Seca. Um ano que não augura nada de bom

No final de junho, 80% do território estava em seca severa ou extrema e a água nas albufeiras está no nível mais baixo desde 1995. A produção de cereais gera preocupação

Pode ser um bom ano para a fruta mas, de resto, o tempo, como sempre, é que acaba por mandar. Previsões divulgadas ontem pelo Instituto Nacional de Estatística apontam para decréscimos generalizados na produtividade dos cereais de outono/inverno, que incluem trigo, centeio, aveia, cevada e triticale. A culpa é das elevadas temperaturas e da falta de humidade no solo nas fases de floração, e isto depois de um ano em que se registou a menor área de sementeira de sempre neste tipo de cereais (140 mil hectares), ainda assim com os melhores resultados desde 2008.

Segundo as previsões do INE para 2017, que acompanham a publicação das Estatísticas Agrícolas referentes a 2016, é expetável uma quebra de 5% no milho e também de 5% no arroz, neste caso devido ao baixo nível de armazenamento de água nas albufeiras. A situação das albufeiras mereceu esta semana medidas preventivas sobretudo no Alentejo Litoral, isto numa altura em que a seca regista os piores valores desde 1995 e 16 das 61 albufeiras monitorizadas no país estão a menos de 40% da sua capacidade, o que coloca em causa não só o abastecimento das povoações, mas também a produção de eletricidade. No final de junho, 80% do território estava em seca severa ou extrema.

A situação dos pomares é, ainda assim, boa notícia. No ano passado, as importações de fruta subiram 21,9%. O problema não foi o calor – já que 2016 registou temperaturas médias superiores ao normal e foi o sexto ano mais seco desde 1931. Foi a falta de frio no inverno que condicionou a diferenciação floral dos pomares. E, depois, a primavera foi fria e chuvosa, o que aumentou a vulnerabilidade a doenças como o míldio, que fizeram mossa, por exemplo, na vindima. A produção baixou 15%, mas o resultado, dadas as temperaturas elevadas, foram boas maturações, o que aumentou o teor de açúcar e reduziu a acidez, proporcionando vinhos de boa qualidade, diz o INE. No olival, o ano passado foi negro: a primavera mais chuvosa afetou os frutos, reduziu a azeitona e cortou a produção de azeite em mais de um terço (-36,4%).

Este ano, o perigo pode ser o calor e a seca e, no sul da Europa, não faltam alertas de que 2017, do ponto de vista meteorológico, não augura nada de bom. Comparando o mapa atual do Observatório Europeu da Seca com a situação de há um ano, verifica-se que nada tem a ver com a que se vivia então. Ao lado está o retrato do que se passava no início deste mês, com as zonas a amarelo a representar locais com défices de precipitação, as zonas laranja a representar défices de humidade e as zonas a vermelho indicativas de “stresse vegetativo”, situações que devem merecer alerta, segundo este observatório do Joint Research Centre da Comissão Europeia. Há um ano, nem a península Ibérica nem Itália tinham as manchas visíveis neste último mapa disponibilizado pelo observatório. Em Espanha e Itália, noticiou a agência Reuters, vive-se a maior quebra de produção de cereais dos últimos 20 anos. Teme-se ainda o impacto no olival e noutras produções, como a amêndoa. O International Olive Council prevê uma quebra de 60% na produção de azeitona em Itália. Nas redes sociais, a última publicação do Observatório Europeu da Seca mostra como os tempos são de preocupação. “O aeroporto de Córdova chegou aos 45 oC no último fim de semana (…) Provavelmente temos de adaptar as nossas legendas.”