazio de recompensa espiritual, mesmo que seja apenas um sucesso exterior, mais para contemplação dos demais do que para satisfação do próprio. Ou, mesmo que seja para satisfação do próprio, a recompensa poderá não ser um sentimento de satisfação plena…

Assim, estar onde se quer estar é, também, estar no cargo ou na profissão que se ambiciona, é estar no local de destaque, pelo qual se trabalha. E, muitas vezes, significa desejar cada vez mais e mais. É uma ânsia infindável, que poderíamos descrever, «roubando» as palavras de Maria Teresa Horta: «Para a minha sede nenhuma água chega»!

Mas, será que é isto que nos preenche enquanto pessoas, será que é isto que nos define enquanto seres felizes, com uma boa vida? Será que estamos onde queremos estar, tanto do ponto de vista pessoal, quanto do familiar, sentimental, espiritual?

Há momentos em que vivemos em função dos outros e momentos em que nos isolamos e procuramos viver a nossa individualidade só para nós próprios. Até porque esta possibilidade de isolamento é um ato de liberdade…