Afinal, o que quer Kim Jong-un? Ninguém sabe

Sobrevivência do regime, respeito internacional ou a invasão militar da Coreia do Sul?

No começo do programa nuclear norte-coreano e até ao ponto em que as primeiras bombas atómicas começaram a detonar nos fossos subterrâneos de Punggye-ri, a comunidade de analistas e observadores dos assuntos do Norte pareciam ter uma resposta consensual sobre o que motivava o regime: Kim Jong-il e, depois dele, Kim Jong-un, querem garantir a sobrevivência da dinastia e evitar que lhe aconteça o mesmo que a Muammar Khadafi, na Líbia, ou a Saddam Hussein, no Iraque. O primeiro negociou o fim do seu programa nuclear a troco de melhores relações económicas com o Ocidente. Os contratos não vieram, mas as bombas, sim.

Mas à medida que os programas militares norte-coreanos se desenvolvem e entram em novos patamares de sofisticação, a teoria da sobrevivência do regime parece esgotar-se. Kim tem bombas e mísseis avançados quanto baste para atingir devastadoramente o Japão e a Coreia do Sul. Essa é a razão, aliás, pela qual os Estados Unidos e países aliados não pensam hoje seriamente em guerra. Qualquer intervenção militar contra a Coreia do Norte causaria a morte de centenas de milhares de pessoas. Possivelmente mais de mais de um milhão. E se é verdade que os novos mísseis intercontinentais do Norte parecem não ser para já capazes de transportar ogivas nucleares – há dúvidas sobre se sobreviveriam à reentrada na atmosfera – esse avanço pode fazer muito mais por provocar os Estados Unidos do que para os dissuadir.

Por estes dias, o melhor que há são hipóteses. Kim, por exemplo, pode entender que a verdadeira dissuasão a uma entrada militar americana só surge num patamar de maior paridade com os Estados Unidos, adquirindo bombas de hidrogénio e mísseis capazes de as enviar credivelmente para território americano. Pode ser também que a grande intenção seja a de conseguir chantagear os vizinhos asiáticos e americanos, exigindo, por exemplo, a retirada das dezenas de milhares de militares que Washington tem estacionadas a algumas centenas de quilómetros da capital. É plausível que o regime norte-coreano deseje ser simplesmente levado a sério no mundo, ver-se reconhecido como um Estado nuclear e ter alguma coisa a dizer nos assuntos da região. Ou pode ser que queira tudo isto ao mesmo tempo, que não haja um plano definido e que depois de conseguir a saída das tropas americanas, o seu objetivo passe a ser o de invadir mais facilmente a Coreia do Sul e enfim reunificar a península.

A resposta mais simples é a de que ninguém sabe. A Coreia do Norte é um beco escuro para espiões e, na ausência de canais de diálogo – sempre existiram com Irão, Líbia e Iraque, por exemplo –, não há governos seguros das intenções do Norte. Nem mesmo a China. Muito menos os Estados Unidos, que ouviram o seu Presidente, Donald Trump, dizer há poucos dias que respeitava o facto de Kim «estar a começar a respeitar-nos». «Quem disser que sabe o que a Coreia do Norte quer está a mentir ou a adivinhar», explicava esta semana o investigador da Carnegie, Jon Wolfsthal, especialista em política nuclear, falando ao diário New York Times. «Nem sequer sabemos o que é que Kim Jong-un comeu ao pequeno-almoço, como é que vamos adivinhar o seu grande objetivo? Simplesmente não dispomos de grandes informações sobre o seu modo de pensar».