Somos 100 mil anos mais antigos do que se pensava e comíamos ovos de avestruz

“Até aqui, pensava-se que a nossa espécie teria surgido de forma provavelmente rápida algures num ‘jardim do paraíso’ localizado possivelmente na África subsariana. Diria que este jardim em África é África – e é um grande, grande jardim”

“Investigadores dizem que descobriram os vestígios mais antigos de Homo sapiens de que há registo num lugar improvável: Marrocos”. Começava assim a notícia divulgada ontem pela revista “Nature”, dando conta de dois artigos científicos que esta semana fazem capa da publicação científica.

A surpresa é que, até aqui, pensava-se que a espécie humana tinha evoluído nos últimos 195 a 200 mil anos na África Oriental. Agora, abre-se um novo capítulo da história: tudo pode ter começado mais cedo e não num lugar tão confinado do globo.

A descoberta foi feita num local de escavações arqueológicas conhecido como Jebel Irhoud, uma zona com grutas a 100 quilómetros de Marraquexe.

As equipas descobriram crânios e maxilares que tudo indica pertencerem aos nossos primeiros antepassados.

Mas as datações apontam para uma linha temporal distinta da que tem estado em cima da mesa para a evolução da espécie Homo sapiens: os investigadores dataram os fósseis como tendo 300 mil a 350 mil anos, o que significa que os primeiros passos destes hominídeos que vieram revolucionar o mundo aconteceram pelo menos 100 mil anos mais cedo do que apontavam as teorias da evolução, que davam fósseis datados de há 200 mil anos como os primogénitos da espécie Homo sapiens.

Segundo a “Nature”, as descobertas, analisadas pelo Instituto de Antropologia Evolutiva Max Planck, em Leipzig, e por uma outra equipa da Universidade da Califórnia, não significam que a espécie tenha surgido no Norte de África, apenas que os primeiros membros terão deambulado ou emergido um pouco por todo o continente africano em vez de serem naturais de uma região africana em particular.

“Até aqui, pensava-se que a nossa espécie teria surgido de forma provavelmente rápida algures num ‘jardim do paraíso’ localizado possivelmente na África subsariana. Diria que este jardim em África é África – e é um grande, grande jardim”, disse Jean-Jacques Hublin, um dos autores e promotor dos estudos, citado pela “Nature”.

Além desta viagem ao passado da humanidade, que os cientistas fundamentam com análises de ADN e anatómicas – embora não seja ainda consensual que são de facto Homo sapiens ou outro tipo de hominídeos mais primitivos – as equipas encontraram vestígios que permitem imaginar a alimentação destes habitantes das grutas de Marrocos. Gazela, gnus, zebras e até ovos de avestruz fariam parte da dieta.

Os vestígios arqueológicos de Jebel Irhoud estão debaixo da mira dos investigadores desde os anos 60, pelos fósseis hominídeos e artefactos da Idade da Pedra Média, mas a idade geológica desses vestígios do passado só agora foi passada a pente fino pelas equipas. O novo programa de escavações descobriu 16 novos fósseis de Homo sapiens e ainda fósseis de animais contemporâneos.