Ivanka Trump. O poder da mulher que fala em nome do pai

Ivanka ocupou o lugar do pai numa sessão da cimeira dos G20, demonstrando uma vez mais que, para Trump, a família está primeiro.

Donald Trump entregou parte do governo à família. Ao genro deu tantas, tão complexas e tão abrangentes pastas que Jared Kushner é regularmente encarado como “ministro de tudo”. Aos dois filhos Donald Jr. e Eric, o presidente entregou o tácito papel de seus defensores nas redes sociais e televisões, embora tenham também de gerir o seu império imobiliário, supostamente sem o seu conhecimento. À mulher, Melania, como é costume com as primeiras-damas americanas, cabe um irónico projeto de combate à violência nas redes sociais, mesmo que o seu marido e presidente seja um dos principais pirómanos do meio. O papel de Ivanka, embora consensualmente crucial, é muito mais vago.

A versão mais comum sobre o papel de Ivanka no governo americano assegura que ela é uma das mais influentes vozes na Casa Branca, mais poderosa que chefes de gabinete, estrategas, ministros e altos responsáveis públicos de carreira. Essa mesma história assegura que Ivanka é também a voz moderadora de Trump, a imagem de uma geração mais nova, nascida num meio liberal nova-iorquino e com perspetivas muito mais progressistas em temas como alterações climáticas, imigração ou cuidados de saúde. Ivanka ocupa um lugar importante no governo do pai e este fim de semana ocupou até a sua cadeira, quando o presidente americano decidiu sair de uma sessão da cimeira dos G20, em Hamburgo.

A fotografia foi recebida com críticas duras de quem suspeita que o governo está, em parte, a ser gerido como um negócio de família – não são incomuns as acusações de nepotismo – e dos que temem que a administração atribua tão pouca importância a diplomatas e especialistas que os substitui por pessoas pouco preparadas, como Kushner e Ivanka. “Ter a princesa Ivanka como representante dos EUA na mesa dos G20 é uma bofetada noutros líderes, nos principais responsáveis da administração e no povo americano”, escreveu o fundador da revista “Foreign” Policy, David Rothkopf. “Que tipo de mensagem está a ser enviada no maior fórum de líderes mundiais quando Ivanka substitui o pai ausente? A de uma monarquia americana.”

Plano principal

Não é incomum que líderes se retirem de sessões, mas nos EUA é inédito serem substituídos por familiares. O mais comum, aliás, é que no lugar do presidente se sentem responsáveis de topo. Ivanka é, de facto, uma das mais importantes conselheiras de Trump, mas o mesmo não é dizer que a filha mais velha do presidente é uma política sagaz ou que está a par dos temas – no caso, debatia-se África, migração e saúde, e estavam presentes os presidentes chinês e russo. E isto duas semanas depois de, numa das habituais entrevistas do canal conservador Fox News à família presidencial, Ivanka ter afirmado que não se considera uma “brilhante política” ou – numa tirada improvável, dado o seu cargo e influência – que tenta “evitar a política”. No entanto, a filha mais velha do presidente americano parece entrar em todos os palcos: acompanhou o pai nos seus primeiros encontros diplomáticos e, em Riade, num fórum de combate ao terrorismo, substituiu-o também quando ele se disse cansado da viagem.

Ivanka Trump não é uma amiba no governo americano. Na mesma cimeira dos G20 apresentou um nada irrelevante fundo apoiado pelo Banco Mundial destinado a ajudar mulheres empresárias em países em desenvolvimento. A conselheira tem uma agenda política dirigida para temas de apoios à família, alterações climáticas e direitos das mulheres, mesmo que ainda não tenha causado impacto nas duas frentes – são quase todos temas do lado oposto do governo Trump, que se prepara para aprovar uma reforma à lei da saúde de Obama, prejudicar os serviços públicos de saúde às mulheres e que já decidiu sair do Acordo de Paris.. O seu estatuto de celebridade na China pode ajudar às negociações com o governo de Xi Jinping, por exemplo, mas a sua posição é ambígua e fonte de desacordo. Ao mesmo tempo que ocupa o lugar do pai em cimeiras e reclama áreas de ação importantes, Ivanka declara, como fez ao “New York Times”, que não entende muito de “como funciona o governo”. Mas é otimista: “Acho que, com tempo, vou chegar ao sítio certo.”