A longa fuga de Carlos de uma Venezuela em crise

Chegou há quatro dias a Lisboa e quer ficar. A instabilidade na Venezuela fez com que viajasse desde a Valencia venezuelana à procura de outras oportunidades em Portugal

Vestido de negro, com auscultadores nos ouvidos, Carlos está sozinho, encostado a uma das paredes da estação de Santa Apolónia enquanto acaba de fumar um cigarro. Vai observando o lufa-lufa dos turistas a correrem para os respetivos comboios, os que saem de mapa na mão e os lisboetas que vão para o trabalho. O sotaque denuncia que não é português, mas, no fim, descobrimos que não é bem assim.

Nasceu há 28 anos em Valencia, na Venezuela, cidade com cerca de 870 mil habitantes no centro do país . É professor de Informática e teve de sair do país devido à instabilidade. A Venezuela está a passar por uma grave crise económica e social que tem motivado múltiplos protestos com o propósito de acabar com o governo de Nicolás Maduro.

“Tive de sair da Venezuela devido ao clima económico, social e político. Vim de propósito devido à instabilidade que há na Venezuela. Há muitos problemas. É impossível viver lá”, diz-nos Carlos, enquanto pisa a beata do cigarro que acaba de fumar.

Esta é a primeira vez que põe os pés no país e, mesmo estando na capital portuguesa há apenas quatro dias, Carlos já consegue apontar as muitas diferenças entre Portugal e a Venezuela: Lisboa “é uma cidade muito turística. Muito diferente da Venezuela. Eu estou aqui mesmo por isso”.

O professor de Informática ainda não tem trabalho em Lisboa, mas para já não pensa em voltar à profissão que tinha na Venezuela: “Para já só quero trabalhar em qualquer lado, depois quero procurar uma universidade para estudar”.

Hoje, a viagem não é longa. Vai de Santa Apolónia para a estação do Oriente para tratar dos assuntos inerentes a quem se quer estabelecer em Lisboa, desta vez vai “abrir uma conta no banco”, conta.

Carlos veio sozinho para Lisboa. Pela internet fez contacto com um outro venezuelano a morar na capital portuguesa e é na casa dele que tem pernoitado, mas “quanto mais rápido encontrar casa própria, melhor”, confessa.

Quando lhe perguntámos se Lisboa tinha sido a primeira opção quando se decidiu a sair de Valencia, a resposta é rápida e clara: “Sim!”. E a razão para a eleição da capital portuguesa faz sentido: “Lisboa foi a minha primeira opção porque tenho dupla nacionalidade”. Afinal, Carlos também é meio português. Os avós são da ilha da Madeira e emigraram para a Venezuela na década de 1960.

Recorde-se que na Venezuela vivem cerca de meio milhão de portugueses e lusodescendentes, grande parte oriundos do arquipélago da Madeira, tal como os avós de Carlos.

“Então e não quiseste voltar à terra dos teus avós?”, perguntamos. A resposta também é concisa e pragmática: “Não, Lisboa é melhor. É a capital, há mais trabalho…”