Brasil: muito a Temer

Quando um país assiste à condenação por corrupção de um político, mesmo que seja um ex-presidente e um dos seus mais carismáticos líderes, é essencialmente o político que tem um problema. Mas quando um país tem de lidar com investigações judiciais sobre corrupção e suborno que tocam os cinco últimos presidentes, 25% do senado, grande…

Quando um país assiste à condenação por corrupção de um político, mesmo que seja um ex-presidente e um dos seus mais carismáticos líderes, é essencialmente o político que tem um problema. Mas quando um país tem de lidar com investigações judiciais sobre corrupção e suborno que tocam os cinco últimos presidentes, 25% do senado, grande parte do congresso e a generalidade da classe política (a gigante alimentar JBS admitiu ter subornado 1839 políticos), então é o país que tem um problema. 

O Brasil recebeu a condenação de Lula da Silva a nove anos e meio de prisão entre a satisfação (dos seus opositores) e a revolta (do seu leal exército). «Quem tem o direito de decretar o meu fim [político] é o povo brasileiro», garantiu o petista no anúncio da sua pré-candidatura ao Planalto em 2018. Mesmo com uma inibição de exercício de cargos políticos durante 19 anos decretada pelo juiz Moro, Lula tenta colocar duas legitimidades em confronto: a justiça popular contra a justiça dos tribunais. Mas a situação do país é bem mais complexa e vai muito para além de Lula.   

Quanto ao futuro imediato, o nome que importa é Michel Temer. Com uma popularidade baixíssima (7%) e acusado de corrupção passiva, a grande questão é a de saber se aguenta os últimos 18 meses no cargo e guia o país até as presidenciais de 2018. Temer, um antigo aliado de Dilma e Lula, tem uma legitimidade política muito diminuída. Há quem acredite, porém, que uma certa estabilidade neste momento é desejável. Essencialmente por três razões. Primeiro: com menos de dois anos até ao fim do mandato, assim diz a lei brasileira, não há lugar a eleições. Caindo Temer é Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados) que assume a presidência. Problema? Maia também está implicado. Segundo: o interesse tático do congresso que também está a trabalhar para a reeleição. Quanto pior for a crise, pior as chances de reeleição. Brasília vive em agonia económica e política. A recessão é violentíssima, a insegurança está no pico, a economia encravou e a descrença no sistema é generalizada. O Brasil está obrigado a abraçar um programa de reformas que vão da segurança social ao mercado laboral, do sistema fiscal ao sistema político. Sem elas, «caixão e vela preta», como diz um amigo brasileiro. Com Temer a dar a cara pelas reformas, pode haver uma predisposição cínica para proteger o presidente. Terceiro: Temer, ele próprio um produto de um sistema corrupto, está obrigado a fechar este ciclo negro. Para que quem chegue em 2018, chegue fresco, limpo e preparado para um novo começo.  

À direita, João Doria (PSDB) e Jair Bolsonaro (Partido Progressista) são os nomes mais fortes.  Doria é perfeito de São Paulo, vem do mundo empresarial, tem um ar enxuto e um discurso arejado. É o mais próximo que há de um Macron na política brasileira. Com Alkmin e Aécio apanhados na rede de corrupção, Doria será o candidato tucano. Já Bolsonaro é da direita conservadora, dura (sobre o massacre de Carandirú chegou a dizer que «a policia militar deveria ter matado 1000 e não 111 presos)» e já o pintaram como Trump brasileiro. Também tem ficha limpa. Tal como Marina Silva (REDE), à esquerda, que já foi candidata presidencial com relativo sucesso. Especula-se que com Joaquim Barbosa, magistrado negro que liderou a investigação do Mensalão, poliglota e educado nas melhores universidades, esteja a preparar um ‘ticket’ presidencial. Há também Ciro Gomes (PT), ex-governador do Ceará que não consta das delações e será candidato se a justiça confirmar a inibição de Lula. Que, culpado ou inocente, continua a ser o político mais popular do Brasil. Não é Lula, é o país que tem mesmo um problema.