Espanha. E tudo Rajoy negou

O presidente do governo espanhol disse que não a tudo e que nada sabia da rede de financiamento ilegal do PP. Mesmo nos seus anos de dirigente.

Mariano Rajoy entrou esta quarta-feira no tribunal pela garagem, evitando as dezenas de jornalistas na porta principal, preparados para capturar o momento em que, pela primeira vez, o presidente de um governo espanhol em funções falaria num julgamento. Ao líder espanhol, no entanto, coube-lhe evitar mais do que as fotografias. Rajoy procurou garantir que entrava e saía do tribunal de Madrid apenas como testemunha no vasto julgamento da rede de corrupção que operou durante vários anos no Partido Popular (PP). E não como réu.

Para isso recusou sete vezes e com muitos advérbios – “perfeitamente”, “absolutamente” – a ideia de que alguma vez esteve a par, foi beneficiado ou conheceu alguém no partido que soubesse ou gozasse do esquema de financiamento ilegal que o ex-tesoureiro Luis Bárcenas e outros conduziram entre 1990 e 2005. Isto apesar de, por muitos desses anos, Rajoy ter sido um dos principais dirigentes do partido, responsável, aliás, pelas campanhas do PP entre 1994 e 2000.

“Jamais me ocupei dos assuntos de contabilidade”, lançou Rajoy, naquela que foi a sua principal defesa. “A única coisa que me preocupava era que o Tribunal de Contas aprovasse a documentação e ponto final. Não me ocupei da contabilidade.”

Rajoy tinha muito que recusar e tudo recusou.

Negou, por exemplo – e com mais importância –, as acusações de Bárcenas, que diz que o presidente do governo foi um dos beneficiados; recusou que as mensagens que vieram a público e em que deseja “ânimo” ao tesoureiro e promete fazer tudo ao seu alcance para o ajudar tenham importância; que o carro e a secretária que o partido deu a Bárcenas quando este se foi embora foram algum tipo de suborno; ou que as duas reuniões em que lhe foram denunciados rumores do esquema de corrupção lhe tivessem parecido, na altura, credíveis.

Implausível

Praticamente desde que Rajoy é presidente do governo que os escândalos no PP lhe estão amarrados às costas.
O dossiê Bárcenas foi anunciado em 2013 e nesse mesmo ano explodiram na imprensa as desconfortáveis mensagens entre os dois camaradas de partido. O caso foi acrescentado a um que já estava em andamento, o Gürtel, que analisava o financiamento a dirigentes municipais e autonómicos do PP, sobretudo por parte de empresas em busca de contratos favoráveis.

Ao longo dos quase 20 anos em que a rede funcionou, Bárcenas amealhou cerca de 20 milhões de euros em contas na Suíça e, segundo ele, muitos militantes populares receberam uma cota-parte dessa riqueza, incluindo Rajoy. “É absolutamente falso”, respondeu o líder esta quarta. “Dispúnhamos do salário de deputado e bastantes pessoas tinham um complemento que lhes dava o partido e que se declarava às Finanças”, explicou.

Para a oposição e imprensa espanholas – até a mais conservadora –, Rajoy é incongruente ao dizer que nada sabia da contabilidade do partido nos seus anos de dirigente de campanha.

Esta quarta-feira, o líder do PSOE, Pedro Sánchez, pedia a sua demissão e acusava–o de ser o principal “responsável político do clima geral de corrupção que se vive em Espanha”. Pablo Iglesias fala numa nova moção de censura, desta vez em aliança com Sánchez.

Mas ao final do dia, como escreve o colunista Ferrer Molina no “El Español”, todos saíam a ganhar: “O PP, porque o seu líder mostrou o peito às balas e não manchou a vestimenta; o resto, porque acredita que a imagem de Rajoy se associa hoje um pouco mais à corrupção e porque já cobrou o que queria: a sua fotografia em tribunal. Mas daqui a quatro dias é agosto.”