Editorial do b.i.: Graça Fonseca

Graça Fonseca, secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa, é uma pessoa reservada. É a própria que o diz na entrevista ao Diário de Notícias em que assume a sua homossexualidade. «Só dei uma entrevista de fundo até esta. Prezo muito a minha vida privada, é o meu espaço de liberdade. E quem tem…

Graça Fonseca, secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa, é uma pessoa reservada. É a própria que o diz na entrevista ao Diário de Notícias em que assume a sua homossexualidade. «Só dei uma entrevista de fundo até esta. Prezo muito a minha vida privada, é o meu espaço de liberdade. E quem tem vida pública precisa desesperadamente de vida privada. É o reduto de segurança, onde ninguém pode tocar», sublinhou.

Não conheço ninguém para quem assumir a homossexualidade não fosse um ato de coragem. Graça Fonseca certamente preferia manter o seu reduto sem brechas – teve a força de o fazer por saber que tinha de usar o exemplo do cargo público que ocupa para, roubando-lhe de novo as palavras, «abrir mentalidades». Uma decisão que, garantiu, é «política». Na entrevista, usa uma expressão que, a meu ver, sintetiza o seu ato. A «empatia».

Mesmo que não se concorde com a decisão de se levantar o véu da vida privada, desvalorizar e ignorar o ato de Graça Fonseca não só é um argumento paupérrimo como mostra um desconhecimento até patético do que é não ser aceite por quem se é. De ter que esconder a orientação sexual, a religião, de ser discriminado pela cor da pele.

Graça Fonseca deu mais um passo nesta coisa que é a aceitação e respeito pleno pelo outro. Fê-lo numa altura em que o ódio no mundo, em vez de encolher, floresce. Floresce não – é um verbo com demasiada esperança para usar na mesma frase. Em que o ódio alastra, qual mancha de petróleo.

Veja-se Charlottesville. Veja-se Barcelona. Veja-se o ataque à discoteca Pulse, em Orlando. Todos eles atos de ódio por motivos diferentes, todos iguais na hora de não respeitar a opção do outro.

Num outro mundo, aquele a que Graça deu mais um tijolo para construir, seria principalmente lembrada pelo seu percurso político e por ter montado um mecanismo na câmara de Lisboa, que levou depois para o país, e que, na minha opinião – e numa altura em que a política é, para tantos, algo tão distante – é um dos mais interessantes instrumentos de participação da sociedade civil na construção do espaço, o orçamento participativo.

Agora, Graça Fonseca vai ser também recordada como a primeira governante a assumir a homossexualidade depois de entrar em funções. Que a sua mensagem de empatia nos ajude a construirmos um lugar onde ser gay, preto, católico, branco ou muçulmano não faça notícia.