A paralisação das escolas

Os professores voltam à greve no próximo dia 21. O descongelamento das carreiras prometido pelo Governo parece que, afinal, não é bem o que os professores pensavam. É só o fim do congelamento para efeitos futuros. 

A vinculação extraordinária ou integração de contratados também não será bem o que os docentes nessas condições estariam à espera – dos 4000 prometidos 900 ficam de fora. 

Não há milagres. Nem o Cristiano Ronaldo do Ecofin, desta vez, tem solução.

É claro que, até lá ou imediatamente a seguir, para compensar, haverá com certeza uma ou outra cedência que aparente uma vitória dos sindicatos, porque já não podem continuar muito mais tempo amorfos, mudos e quedos, quais dedicados parceiros de um Governo que – à boa maneira de CR7, ou tal como o Cristianinho fez há dias no Santiago Bernabéu – dribla adversários e companheiros para chegar ao golo.

Mais um exemplo da capacidade de drible fora do vulgar do Executivo socialista são os números da taxa de desemprego das mais de mil (1000, sim, com três zeros) licenciaturas e mestrados existentes no continente e nas ilhas.

O estudo do Governo (v. i de quinta-feira) fundamenta-se nos dados fornecidos pelos centros de emprego e no número de desempregados com curso superior neles inscritos.

Ou seja, e desde logo, um funcionário de um call center, de um tuk-tuk ou de um balcão que por acaso tenha canudo, não releva e, para efeitos do estudo governamental, antes engrossa a lista de saídas profissionais do respetivo curso.

Com efeito, e embora até o estudo tenha que concluir que o desemprego de licenciados e mestres é superior à média nacional, a verdade é que o desemprego jovem – pelos dados não manipulados do INE – ultrapassa os 20%, ou seja, muito, mas mesmo muito acima daquela média nacional.

E o drama maior é mesmo entre licenciados e mestrados, que investiram anos na sua formação para coisa (se não nenhuma) muito pouca. Quando não – como se tornou frequente – são excluídos de concursos ou propostas de trabalho por ‘excesso de qualificação’ ou currículo.

Portugal é um país de modas. 

Combatida a analfabetização, pós-25 de Abril, seguiu-se a iliteracia. Nos anos 80 e 90 não se falava noutra coisa. Mas nunca mais se falou. Já não é problema?

A massificação e democratização da informação – incomensuravelmente maior do que há bem poucas décadas – não é sinónimo de cultura, conhecimento, qualificação e desenvolvimento. 

Mas o país está hoje com indicadores muito melhores, de longe, em matéria de licenciados e mestrados.
Se os forma para as cozinhas (e, neste caso, até pode acabar em chef e ter bem melhor proveito) ou para motoristas de riquexós, táxis ou similares ou para atendedores de chamadas ou serventes de pizzas e hambúrgueres pouco importa.

O que importa é sermos todos doutores e engenheiros. Por isso caiu em saco roto a proposta, há tempos, de Paulo Rangel para oficialmente se adotar a fórmula anglo-saxónica do Senhor e Senhora. Isso, dr. Rangel, é impensável para a nossa gente.

A escola, por cá, não é o foro de excelência da formação, do conhecimento, da qualificação.

É, primeiro, um depósito de crianças para que pais e mães possam dedicar-se às suas carreiras; depois, um serviço de acompanhamento de adolescentes mal-educados a quem os professores não podem contrariar; finalmente, e mais tarde, fonte de credenciação e estatuto social dos doutores e engenheiros da praça.

O problema começa com a confusão entre ensino e educação. E com a confusão do papel dos professores e dos pais.

Aos pais, ou encarregados de educação, cumpre a educação das meninas e dos meninos. Não é aos professores e às escolas. A estes, a estas, cabe a formação, a consolidação de conhecimento, a qualificação.
Quando os pais e encarregados de educação tomaram de assalto as escolas, secundarizando o papel dos professores, cometeu-se um enorme erro.

Da mesma forma que são erros grosseiros os infindáveis TPC que os alunos levam para casa, obrigando os pais ou encarregados de educação a assumirem papel de professores no processo de aprendizagem.

Virou-se tudo do avesso.

A escola portuguesa tem de ser repensada. A começar pelo lugar de cada um. Devolvendo autoridade ao professor e focando-o nas suas competências letivas e formativas. Chamando os pais à responsabilidade pela educação dos alunos e não pelo processo de aprendizagem dos filhos, para o qual, na esmagadora maioria dos casos, não estão sequer preparados. E, sobretudo, colocando os alunos no seu lugar, tirando-os do pedestal a que não têm direito e consciencializando-os de que a escola tem mas não é um recreio.

Já agora, há que lembrar que os professores também são pais e também têm direito a ter tempo para educar os seus próprios filhos, não lhes cumprindo educar os dos outros, mas sim orientar a sua formação.

A escola tem de voltar a ser o centro de aprendizagem e formação das gerações futuras – cada vez  com mais e incontroláveis fontes de deformação.

Cristianos Ronaldos (que ele agora já há dois, sem contar com o Cristianinho), Bill Gates, Steve Jobs ou Mark Zuckerberg são foras-de-série. Não são imitáveis (que o diga Joseph Blatter). Pelo talento, capacidade de trabalho e de inovação.

Para eles, a escola é de menos. Para os cidadãos comuns, é vital. Ou devia ser.
Mas a reflexão necessária e indispensável não está em causa na greve de dia 21. 

É só mais uma paralisação.