Dose tripla de Aboubakar acentua a liga do (des)equilíbrio

Com um hat-trick do avançado camaronês, os dragões mantiveram o registo 100 por cento positivo (3-0 ao Moreirense), imitando os feitos de Benfica, Sporting e Rio Ave. Os vila-condenses são os ilustres convidados de uma corrida cada vez mais circunscrita aos mais poderosos

Foi o protagonista de uma novela de verão que parecia condenada a passar noutro país qualquer. Chegou a dizer que nem queria sequer pensar em voltar ao Porto. Depois, num “twist” daqueles dignos de um guião hollywoodesco, apareceu como se nada fosse nos treinos sob as ordens de Sérgio Conceição e tornou-se na principal referência atacante deste super FC Porto. Neste jogo com o Moreirense, não jogou sozinho, mas um jogador que marca três golos num jogo – ainda por cima os únicos três que se marcaram – tem de ser, forçosamente, nota de destaque.
O jogo em si não teve grande história. Como tinha acontecido na véspera com Benfica e Sporting, que cedo deitaram por terra os planos dos técnicos de Belenenses e Vitória de Guimarães. Nestas coisas, o truque é marcar cedo e mais do que uma vez, de preferência. E foi precisamente isso que o FC Porto de Sérgio Conceição fez. Não tão cedo como os rivais, mas fez. Aos 21 minutos, já vencia por 2-0 – estava arrumada a questão. Três minutos antes, Aboubakar tinha aberto o marcador, respondendo de cabeça a cruzamento de Alex Telles; depois, fez melhor que Marega e Óliver, batendo o desamparado Jhonatan à terceira tentativa. Contas feitas, já vão duas vitórias consecutivas dos portistas com intervenção decisiva do camaronês, depois do golo solitário que valeu o triunfo em Tondela.
Construiu, depois, ocasiões mais que suficientes para igualar ou até suplantar os 5-0 dos rivais. O guardião do Moreirense – de longe a melhor unidade da equipa nesta tarde – negou golos a Felipe e Danilo ainda na primeira parte e a Hernâni na segunda, com o ferro a fazer o mesmo com Marega, no que seria um golaço. Com os homens de Manuel Machado completamente inoperantes em termos ofensivos, o terceiro golo chegou mesmo, com um alívio de Marcano a transformar-se instantaneamente numa assistência para o hat-trick de Aboubakar e o topo da lista dos melhores marcadores partilhado com Jonas. Até ao fim do encontro, destaque apenas para um remate perigoso de Arsénio, parado com classe por Casillas.
O desfecho, diga-se, não surpreende ninguém: nos sete embates anteriores entre FC Porto e Moreirense no Dragão, os azuis-e-brancos contavam… sete vitórias. E o próprio histórico de Manuel Machado no terreno dos dragões era conclusivo: em 14 jogos, o melhor que havia conseguido eram dois empates. Além disso, eram já 21 os jogos consecutivos do FC Porto sem perder em casa para as competições nacionais – marca de respeito, pois claro. No fim, os portistas cumpriram a sua parte, somando já oito golos marcados e nenhum sofrido em três jornadas. Um passeio no parque.

Grandes mandam O triunfo do FC Porto consumou um pleno que não se via há 23 anos: desde 1994/95, época em que as vitórias ainda valiam apenas dois pontos, que os denominados três grandes não venciam todos os seus jogos nas primeiras três jornadas. É um dado impressionante, mas real. Nessa temporada, acabou por ser o Benfica, então campeão em título, a quebrar a corrente, ao ser derrotado em Leiria (0-1) na quarta jornada. No fim, o FC Porto de Bobby Robson festejaria aquele que acabaria por se tornar no primeiro de cinco campeonatos consecutivos.
Na verdade, em toda a história do campeonato nacional, esta é apenas a quarta vez que Benfica, FC Porto e Sporting conquistam três vitórias nas primeiras três jornadas. Antes de 94/95, tal só havia acontecido em 90/91 e 83/84. No campeonato que abriu a década de 90, os dragões ficaram seis jornadas sempre a vencer e os leões de Marinho Peres somaram a impressionante marca de 11 triunfos consecutivos a abrir! Ainda assim, no fim seriam as águias a festejar a conquista do título, tal como em 1984.
Olhando para a classificação, pode ficar-se com a ideia de equilíbrio, com quatro equipas a partilhar a liderança – menção para o belíssimo arranque do Rio Ave de Miguel Cardoso, na sua primeira aventura como técnico principal. O problema, do ponto de vista de quem gosta verdadeiramente do jogo, é que esse equilíbrio é apenas e só aparente. É certo que a segunda jornada foi muito, muito complicada para os três grandes – todos venceram por 1-0 e com bastantes dificuldades. Mas o 4-0 do FC Porto ao Estoril, na primeira jornada, e sobretudo os 5-0 de Benfica (na Luz com o Belenenses) e Sporting (em Guimarães, na casa do Vitória) nesta jornada mostram como este campeonato configura uma luta desigual de forças. Veja-se o saldo de golos das três equipas: o Benfica soma nove golos marcados e um sofrido, frente ao Braga – uma das melhores e mais ambiciosas equipas em prova; FC Porto e Sporting seguem com oito golos marcados e nenhum sofrido. Sintomático.
Vem aí a jornada quatro, e essa sim pode provocar algumas ondas nesta ditadura dos grandes. No próximo sábado, o Benfica desloca-se a Vila do Conde, no que se afigura como o primeiro grande teste ao tetracampeão nacional – pese as dificuldades sofridas em Chaves. No dia seguinte, o FC Porto visita a Pedreira, para enfrentar um Braga que atravessa naturais dores de crescimento, mas que será sempre um adversário temível. Sobram razões para sorrir ao Sporting, que recebe o Estoril e terá à partida a tarefa mais facilitada. Mas com o Vitória de Setúbal também tinha, e depois foi o que se viu…