Comboio histórico do Douro. Ao ritmo de outros tempos

Começou, no início do mês, mais uma temporada de viagens a bordo do Comboio Histórico do Douro. O programa tem cada vez mais adeptos e a maioria  dos passageiros são portugueses. Uma experiência em que o trote tem o ritmo de outros tempos e em que os brindes – as paisagens das margens do Douro…

«É mesmo uma viagem no tempo e uma viagem através da História do Douro». É desta forma sucinta que a passageira Joana Valente – que, no fim de semana passado, percorreu a linha férrea entre a Régua e o Tua a bordo do Comboio Histórico do Douro -, descreve ao b,i. a primeira viagem desta temporada.

Pode não ser uma rota com a dimensão do caminho de ferro transiberiano ou não ter o luxo do irmão mais novo de um Expresso do Oriente [ver páginas seguintes], mas este é um percurso brindado com vistas privilegiadas para as margens do Douro – classificadas pela UNESCO como Património da Humanidade.

No ano passado, a Comboios de Portugal (CP) conseguiu repor a locomotiva a vapor, afastada do percurso desde 2013. «Durante a o período de imobilização da locomotiva a vapor, o comboio histórico foi tracionado por uma locomotiva diesel da década de 60 (1967) que conserva todas as suas características originais», disse ao b,i. fonte da CP. 

Ainda assim, o número de passageiros do Comboio Histórico do Douro – explorado pela empresa desde finais dos anos 90 – parece estar cada vez mais na moda e soma do regresso ao passado com a beleza da paisagem é um programa que tem conquistado cada vez mais adeptos. Até porque estes não são os únicos atrativos à disposição do freguês. «A animação foi sempre uma constante durante toda a viagem, com trajes e cantares da época. Ainda houve tempo para visitar o mercado com produtos regionais, saborear os rebuçados da Régua e vinho do Porto», conta Joana, que ficou manifestamente fã deste percurso.

A ideia da CP é, aliás, proporcionar uma experiência transversal. Os números falam por si: em 2016, o Comboio Histórico do Douro transportou 9.152 passageiros. A viagem turística tem sido procurada, sobretudo, por portugueses, que representam 82% dos clientes.

João Almeida é outro passageiro a contar para as estatísticas dos nacionais, que fez também a rota há uma semana (a última viagem deste ano acontece a 29 de outubro). «A viagem começa com a partida de uma estação simples e discreta que se perde no meio dos restantes edifícios que percorrem a estrada junto ao Douro. Primeiro ouve-se um apito, característico de filmes antigos», começa por contar, explicando que viajou numa carruagem de primeira categoria. «Os bancos tinham acentos almofadados», diz entre risos.

A locomotiva 

Não é por conforto que os passageiros que procuram este serviço anseiam, mas antes a experiência de voltar ao passado. São 250 os lugares disponíveis nas cinco carruagens históricas de madeira, puxadas por uma carismática locomotiva a vapor modelo 0186, «construída em 1925 pela Henschel & Son», explicou fonte da CP ao b,i. 

A locomotiva esteve no estaleiro, como já referimos, entre 2013 e 2016 por uma boa causa e voltou ao Douro vinhateiro com uma nova caldeira, mais amiga do ambiente – uma vez que funciona a diesel em substituição do carvão – mas que é «uma reprodução da original». A substituição permitiu «um funcionamento da locomotiva com menos fumo, sem cinza e sem riscos de incêndio». «A energia usada para a sua propulsão é o vapor gerado pelo aquecimento da água presente na caldeira. Ou seja, nada tem a ver com o sistema de aquecimento ou a fonte de energia que é usada para o efeito».

Na estação do Pinhão, por exemplo, há direito a paragem e os passageiros podem observar o reabastecimento de água, essencial para o funcionamento do comboio. «Gostei de poder apreciar tanto na paragem do Pinhão como do Tua a forma como estes comboios efetuavam a sua manutenção», sublinha João Almeida.

Mas o ponto alto para os dois passageiros ouvidos pelo b,i. não se relaciona com a maquinaria – a paisagem é rainha e senhora e surge no topo da lista. «É lindíssima», diz Joana Valente. «A paisagem ao longo do percurso é fantástica, os socalcos das vinhas espelhadas nas águas do Douro, a ondulação criada pelos rios que fazem os cruzeiros no rio, tudo», afirma João Almeida.

A CP recebe um feedback semelhante ao longo dos anos, afirmando que os clientes destacam como «atrativo principal, o trajeto do comboio através das margens do rio Douro, entre a Régua e o Tua». «A beleza desta paisagem tem características únicas, que tornam este percurso uma experiência memorável e única», garante a empresa.

Se o sucesso deste percurso parece consolidado, a CP tem outro trunfo na manga – a partilhar de julho e até setembro, vai circular pela primeira vez em comboio histórico na Linha do Vouga. A viagem inicia-se em Aveiro e destino a Macinhata do Vouga, além de incluir uma visita ao centro histórico de Águeda. 

O ‘novo’ Comboio Histórico do Vouga consiste em três carruagens dos primeiros anos do século XX que serão puxado por uma antiga locomotiva a diesel.

Terminamos com uma curiosidade. A maior conexão ferroviária do mundo, que vai até ao Vietname, começa em Portugal: são 17 mil quilómetros desde a estação da Campanhã, no Porto, até ao destino final – Hanói, no Vietname. Um ponto de partida ou de chegada lusitano – pelo meio, não há pouca terra para ver.

Publicado originalmente na edição impressa do b,i. de 10 de junho