Periférica. Depois da entrevista de João Pedro George, um esclarecimento

Na sequência da entrevista a João Pedro George publicada por este jornal, Vítor Nogueira, um dos directores da revista “Periférica” à data do episódio que levou à saída de Manuel de Freitas, como dele próprio e de outros dois colaboradores, vem esclarecer algumas confusões e equívocos

 

A propósito da entrevista que João Pedro George deu recentemente ao Jornal I, deixo, tão-só como curiosidade, o seguinte esclarecimento, relativo ao episódio contado à volta da Periférica. Não creio que o JPG mentisse deliberadamente, mas, de facto, a versão que ele apresenta não corresponde ao que se passou. Acredito, simplesmente, que não chegasse a conhecer todos os contornos dessa petite histoire e/ou tenha, com o passar dos anos, feito certa confusão.

O que esteve na origem da saída de Manuel de Freitas (e de outros, já lá irei) não foi, como George diz, a questão dos textos de algum modo antagónicos publicados simultaneamente sobre Rui Nunes. Basta reparar que esses textos saíram no n.º 6 da revista (no Verão de 2003) e Manuel de Freitas ainda colaborou no n.º 7 (Outono do mesmo ano). A cisão deu-se depois, quando João Pedro George propôs para o n.º 8 da revista um texto em que escrevia que Manuel de Freitas andava a ser «levado ao colo» (cito) por António Guerreiro.

Além de co-fundador, eu era o editor de poesia da Periférica. E, achando o texto injusto no seu conteúdo, senti que não tinha condições para continuar envolvido no projecto. Porque se o texto fosse publicado (viria a sê-lo de forma ligeiramente suavizada apenas no n.º 9 — ainda conservo, das trocas de e-mails, as duas versões), porque se o texto fosse publicado, dizia, além de injusto, viria desconsiderar um colaborador da Periférica que, sem ganhar um tostão (como todos os outros), estava ali a meu convite. E porque se o texto não viesse a ser publicado, como se admitiu na redacção, eu me sentiria sempre com o ferrete da censura do meu lado.

De maneira que saí. Não achei na altura outro caminho, com pena minha e de todos os restantes companheiros da redacção. De todos, sem excepção, ainda hoje me mantenho amigo próximo. Note-se, portanto, que quem começou por sair fui eu, não outrem. Com conhecimento dos membros da redacção, escrevi seguidamente ao Manuel de Freitas, ao Rui Pires Cabral e ao José Miguel Silva (os três poetas que eu convidara para formar uma espécie de núcleo duro — à falta de expressão melhor — na secção de poesia). Escrevi-lhes dando conta da razão pela qual saía, enviando-lhes o texto em causa de João Pedro George, a pedido dos meus ex-colegas de redacção (com quem, sublinho, tudo foi sempre tratado cordialmente), e dizendo a cada qual desses poetas que os elementos que se mantinham à frente da revista teriam o maior gosto em publicar os textos já propostos para esse número em construção (era o n.º 8, portanto) e em continuar a acolhê-los como colaboradores. E só depois disto é que Manuel de Freitas, Rui Pires Cabral e José Miguel Silva decidiram simultaneamente abandonar também a Periférica.

Não é que isso interesse muito, mas se escrevo assim convictamente é porque, além de ter vivido a história por dentro, conservo toda a correspondência a que aludi, produzida nessa altura.

Vítor Nogueira