Passos obrigado a pedir desculpa depois de falar na existência de suicídios

Costa disse não querer “entrar aqui em debate com o líder da oposição”. Candidato do PSD enganou Passos

A tragédia de Pedrógão Grande continua propícia ao mistério. Já se teve um avião-fantasma, um repórter-fantasma e ontem anunciaram-se suicídios que, afinal, não se deram. Em Castanheira de Pera, Pedro Passos Coelho afirmou ter “conhecimento de vítimas indiretas deste processo, de pessoas que puseram termo à vida, em desespero”.

Para o líder da oposição e presidente do PSD, tal era prova de que “o Estado falhou e continua a falhar”, na medida em que essas vítimas “não receberam a tempo o apoio psicológico que lhes devia ter sido prestado”.

No entanto, depois de o Ministério da Saúde e da Administração Regional de Saúde desmentirem oficialmente essas afirmações, o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Pedrógão Grande veio assumir que fora ele a induzir Passos Coelho em erro.

“Fui eu que dei ao dr. Passos Coelho uma informação errada. Julguei que a informação era fidedigna e, afinal, não era”, disse João Marques, que também é candidato do PSD à Câmara Municipal de Pedrógão Grande nas eleições autárquicas deste ano e presidente da concelhia do PSD local.

“Felizmente não se confirma nenhum suicídio, ao contrário do que eu disse ao dr. Passos Coelho. Peço-lhe desculpas públicas por isso”, concluiu.

João Marques foi líder autárquico em Pedrógão de 1997 a 2013, não se recandidatando nas últimas autárquicas devido a ter cumprido o número máximo de mandatos.

O presidente da Câmara de Pedrógão Grande, Valdemar Alves, veio horas depois responder: “Corram com os boateiros porque efetivamente – e graças a Deus – não há confirmação nenhuma de suicídios. O que há são boatos.”

De volta a Lisboa para a apresentação da candidatura de Fernando Seara à Câmara Municipal de Odivelas, Pedro Passos Coelho pediu desculpa pelo equívoco, em declarações aos jornalistas. “Sinceramente, peço desculpa por ter usado um dado não confirmado. Não devia ter utilizado essa informação”, disse o antigo primeiro-ministro. Passos garantiu que não utilizara o dado como arma política, salientando que a “responsabilidade objetiva” do Estado perante a tragédia dos incêndios no distrito de Leiria se mantinha, pois é o Estado que “devia ter protegido a vida das pessoas”. As informações oficiais apontam para um número de 64 mortos e mais de 200 feridos.

“Não pode haver uma espécie de branqueamento político sobre situações que vão acontecendo. Uma coisa é assumir responsabilidades, outra coisa é fechar os olhos e fazer de conta que as coisas não acontecem”, continuou Passos.

Para o líder dos “laranjas”, é muito importante que haja “um mecanismo de reparação” depois de o Estado, a seu ver, ter falhado. Passos defendeu, também ontem, a criação de um mecanismo rápido de atribuição de indemnização às vítimas e, se o governo não acolher a medida, ao que o i apurou, o PSD poderá apresentar uma proposta legislativa nesse sentido.

Em Almada, num evento autárquico, o primeiro-ministro, António Costa, reagiu, considerando: “Não vou estar aqui a entrar em debate com o líder da oposição, nem creio que seja isso que os portugueses esperam do governo.”

Para Costa, “os portugueses esperam que o governo se empenhe no esclarecimento de tudo, que contribua para a reconstrução e para a reposição da normalidade da vida daquelas populações. Neste momento não vou contribuir com polémicas porque não tenho teses, não tenho pontos de vista”.

O dever do governo, para o primeiro-ministro, “é criar as condições para esclarecer tudo e total disponibilidade para que, tal como o líder da oposição propôs, a Assembleia da República crie uma comissão técnica independente e que o Ministério Público tenha toda a informação disponível para realizar o seu inquérito”.

“Vou aguardar serenamente as conclusões dessas informações. Mas eu não respondo antes de perguntar, nem concluo sem ser em função das informações que obtenho. Sobre polémicas, o líder da oposição fará as polémicas que entende, mas comigo não fará, porque não tenho um ponto de vista a defender”, concluiu o chefe do executivo.

Costa afirmou não querer tirar “conclusões antecipadas face aos relatórios que foram solicitados, mas ninguém pode deixar de estar revoltado com o facto de, até este momento, termos perdido 64 vidas humanas num incêndio daquela dimensão”.