Autárquicas, OE e Autoeuropa

Isto de ter autárquicas a 1 de outubro e o OGE 2018 a ser apresentado a 15 outubro dá mesmo um jeitão aos partidos do Governo! Chama-se a isto fazer 2 em 1; ou seja, poder influenciar umas eleições com o anunciar de medidas bem simpáticas para a maioria dos eleitores. Não é a primeira…

São vários os anúncios do Executivo de benesses económicas a distribuir por um vasto eleitorado, desde a revisão de pensões em agosto (custo adicional estimado de 50 M este ano e cerca de 120 M para 2018), o atribuir de pré-reformas no Estado com larga carreira contributiva (com custos para 2018 estimados em 60 M, mas que até considero de elementar justiça social!), o descongelamento de carreiras (leia-se promessas de revisões salariais sobre as quais não conheço efeitos financeiros para 2018), promessas de integração nos quadros do Estado abrangendo diversas categorias profissionais (idem) ou ainda mexidas nos escalões de IRS (em resposta a Pedro Nuno Santos que pede moderação, Catarina não faz por menos e exige devolução de 600 M!). Só que isto tudo tem um pequeno detalhe: para dar com uma mão, claro que tem de tirar com a outra, dado que os valores que tudo isto implica no erário publico terão necessariamente de ser suportados por todos nós – obviamente pela via fiscal, como sempre. Não há milagres, como estes anos amplamente têm demonstrado.

Senão vejamos: a receita fiscal tem vindo a aumentar significativamente em quase todos os impostos, como bem demonstram os últimos valores acumulados a julho 2017 (22,3 MM), em que se regista um acréscimo de 4,4% face ao mesmo período do ano anterior, obviamente também puxados pelo crescimento da economia, com valores estimados próximos dos 3% em 2017 (2,8% no último trimestre, de acordo com últimos dados) e isso tem contribuído para tanto otimismo governamental e anunciados planos de distribuição imediata desta riqueza.

Aquela recomendação de que o rácio do PIB face à dívida pública não deve ser superior a 60 % (estando atualmente em cerca de 130%) parece não afligir o Governo, que continua a gerir esta questão como se a mesma não tivesse qualquer importância para os rácios de ‘lixo’ com que as agências de rating nos mimoseiam.

Apenas subsistem uns economistas, logo rotulados de direita (porque os de esquerda acreditam no milagre das rosas!), que defendem dever ser privilegiada a gestão da dívida pública, aproveitando a ‘boa maré’, sempre com receio inerente à incerteza das receitas fiscais, muito dependentes da economia. Neste caso, falo objetivamente no grande sustentáculo do crescimento, as exportações, e o risco de  poderem diminuir. No turismo, por exemplo, que regista um boom nestes anos, a capacidade de absorção nas grande cidades começa a chegar ao limite, sobretudo em Lisboa, que revela já alguma incapacidade estrutural de resposta. Se o encantamento internacional se esvanece, com predominância de críticas nas redes sociais resultantes deste crescimento desmesurado, é possível pensar em consequências nefastas na receita fiscal.

Acrescento que não quero nem pensar nos impactos que estas greves irresponsáveis e verdadeiramente políticas na Autoeuropa possam vir a ter com deslocalizações de produção. Se assim for, como irá o Estado financiar-se a seguir?

Ainda sobre estas autárquicas quero apenas deixar uma reflexão sobre o elevado número de antigos autarcas que estiveram em vários mandatos nas suas Câmaras e que procuram regressar. Os fins justificam os meios e, se os partidos não os acolhem, nada como beneficiar da lei de 2009 feita para possibilitar candidaturas a cidadãos fora dos partidos. Assim, lá vão eles integrados em ‘grupos de cidadãos’, como se fossem independentes.

Obviamente que estão no seu pleno direito cívico, admitindo que os tribunais validam estas listas (embora eu ache que pessoas condenadas não deveriam candidatar-se a cargos públicos!). Mas para mim pergunto: o que será que os faz correr? A necessidade de protagonismo? O facto de terem sido importantes e de súbito terem voltado à condição de cidadãos? Não saberem fazer mais nada depois de tantos anos nas autarquias? Impressiona não perceberem que a limitação de mandatos se fez exatamente para evitar feudos nas autarquias como forma de defesa das democracias. Além disso, será que não percebem que há que dar lugar aos mais novos, ansiosos de mostrar serviço e, com isso, beneficiarem as populações? Uma pena não se saberem retirar, não perceberem que, tal como Salazar teve de cair da cadeira para sair do poder, o prolongar do poder (em qualquer setor), além de criar vícios ditatoriais, apodrece a democracia!

 

P.S.1 Sobre a Autoeuropa há que falar claro: aproveitando a saída de António Chora em Janeiro 2017, a CGTP desautorizou a comissão de trabalhadores querendo claramente liderar as reivindicações sociais e, em particular neste caso, marcar posição sobretudo perante o Governo, implicitamente dizendo: «Se na Autoeuropa fomos capazes de fazer greves e se de futuro querem paz social, lembrem-se que têm de negociar connosco!». Além de hipotecarem futuros investimentos em Portugal, porque a VW nunca se vai esquecer desta greve, devem julgar, e por incrível que pareça até convencem os trabalhadores (será que desconhecem o que se passou em Espanha há cerca de uma década?), que deslocalizar produções para fábricas noutros países é muito difícil para qualquer multinacional. Como se enganam!

P.S. 2 Será que a CGTP acha que potenciais investidores de que tanto carecemos vão ignorar estas greves em Portugal?