Paisagem devastada compromete turismo

As consequências do incêndio serão mais sentidas no concelho afetado, mas na restante região, os responsáveis do setor estão otimistas e acreditam que meta de crescimento vai aumentar. 

O incêndio que deflagrou no fim de semana passado no concelho de Leiria e causou 64 mortos irá ter impacto no turismo da região centro que tem vindo a bater recordes de crescimento desde o início do ano. O SOL sabe que há vários turistas a desmarcar as suas férias de verão para aquela região. Uma das unidades hoteleiras localizadas na Sertã que fica a cerca de 18 quilómetros de Pedrógão Grande recebeu num dos dias cerca de 40 cancelamentos e poderão não ficar por aqui. Nem este será um caso isolado.

O presidente do Turismo Centro de Portugal admite que a paisagem, um dos ativos principais deste território «ficou irreparavelmente condicionada», o que acabará por ter algum impacto no setor. Ainda assim, minimiza as consequências, ao lembrar que os empreendimentos turísticos – tanto hotéis como espaços de turismo rural – não sofreram danos materiais. «Não está em causa o alojamento, não está em causa alguns produtos turísticos que podem ser associados ao património edificado e cultural, o que está em causa é a paisagem naquelas localidades que ficaram danificadas», salienta ao SOL, Pedro Machado.

No entanto, o responsável diz ainda não ter conhecimento destes cancelamentos. «Ainda não me chegaram dados oficiais, mas é natural que haja um primeiro impacto em termos de desmarcações, pois a mobilização dos turistas para este território está muito relacionado com a serenidade da paisagem e também com o acolhimento. Mas, acima de tudo, por estarmos perante paisagens que eram absolutamente fantásticas e que mobilizavam famílias e determinados setores. A paisagem é evidente que está ferida e hoje deixou de ser uma atração principal», admite.

Também o porta-voz da Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo (APAVT), Paulo Brehm afasta, para já, um cenário de grandes perdas para o turismo desta região. «As poucas indicações que recebemos até agora vão no sentido de não existir impacto negativo nas operações que estavam previstas, o que dá muita confiança para este verão. Não conheço a realidade em questão – Sertã –, mas a região centro no seu todo não deverá ser afetada, mas isso não quer dizer que não venha a acontecer cancelamentos pontuais», admitindo ainda que «em cima da hora o que acontece sempre nestes momentos é que há sempre alguém que cancela ou que liga para tentar adiar. São comportamentos perfeitamente comuns neste tipo de situações, mas umas semanas depois está reposta a realidade», refere ao SOL.

Aposta na promoção

Apesar dos responsáveis do setor estarem confiantes para este verão, Pedro Machado admite que a prioridade agora é criar condições para que seja feita uma verdadeira promoção à região de forma a minimizar esse potencial prejuízo principalmente para o concelho de Leiria. «É preciso agora valorizar este produto para um conjunto de outras mais-valias, nomeadamente para os eventos que já estavam previstos para este ano. E são eventos que achamos que podem e devem mobilizar os portugueses. São um conjunto de ações culturais, festivais de arte, musicais, gastronomia, entre outros. Vamos tentar procurar aumentar a sua visibilidade para que estes eventos se realizem da forma como estavam previstos», acrescenta.

E é a pensar nessa estratégia que os vários responsáveis do setor vão estar reunidos no próximo dia 29 de junho. Na mesma mesa vão estar presentes o Turismo de Portugal, Turismo Centro de Portugal, secretária de Estado do Turismo, as associações do setor e a agência do desenvolvimento para as aldeias do xisto. «Além do levantamento dos danos físicos que possam existir, é preciso perceber de que forma os instrumentos financeiros estão disponíveis para poder acudir de imediato, que campanhas vamos fazer e em que meios para projetar aquilo que tem de acontecer: a economia da região não pode parar», acrescenta ao SOL, Pedro Machado.

