Declarações de Ventura atacadas dentro dos partidos que o apoiam

Entrevista ao i de candidato do PSD/CDS em Loures mereceu o repúdio de Teresa Leal Coelho e Francisco Mendes da Silva

Apelos à derrota, exigências de esclarecimento, queixas ao Ministério Público, repúdios internos, Passos Coelho ao barulho e um finca-pé. André Ventura, o candidato do PSD à Câmara Municipal de Loures, teve uma segunda-feira animada.

A polémica estalou após uma entrevista que deu ao i, publicada precisamente ontem, em que o também comentador futebolístico e professor universitário afirmou que “vários munícipes se queixam de pessoas de etnia cigana que entram nos transportes, usam os transportes e nunca pagam”.

“A etnia cigana, quer em Loures quer no resto do país, tem de interiorizar o manual do Estado de direito. E o Estado de direito não pode ter medo deles, independentemente das consequências”, disse também o candidato, acrescentando que os visados “vivem quase exclusivamente de subsídios do Estado”.

A primeira reação veio do CDS, por parte de Francisco Mendes da Silva, conselheiro nacional dos centristas e vice-presidente da distrital de Viseu. “Não há praticamente nada que André Ventura diga que eu não considere profundamente errado, ligeiro, fruto da ignorância e de um populismo que tanto pode ser gratuito, telegénico ou eleitoralista”, escreveu no seu Facebook, Mendes da Silva sobre o candidato que o seu partido também apoia, em coligação com o PSD. “Se perder, tudo bem: que nem mais um dia o meu partido fique associado a tão lamentável personagem”, concluiu.

O presidente da distrital do CDS/Lisboa, João Gonçalves Pereira, que é também porta-voz de Assunção Cristas, veio mais tarde exigir que Ventura esclarecesse as suas declarações “cabalmente”, recordando que Ventura foi “indicado pelo PSD” e que o CDS, por agora, só se pronunciará sobre o assunto no “interior da coligação”. Ventura, ao que o i apurou, é próximo de Cristas, a presidente do CDS, tendo sido colegas na Universidade Nova onde ambos são professores de Direito.

Porém, o maior repúdio do seu lado da barricada veio de Teresa Leal Coelho, a vice-presidente do PSD que é candidata à Câmara Municipal de Lisboa. Num comunicado enviado às redações, Leal Coelho considerou que as afirmações de André Ventura “só perpetuam os preconceitos e estigmatizam comunidades que fazem parte integrante do tecido demográfico das nossas cidades”, afirmou. “Não nos revemos nem em pensamento, nem em discurso de natureza”, acrescenta. “A diversidade e a multiculturalidade devem ser plenamente respeitadas e celebradas”, conclui.

André Ventura, também por via de comunicado, veio esclarecer as declarações, não se retratando ou retirando o dito. “Compreendo todas as especificidades, costumes e padrões civilizacionais de todas as raças, mas eles não podem esbarrar com os princípios do Estado de Direito constitucionalmente consagrados”, sublinhou o candidato a Loures.

“Boa parte das pessoas que fica muito incomodada quando são denunciadas estas situações nunca se deslocou a algumas dessas zonas e não tem ideia do ‘barril de pólvora’ que lá se vive diariamente”, ripostou, assegurando que nada o move “contra a comunidade cigana”.

Ventura garante que “o turbilhão de reações adversas, algumas a roçar o insulto, não vão inibir” a sua candidatura de “denunciar situações anómalas em defesa do bem-estar de todos os lourenses”.

“O que preocupa a candidatura são questões de segurança e cumprimento da lei, na defesa do património público e das pessoas de bem, independentemente da raça ou etnia. A verdadeira discriminação é permitir que alguns não cumpram a lei, em detrimento daqueles que vivem com as regras do Estado de Direito”, defende também o comunicado que terminou com uma demarcação de “qualquer associação de pessoas ou grupos, políticos ou civis de caráter racista ou xenófobo”. Ontem, coincidentemente, José Pinto Coelho, líder do partido nacionalista PNR, comentara a entrevista de André Ventura ao i: “Ao que parece, alguns dos ‘meus’ ainda andam pelos partidos do sistema”, ironizara.