Martin Landau. Morreu o homem de todas as caras

Em “Missão: Impossível” foi Rollin Hand. No cinema trabalhou com Hitchcock, Francis F. Coppola, Woody Allen e Tim Burton, que lhe deu o papel com que, ao lado de Johnny Depp, ganhou um Óscar: Bela Lugosi em “Ed Wood”.

“The man of a million faces”, assim ficou para sempre Rollin Hand, mestre de disfarces de “Missão: Impossível” a que deu forma um Martin Landau que viria a provar-se um como ele. De Hitchcock a Tim Burton, Francis Ford Coppola a Woody Allen ou ao comandante John Koenig na série de ficção científica do tempo em que 1999 parecia um futuro longínquo: “Space: 1999”. Martin Landau, ator multifacetado que conviveu com James Dean, Marilyn Monroe e Steve McQueen, morreu no sábado passado, na sequência de “complicações inesperadas ocorridas durante um curto internamento”, confirmou um responsável do Ronald Reagan UCLA Medical Center à “Hollywood Reporter”. Tinha 89 anos.

Nascido em Brooklyn, Nova Iorque, em junho de 1928, filho de um maquinista judeu que tinha tentado a sorte numa carreira como cantor, Landau tinha 22 anos quando decidiu deixar o trabalho que tinha como cartoonista para o “New York Daily News” para tentar a sua sorte no teatro. Em 1955 foi, juntamente com Steve McQueen, um dos dois únicos alunos admitidos na audição para a escola de teatro Actors Studio, em Nova Iorque, onde aprendeu com nomes como Lee Strasberg, Elia Kazan, Harold Clurman, e se tornou amigo de James Dean.

“Era o meu melhor amigo. Éramos dois aspirantes a atores ainda sem trabalho, com grandes sonhos e a aproveitar cada momento”, recordou o ator numa entrevista à “Life” há poucos anos, a propósito de uma reportagem fotográfica sobre a vida de James Dean. “Passávamos imenso tempo a falar sobre o futuro, sobre a nossa profissão e sobre as hipóteses de se ser bem-sucedido naquele mundo completamente diferente e novo, constantemente em mudança em que vivíamos.”  

Dean, Monroe, McQueen, Brando

Do seu círculo mais próximo nesse tempo fez parte também Marilyn Monroe, com quem chegou a namorar por uns meses, numa relação conturbada, contou o próprio ao “New York Times” numa entrevista em 1988. “Ela podia ser maravilhosa, mas era incrivelmente insegura, ao ponto de fazer uma pessoa enlouquecer.” Mas não eram apenas Dean e Monroe a compor o seu círculo de amigos, no qual entrava ainda Steve McQueen, claro – que tinha um problema com James Dean, “porque era ele que ficava com todos os papéis de televisão” -, e ainda Marlon Brando.  

Um dos pontos decisivos na carreira de Landau terá sido o papel de Leonard em “Intriga Internacional” (1959), de Alfred Hitchcock, a sua primeira participação num filme de grande dimensão, dois anos depois de se ter estreado na Broadway com “Middle of the Night”, de Paddy Chayefsky, em que chamou a atenção do realizador, que assistiu a uma apresentação do espetáculo em Los Angeles. Quando Landau lhe perguntou porque o tinha escolhido para o papel de Leonard, braço-direito de Phillip Vandamm (James Mason), Hitchcock ter-lhe-á dito, segundo contou: “Martin, tens um circo dentro de ti.”

Depois de participações em “Cleópatra” de Mankiewicz (1963) e n’“A Maior História de Todos os Tempos”, de George Stevens, fez de assassino no Faroeste ao lado de Steve McQueen, em “Nevada Smith”, em 1966 – ano que viria a marcar o início da sua ascensão ao estrelato televisivo com a série “Missão: Impossível”, de Bruce Geller, onde o seu papel como Rollin Hand lhe deu um Globo de Ouro, além de várias nomeações para os Emmy. Estava ainda por vir a icónica “Space: 1999”, quando 1999 era futuro, que protagonizou como comandante John Koenig, ao lado de Barbara Bain (Helena Russell).

Outro Globo de Ouro, de Melhor Ator Secundário, viria no final da década de 1980, com um filme de Francis Ford Coppola, “Tucker – O Homem e o Seu Sonho”, com o qual teve ainda a sua primeira nomeação para os Óscares. A segunda, logo no ano seguinte, pela interpretação de Judah Rosenthal, ao lado de Claire Bloom (Miriam Rosenthal), em “Crimes e Escapadelas”, de Woody Allen. Regresso em grande ao cinema que culminaria com o Óscar – de novo de Melhor Ator Secundário – por “Ed Wood” (1994), o filme de Tim Burton protagonizado por Johnny Depp no papel do cineasta Ed Wood, em que Landau interpretou Bela Lugosi, o ator húngaro imortalizado pelo papel de Conde Drácula, no clássico de Tod Browning da década de 1930. Por “Ed Wood” foi ainda distinguido com mais um Globo de Ouro, o seu terceiro e último.

Depois desse filme, Landau passou, juntamente com Depp, a fazer parte do grupo de atores preferidos de Burton, que voltou a escolhê-lo para “A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça” (1999), “9” (2009) e “Frankenweenie” (2012).  Até ao fim da vida, Martin Landau continuou a trabalhar, entre o cinema e a televisão, e a colaborar com a Actors Studio que o formou, onde deu aulas e ajudou a formar a geração que se seguiu à sua em Hollywood. Entre aqueles que ajudou a formar estão nomes como Jack Nicholson, Anjelica Huston, Harry Dean Stanton e Shirley Knight, e ainda os realizadores Oliver Stone e Robert Towne. “É isto que me mantém jovem”, dizia sobre a proximidade que isso lhe dava com as gerações mais novas.

Como cientista paranoico, participou ainda em “Ficheiros Secretos: O Filme”; em 2008 contracenou com Ellen Burstyn em “Lovely, Still”, de Nicholas Fackler. Entre os seus últimos filmes estão “The Last Poker Game”, de Howard Weiner, deste ano, e “The Red Maple Leaf”, de Frank D’Angelo, de 2016. Por estrear, em fase de pós-produção, deixou uma curta e duas longas-metragens: “Without Ward”, de Cory Cataldo, e “Nate & Al”, de Noah Taft.