Já para os portugueses deixa um apelo: «Esta é a altura para visitarem a região». No entender do presidente do Turismo Centro, esta seria a atitude que Portugal e os portugueses deveriam ter, ou seja, de não virar as costas a um destino que foi fustigado por uma catástrofe, uma vez que, no seu entender, isso seria um sinal de solidariedade para as pessoas que lá estão. «Cancelar férias de verão nesta fase não me parece que seja a atitude que os portugueses deveriam assumir. E é evidente que o valor intrínseco da oferta turística não se esgota na paisagem, embora admita que essa valência é muito importante. Esse é um apelo que vamos fazer, para não deixarem de vir para cá, até pelo contrário é importante que haja um reforço em termos de visitantes», salienta.

O responsável lembra também que estes incidentes são impossíveis de controlar. «Infelizmente é frequente existirem incêndios em vários pontos do país, parecem calendarizados, porque ora arde no Algarve, ora arde no centro ou na Serra da Estrela. Queremos acreditar que foi uma catástrofe que queremos que não volte a acontecer, mas não podemos dizer que estamos livres disso. Também não temos garantia que isso não possa acontecer em Monchique, ou na Serra da Estrela ou em Peneda Gerês», alerta.

Zonas atingidas são ponto atrativo

As zonas mais fustigadas pelo incêndio são fortes pontos turísticos da região Centro. As praias fluviais são um verdadeiro chamariz não só para quem vive naquele concelho como também para quem vai de fora. Exemplo disso é a praia fluvial do Mosteiro ou a praia Mega – esta última é considerada uma das mais acolhedoras pela sua localização. Os turistas podem ainda optar pelas albufeiras do Carril ou da Bouçã.

Mas não é só de praias que vive esta vila no distrito de Leiria. Os percursos pedestres e os passeios BTT têm chamado a atenção dos visitantes mais radicais. A verdade é que esta zona não é um caso isolado. Também Castanheira de Pera tem vindo a atrair turistas. A praia fluvial das Rocas é um dos pontos atrativos. Aliás, muitas das vítimas mortais do incêndio regressavam desta praia quando foram surpreendidas pelas chamas.

Por sua vez, o concelho de Figueiró dos Vinhos é conhecido pela aldeia do xisto de Casal de S. Simão assim como pelo Casulo de Malhoa, antiga residência do mestre José Malhoa, entre muitos outros pontos atrativos.

Região alargada

Apesar deste possível impacto na região, os responsáveis do turistas acreditam que as metas de crescimento irão manter-se. Pedro Machado chama a atenção para o facto do turismo da zona centro não se limitar apenas ao concelho de Leiria. «Neste momento obviamente mantemos essa expectativa de crescimento porque, por um lado, foi infelizmente uma parte do território que foi afetado e que está circunscrito a um determinado produto – aldeias de xisto e praias fluviais – e essas estruturas continuam intactas, não há registo de grandes danos e, por isso, tem condições para receber turistas de imediato, obviamente sem a paisagem envolvente, mas a região centro é um mosaico de diversidade, é património mundial e, como tal, o turismo não se esgotou aqui», alertou ao SOL.

De acordo com o mesmo, a oferta turística do centro de Portugal mantém-se praticamente intacta. E dá números: esta situação afetou nove municípios, mas a região centro tem cem, o que significa que, 9% foi atingida, mas 91% de área mantém a sua oferta estruturada e sem ter sido afetada.

Uma opinião partilhada por Paulo Brehm. «A região centro é enorme e estes incêndios não aconteceram nos principais focos turísticos do centro», salientou.

A Associação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo apelou, no início desta semana, às suas congéneres europeias que difundam a todas as agências de viagens e operadores turísticos, e através destes aos seus clientes, o facto de Portugal, designadamente os destinos da Região Centro de Portugal, se manterem totalmente operacionais e seguros, apesar dos incêndios. «Decidimos de imediato tomar esta iniciativa, para tranquilizar os nossos colegas europeus, e desta maneira ajudarmos naquilo que está ao nosso alcance», afirmou.

Também a Associação Nacional de Turismo (ANT) espera que os incêndios no centro do país não tenham um impacto negativo na área turística. «Esperemos que não tenha uma imagem negativa no contexto do Turismo», afirmou o presidente da ANT, Desidério Silva.

E acrescentou: «É evidente que sentimos que muitas vezes estas imagens passam de uma forma negativa para o exterior. É preciso combater e contrariar isso e temos esperança de que o país não terá nenhuma situação negativa em termos do Turismo, por esses fatores, que podem acontecer em qualquer parte do mundo».