Curtas Vila do Conde. “A seleção portuguesa surpreendeu por ser superior à internacional”

Pela del Álamo, realizador e diretor do festival de cinema espanhol CurtoCircuito, é um dos membros do júri internacional da 25.ª edição das Curtas Vila do Conde, que termina este domingo com o Grande Prémio internacional atribuído a um filme português — “Farpões, Baldios”, de Marta Mateus. 

O que achou do conjunto de filmes que foram apresentados nesta edição do Curtas Vila do Conde?

Tanto na seleção internacional como na portuguesa encontrámos um nível muito elevado, mas há que destacar que a portuguesa nos surpreendeu agradavelmente por a qualidade média dos filmes ser, devo dizer, superior à da internacional. Isto tem muito a ver com o trabalho que fazem os produtores e os realizadores portugueses e com esta geração de cineastas como a Salomé Lamas, o João Salaviza, o Francisco Carvalho e o Carlos Conceição, que já estão nisto há algum tempo e que acolheram a importância de outros cineastas como o João Nicolau, o Sandro Aguilar e o próprio Miguel Gomes. É muito gratificante poder ver um país como Portugal ter tantos filmes tão diferentes e tão bons.

No seguimento disso, o Grande Prémio desta edição acabou por ser atribuído a um filme português: “Farpões, Baldios”, de Marta Mateus.

Para o júri internacional foi muito fácil tomar a decisão de atribuir o prémio ao “Farpões, Baldios”, da Marta Mateus. Assim que vimos o filme foi unânime: foi aquele de que mais gostámos e pareceu-nos além disso a melhor de todo o programa, incluindo o internacional. E deixou-nos muito contentes no 25.º aniversário das Curtas entregar o prémio a um filme português, além disso feito por uma mulher, de uma forma natural, como algo espontâneo e honesto não como um exercício forçado. É um prémio de que estamos orgulhosos como júris.

Como é que olha de fora para o cinema português, em particular para as curtas-metragens?

De Espanha temos uma relação bastante estreita tanto com a produção como com os festivais e com a distribuição e estamos orgulhosos — até invejosos — da forma como se trabalha em Portugal, porque apesar dos problemas que há com as instituições, os agentes privados trabalham de uma forma muito unida e os festivais são capazes de coexistir e de funcionar realmente como uma plataforma para dar visibilidade ao cinema português lá fora. Todos os programadores internacionais estão com os olhos postos aqui.

Porquê?

Creio que será fruto do trabalho que vem sendo realizado ao longo dos anos de uma forma constante por gente com uma clara vocação para o cinema. Isso gerou estruturas sólidas como a Agência da Curta Metragem em Vila do Conde ou o próprio IndieLisboa, que em 13 ou 14 edições se conseguiu posicionar como um festival de referência na Europa, e tudo isto tem a ver com convicções, com sonhos, com entrega e com muito trabalho acima de tudo. As coisas fazem-se com trabalho e realmente foi isso que levou Portugal — um país com uma tradição cinematográfica muito forte, desde mestres como o Manoel de Oliveira e produtores como o Paulo Branco, gente que há muitos anos abriu portas — ao lugar que ocupa hoje. Há uma tradição que tem uma continuidade e que tem tido uma renovação geracional.

Que importância lhe parece ter este festival na afirmação da curta-metragem portuguesa?

As Curtas Vila do Conde são um dos festivais com maior tradição em Portugal e têm feito um trabalho muito intenso nos mercados de difusão do cinema português, cuidando-o, acompanhando-o, protegendo-o. E coisas como o número de filmes selecionados para as Berlinale Shorts este ano têm muito a ver com o que se passa em Vila do Conde, que não criou apenas um núcleo de produção mas um núcleo em que se cresce e aprende. Se não fossem as Curtas Vila do Conde haveria muito menos encontros, muito menos enriquecimento. Os festivais são essenciais para isso. Devo dizer que no CurtoCircuito, o festival em que trabalho em Espanha, na seleção oficial teremos, num total de 50 filmes, dez portugueses. E isso, como digo, é fruto deste bom trabalho.