Tauromaquia na RTP. Director antitouradas criticado por socialistas e PSD

Televisão pública decidiu diminuir o número de corridas de toiros e admite acabar com as transmissões. Alguns socialistas contestam a decisão e dizem que é uma “vergonha”. PAN acha natural, porque a tauromaquia está a “definhar”

“Esta direção de programas diminuiu significativamente o número de touradas por ano. A haver mudanças, será para reduzir o número de transmissões, dada a minha convicção (subjetiva, obviamente) de que as touradas representam maus tratos aos animais”“A RTP1, uma lástima que embaraça o Estado, cedeu. Quando tudo ceder, também ninguém se lembrará de onde a derrocada começou”É difícil falar em touradas sem gerar uma polémica. A última foi provocada pelo diretor de programas da RTP, Daniel Deusdado, que assumiu a vontade de transmitir cada vez menos corridas por “não ser uma boa prática o serviço público transmitir espetáculos com maus tratos a animais”.

O assunto não é novo. O parlamento já discutiu a proibição de corridas na RTP e restrições ao financiamento público, mas todos os diplomas do PAN, Bloco de Esquerda e PEV nesse sentido foram chumbados pelos socialistas, PCP, PSD e CDS. A direção da RTP, que entrou em 2015, decidiu, porém, cortar no número de espetáculos. “Não é ainda o fim, mas caminhamos para tal”, admitiu Daniel Deusdado.

A ideia de que podem acabar as touradas na RTP não agrada a vários socialistas que fizeram questão de assumir publicamente o desagrado com a decisão da direção da televisão do Estado. “A televisão pública sucumbiu, portanto, às imprecações de uma minoria especialmente exaltada. Mais um golpe na sociedade aberta, onde costumávamos caber todos. Um dia proibirão as touradas de vez. Um dia teremos os gostos e as vidas formatadas pelas prescrições de tribos agressivas de imbecis semi-educados e fanatizados pelas suas particulares fixações morais, e determinados a reeducar o seu semelhante”, escreveu Sério Sousa Pinto, deputado socialista, nas redes sociais.

“Uma vergonha” António Gameiro, deputado e presidente do PS/Santarém, classificou como “uma vergonha esta situação da RTP. A cedência é um sinal preocupante, porque demonstra que o serviço público serve só o gosto e interesses de alguns”. O ex-deputado socialista Ricardo Gonçalves também considera que “a RTP devia ser um serviço público para todos. Por este andar as touradas vão passar a ser quase clandestinas. A pressão dos fanáticos é enorme”.

A maioria dos deputados do PS é favorável à transmissão de corridas na televisão pública. Uma dezena de deputados, entre os quais estão, por exemplo, o ex-líder da JS Pedro Alves e a constitucionalista Isabel Moreira, apoia a decisão de limitar os apoios à tauromaquia. Tiago Barbosa Ribeiro, líder do PS/Porto e deputado, considera “uma grande notícia” a decisão da RTP de transmitir menos touradas.

À direita, PSD e CDS estão unidos na defesa das corridas de toiros. Nuno Serra, deputado social-democrata, defende, em declarações ao i, que “a televisão pública não pode deixar de transmitir os espetáculos que correspondem à vontade dos portugueses. As audiências aumentam quando são transmitidas corridas de toiros”. Serra argumenta que os gostos do diretor de programas não podem condicionar uma televisão que é paga por todos. “A televisão tem de abranger algumas coisas de que ele não gosta. Portugal é muito maior do que o diretor de programas da RTP. Não percebo como é que a RTP pode cortar laços com os portugueses que gostam de corridas de toiros”.

PAN prevê o fim A decisão da RTP foi obviamente bem recebida pelo PAN, que conjuntamente com o Bloco de Esquerda e o PEV, têm apresentado iniciativas na Assembleia da República para acabar com as touradas. Francisco Guerreiro, porta-voz do PAN, diz ao i que vê com “naturalidade” a decisão da RTP, porque “há cada vez menos espetáculos e menos espetadores. O setor tauromáquico está a definhar. Sabemos que, mais cedo ou mais tarde, a tauromaquia será abolida. Este caminho está a ser travado e está a ser ganho. Em 2015, os eventos de folclore tinham mais espetadores do que a tauromaquia”.

As boas audiências nas corridas de toiros não convencem o PAN. A última corrida transmitida pela RTP1, na Póvoa do Varzim, teve uma audiência média de 400 mil espetadores. “As pessoas, muitas vezes deixam a televisão ligada para fazer um pouco de companhia”, argumenta o dirigente do PAN.

A corrida da Póvoa do Varzim, transmitida pela RTP no final de Julho, mereceu duras críticas do Bloco de Esquerda. “Grave é também ser transmitida pela televisão pública, que banaliza esta violência em todo o país, incluindo para as crianças”, afirmou, em comunicado, o núcleo do Bloco de Esquerda da Póvoa de Varzim.

A RTP, este ano, vai transmitir apenas três corridas de toiros. Antes desta direção chegar à televisão pública, havia sete transmissões por ano.