Apedrejamentos com palavras

À mais inofensiva notícia ou opinião surgem insultos muito pouco dignificantes – sobretudo para quem os faz

Não são raras as vezes em que as crianças indicam de dedo espetado pessoas que consideram diferentes – ou com características particulares – ao mesmo tempo que as denunciam alto e bom som. Os pais, vermelhos de vergonha, explicam baixinho aos filhos que, ainda que aquela senhora pareça efetivamente uma bruxa, não o podemos dizer em voz alta. 

– E não se aponta!

– Porquê?

– Porque é falta de respeito e é falta de educação. As pessoas não gostam. Ficam tristes.

Do meio do seu natural egocentrismo, as crianças não ficam muito convencidas, mas geralmente fazem o favor aos pais.

Não defendo que se deva cortar a espontaneidade das crianças ou muito menos desencorajar a honestidade, mas considero que o respeito pelos outros é um valor muito importante e que sabermos guardar para nós, ou partilhar com alguém próximo, considerações que podem magoar outras pessoas, é conciliável com estas qualidades tão genuínas e não faz mal a ninguém.

Se em relação aos filhos a maioria dos pais tem esta atitude, no que toca a si próprios alguns tomam um caminho bem diferente. Pelo que vemos nas redes sociais, bem como em notícias ou artigos de opinião, é rara a publicação sem uma reação. Na sua grande maioria trata-se de comentários negativos e pouco construtivos, que visam mais o autor do que o conteúdo. À mais inofensiva opinião surgem insultos muito pouco dignificantes, principalmente para quem os faz. Com frequência percebe-se facilmente que a notícia ou artigo nem foi lido na totalidade e apenas se passou os olhos pelo destaque. Parece uma investida compulsiva numa guerra de opiniões.

Não sou obviamente contra a liberdade de expressão – nem do autor, nem do leitor. Mas parece-me haver uma grande confusão entre a evolução que representa podermos expressarmo-nos livremente e o retrocesso de nos ofendermos gratuitamente.

Faço parte de um grupo de mães no Facebook de onde já pensei várias vezes sair por situações destas. Se por um lado presta um apoio constante e incondicional a quem ali pede ajuda, a maioria das vezes de forma muito solidária, por outro, quando o apelo é suscetível de condenação, há uma chacina em palavras. Não me hei-de esquecer de uma mãe que pedia conselhos sobre colégios internos para o filho. Ninguém sabia, nem tinha de saber, em que circunstâncias a decisão foi tomada ou este pedido foi feito. Souberam no entanto fazer tantos comentários e tão agressivos que a resposta a um pedido de ajuda foi um apedrejamento na praça pública.

Ao contrário das crianças, que soltam os seus comentários sem maldade, quem tem este tipo de reação é tudo menos inocente. Vive numa espécie de zanga permanente e aproveita estas oportunidades para a dividir com a vítima mais a jeito. Quem se sente bem consigo gosta de viver em harmonia e não tem esta estranha necessidade de criar mal-estar nos outros. E muito menos perde tempo com isso.