Vivam os turistas e venham eles

O turismo dá emprego a muitas pessoas. O alojamento local sustenta muitas famílias lisboetas. A turismofobia é uma emoção pouco inclusiva

Alguns dos meus amigos passam bastante tempo a desancar no turismo em Lisboa. Queixam-se de andar aos tropeções nas ruas, dos tuk-tuks e, basicamente, de haver gente a mais. Sentem a falta de ‘lisboetas’. Ora, lisboetas eu conheço poucos em Lisboa. Lisboa sempre foi um lugar onde se chegava vindo de qualquer lado. Falo por mim, que não sou de cá. 

Não sendo de cá, vim para aqui nos anos 80 e lembro-me perfeitamente da decadência de Lisboa que mesmo pobre sempre teve lugares bonitos e o rio. É possível ter nostalgia da decadência, do lixo e da miséria. Na realidade é possível ter nostalgia de tudo o que aconteceu quando éramos jovens. O cérebro tem um piloto automático para esse tipo de reações emocionais. 

O turismo veio salvar não só a economia nacional como veio, na realidade, salvar Lisboa. 

Na entrevista que publicamos nesta edição, António Mega Ferreira toca nesse ponto sensível e lembra como era impossível andar na Baixa à noite com segurança há muito pouco atrás. 

Há meia dúzia de anos entrevistei um vereador da Câmara de Lisboa a quem fiz a pergunta que naquele tempo era obrigatória: «Quando é que a Baixa passa a ser habitável? Quando é que será reconstruída? Etc.». Ele respondeu com a esperança de que as coisas se compusessem porque já começavam a existir, na altura, «sinais» de recuperação na rua Nova do Almada. 

A chegada do turismo acabou com o problema da Baixa. Hoje pode-se andar a pé na Baixa sem ter medo. Os prédios estão reabilitados e não a cair aos bocados, como acontecia há sete ou oito anos. 

Como diz na entrevista Mega Ferreira, a saída da população de Lisboa não começou hoje. É antiga. Houve épocas em que era quase impossível alugar uma casa na capital. Claro que deve haver programas públicos de habitações a custo controlado, mas encarar o problema da habitação na cidade como tendo nascido depois da explosão do turismo é ignorar o que se passou antes.

O turismo está a dar emprego a muitas pessoas. O alojamento local sustenta muitas famílias lisboetas. A turismofobia não é um ato de gestão, nem da economia nem da sociedade. É uma emoção, aliás pouco inclusiva, que ignora ou esquece o passado decrépito de Lisboa.