A jogar é que nos entendemos

Em Portugal, cerca de um terço das pessoas joga pelo menos uma vez por semana. O PC continua a ser a máquina mais utilizada e a preferida dos jogadores mais assíduos, as consolas destacam-se por uma utilização mais social, transversal aos vários membros de uma família. A nível global, as plataformas mobile são as que…

Os videojogos foram um dos grandes passatempos da minha adolescência, chamavam-se jogos de computador na altura. Sofri com o barulho das cassetes a carregar o Paperboy no Spectrum, vibrei com o Golden Axe no Commodore Amiga. 

No PC acelerei em muitas estradas com o Test Drive, com as magníficas cores do monitor CGA. Lembro-me bem como fiquei feliz quando os meus pais, numa passagem por Andorra, me ofereceram o Game Gear da Sega. O Sonic foi um companheiro de muitas horas de viagem. Já na era do VGA, com 256 cores, o Command & Conquer e o Fifa foram campos de batalhas épicas entre amigos.

Hoje os videojogos são mais populares do que nunca e tornaram-se um dos pilares da indústria do entretenimento. Há profissionais de e-sports, um mercado de transferências de jogadores, patrocinadores e transmissões televisivas dos principais eventos. Na Coreia do Sul um evento de e-sports juntou mais de 40 mil pessoas num estádio.

Segundo a Newzoo, a indústria dos videojogos vale qualquer coisa como 90 biliões de dólares, mais do que o cinema de Hollywood. Aliás, são cada vez mais as semelhanças entre estes dois universos, partilham tecnologias, pessoas e até atores de renome interpretaram personagens em videojogos: Kiefer Sutherland, Liam Neeson, Seth Green ou Samuel L. Jackson já deram voz a personagens de jogos.

Em Portugal, cerca de um terço das pessoas joga pelo menos uma vez por semana. O PC continua a ser a máquina mais utilizada e a preferida dos jogadores mais assíduos, as consolas destacam-se por uma utilização mais social, transversal aos vários membros de uma família. A nível global, as plataformas mobile são as que mais crescem, 23,7% em 2016, enquanto as consolas já são as principais máquinas de jogos, com uma quota de mercado de 29%.

Esta é uma indústria que tem demonstrado uma notável capacidade de adaptação. Snake, Candy Crush e Angry Birds são três bons exemplos de jogos, conteúdos, que contribuíram para a afirmação do mobile e das redes sociais como plataformas de comunicação dominantes, a Xbox Live é uma comunidade com cerca de 60 milhões de utilizadores ativos, duas vezes o número que registou há dois anos.

Os modelos de negócio associados aos jogos também são muito interessantes, desde a tradicional aquisição do software, num suporte físico ou digital, até modalidades de compra dentro do próprio jogo, freemium ou in app purchases, que monetizam o software vendendo outros conteúdos, opções, para usufruir dentro da própria aplicação.

É interessante perceber a forma como as marcas aplicam alguns dos princípios dos videojogos à sua atividade, de forma mais ou menos consciente. Conseguir identificar num cliente um perfil de jogador, perceber se o que verdadeiramente motiva determinada pessoa é a fome de vencer, ganhar, ser reconhecido como o melhor, ou se o que verdadeiramente importa é participar e saber mais, para depois poder partilhar com outros, é uma informação relevante para decidir que tipo de mensagens lhe devem ser dirigidas.

Um aspeto onde os jogos são um fantástico exemplo de comunicação é na sua capacidade de fornecer feedback, quase sempre imediato, completo e assertivo. E recompensas, como passar de nível, o reconhecimento sempre que se bate um recorde (pessoal ou da comunidade), a constante evolução das personagens e do leque de opções… a forma como os jogos cativam as pessoas e as envolvem numa história é exemplar. Há alguma marca que não queira estabelecer esta relação com os seus clientes?

Não sendo a gamificação uma abordagem nova, tão pouco revolucionária, os videojogos são um produto altamente sofisticado, com cada vez mais adeptos em todo o mundo e com uma capacidade única de obter informações que permitem estudar o comportamento das pessoas. Se com duas ou três sessões de monopólio conseguimos facilmente perceber alguns traços dos outros jogadores, imaginemos o que se poderá aprender sobre alguém se conhecermos todos os momentos da sua experiência com os videojogos.

Serão as marcas a assumir a produção, distribuição de videojogos, como acontece com os conteúdos séries e filmes? O futuro dirá, para já ignorar este universo é passar ao lado de um dos conteúdos mais envolventes do mundo. Um caminho que todos os que ambicionam receber um GG no fim do dia não podem deixar de percorrer.

 

P.S.Quero dar os parabéns à Havas e à Fuel pela participação em Cannes, em particular à Inês Coelho e à Elsa Rodrigues pelo prémio ganho nos Young Lions.

 

*Responsável Planeamento Estratégico do Grupo Havas Media