Festivais marginais. Correntes a remar contra a maré

O aumento exponencial do número de festivais e a facilidade de juntar nichos em rede fez com que se abrisse um lugar para a marginalidade e o desconhecido.

Há fado, há futebol, há Fátima e há festivais de norte a sul. Uma nova realidade que tem contribuído para a disseminação de linguagens, permitida pela facilidade de comunicar e alimentar pequenas comunidades que, juntas, têm a força de uma corrente.

Nos últimos anos, a democratização no acesso à música permitiu contactar com mundos subterrâneos . Este cenário fez com que, na era pós-tribal, os nichos ganhassem uma nova importância. Ato contínuo: o nascimento de festivais com propostas diversificadas, protagonistas incógnitos do grande público e, já agora, um processo reconhecível de descentralização.

Dos quatro exemplo escolhidos para retratar a marginalidade dos festivais nacionais, três ocorrem fora dos grandes centros. O Milhões de Festa em Barcelos, o Entremuralhas em Leiria, e o Reverence pela primeira vez em Santarém, depois de ter deixado o Cartaxo. Apenas o Jazz em Agosto acontece em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian,

O que este quarteto partilha é a aposta no risco em vez da familiaridade do público com a(s) música(s) proposta(s). O Entremuralhas na estética negra, herdada de estilos com história como o gótico e as várias waves dos anos 80, o Reverence no rock mais remoto e o Jazz em Agosto, este ano, nas vanguardas do jazz procurando demonstrar que o jazz não está fechado num museu e tem caminho pela frente. No caso do Milhões de Festa, domina uma vontade de provocar o estabelecido e se, em edições anteriores, o rock foi um ponto de partida, aqui chegados o género é um apelido dispensável e divorciado dos vários novos públicos que procuram não só a primeira vez na maioria dos concertos como encontram na famosa piscina do Milhões de Festa uma espécie de colónia balnear de para pôr as barbas de molho e mais tarde recordar no Instagram.

Brincando a sério, o trabalho de casa é indispensável na preparação dos roteiros. Ou então, aceitar o zero como o princípio de algo. Uma coisa é certa, o mais do mesmo vai sempre perder para o fator surpresa. Veja-se o caso do Reverence por onde passaram bandas como Sisters of Mercy, Thee Oh Sees, Fat White Family, A Place To Bury Strangers e The Damned, e onde, este ano, não há ninguém com projeção sequer parecida. Na quarta edição do festival, a transferência de sede é justificada com o apoio da autarquia de Santarém e as dificuldades colocadas por Valada. “É um local muito difícil para se fazer um festival, não há infra-estruturas, não há corrente eléctrica suficiente, não temos internet, o sinal de telefone móvel é terrível, os acessos são difíceis”, declarou o organizador Nick Allport ao site Eu Gosto de Santarém.