Alterações climáticas. Chegou a era do G19+Trump

O G20 viu-se de repente transformado em G19+1, sendo esta divisão feita entre quem ainda acredita que é possível combater as alterações climáticas e Trump que, sozinho do outro lado da barricada, oficializou a saída dos EUA do Acordo de Paris

Alterações climáticas. Chegou a era  do G19+Trump

Durante uma hora, no domingo, choveu em Paris o equivalente a três semanas de precipitação média em julho. Portugal teve um mês de junho 2,92 graus mais quente do que é considerado normal para a época. No final do ano passado, o Ártico registou temperaturas até 20 graus acima da média registada entre 1958 e 2002. Está previsto que uma em cada seis espécies de animais desapareça caso nada seja feito para travar o ritmo das emissões de dióxido de carbono.

Conclusão: o cenário é preocupante, mas baixar os braços não é ainda solução. Aliás, a Comissão Europeia garante que o Acordo de Paris, que visa limitar o aumento da temperatura global a um máximo de 2 oC em relação aos níveis da era pré-industrial, é “irreversível”.

Esta tomada de posição europeia serve como uma espécie de resposta a quem achava que a saída dos Estados Unidos podia abalar os planos climáticos de futuro. Na verdade, é Donald Trump que fica sozinho perante outros 19 países dispostos a fazer tudo para ver os números do clima a melhorar. Há um mês, quando anunciou que o país queria “renegociar o acordo” para que “seja justo”, os restantes líderes mundiais marcaram a sua posição, mostrando-se indisponíveis para negociar.

Angela Merkel, enquanto anfitriã da cimeira do G20 que aconteceu a semana passada em Hamburgo, mostrou-se satisfeita por ver que os restantes chefes de Estado se mantêm unidos na luta contra as alterações climáticas, considerando ainda que a posição dos Estados Unidos “é de lamentar”. Mesmo assim, o país liderado por Trump compromete-se a trabalhar em conjunto com outros Estados para que juntos encontrem e utilizem combustíveis fósseis de forma mais eficiente.

Portugal é exemplo

Naquele que foi o primeiro encontro do G20 depois de os EUA terem anunciado a saída do Acordo de Paris, a Comissão Europeia assinala que a cimeira “surge numa altura em que os impactos das alterações climáticas estão a trazer sofrimento e estragos na Europa e no mundo”.

Num dos exemplos escolhidos, a Comissão Europeia não deixa passar o caso de Portugal e Espanha, onde “as dramáticas ondas de calor” provocaram “incêndios florestais mortais”, algo que “as alterações climáticas tornaram dez vezes mais provável”.

De facto, no fim de semana em que deflagrou o incêndio em Pedrógão Grande do qual resultaram 64 mortos e mais de 200 feridos, os termómetros registavam valores acima dos 40 graus em várias zonas do país. E apesar de ter sido palco do caso mais dramático, Portugal não ficou sozinho neste junho especialmente quente. Em Espanha, um fogo obrigou à evacuação de 1500 pessoas e em França, Suíça e Holanda foram ativados planos para dar resposta às ondas de calor.

ação humana

Apesar de, até ao momento, não estar provada outra teoria que não a da trovoada seca como origem do incêndio, já foi divulgado um estudo de-senvolvido por cientistas da World Weather Attribution (WAA) que faz a ligação entre as altas temperaturas de junho, que potenciaram os fogos florestais, e as alterações climáticas causadas pelo homem.
O estudo usa o exemplo de Portugal, mas também dos restantes países europeus que registaram temperaturas fora do normal no mês passado, para lembrar que a ocorrência das ondas de calor se tornou mais frequente, com dez vezes maior probabilidade de acontecer atualmente do que no início do século xx.
Como complemento, podemos ainda recordar um outro estudo sobre ondas de calor divulgado em junho pela revista

“Nature Climate Change”. Como resultado da análise de 30 mil publicações sobre ondas de calor, os cientistas sentem-se confiantes para garantir que, atualmente, cerca de 30% da população mundial está exposta durante pelo menos 20 dias por ano a ondas de calor que podem matar. Se as emissões de gases com efeito de estufa continuarem a aumentar ao ritmo atual, esta percentagem pode chegar aos 74%.

Com uma noção clara deste futuro pintado de negro, a Comissão Europeia alerta para o facto de estes eventos extremos se tornarem norma caso não haja uma ação ambiciosa nas alterações climáticas. No seguimento deste trabalho conjunto, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou a realização a 12 de dezembro de uma cimeira sobre o clima, durante a qual espera conseguir fazer com que Trump mude de opinião. “Confirmo-vos, pois, que espero convencê-lo”, assegura.