Bielorrússia. Moscovo testa máquina de guerra às portas da NATO

Exercícios conjuntos com Minsk envolvem soldados, artilharia, navios de guerra e aviões de combate, e deixam polacos, ucranianos, lituanos, letões e estónios em estado de alerta

Entre os diversos exercícios militares que constam no calendário russo, dificilmente se encontra um que consiga ombrear com a operação Zapad, no que toca ao impacto mediático junto dos membros da NATO – e, claro está, na quantidade de páginas que ocupa nos jornais ocidentais. Uma primeira justificação para tal realidade encontra-se na tradução do termo: Zapad é a palavra russa para “ocidente”. E desde os tempos da União Soviética que dá nome a gigantescas manobras militares, realizadas de quatro em quatro anos, na região ocidental do território russo.

A edição deste ano do Zapad arrancou esta quinta-feira e inclui exercícios na Mãe-Rússia, no enclave de Kaliningrado – no Báltico – mas decorre em grande medida na Bielorrússia. Até à quarta-feira da próxima semana, estes territórios serão palco dos mais variados ensaios militares que, de acordo com os dados fornecidos pelo Ministério da Defesa da Federação Russa, envolverão 12700 soldados – 7200 bielorrussos e 5500 russos –, e praticamente todo o tipo de armamento militar utilizado num conflito bélico convencional, como peças de artilharia, tanques, aviões e navios de guerra.

A mobilização da máquina de guerra russa junto às fronteiras da aliança atlântica foi naturalmente descrita pelo Kremlin como um “exercício rotineiro e previamente calendarizado”, mas está a gerar desconfiança e receio na Polónia, na Ucrânia, na Lituânia, na Letónia e na Estónia, os membros da NATO geograficamente mais próximos do cenário montado por ocasião do Zapad. “O exercício é uma ameaça para nós, não importa o que diz a Rússia. É agressivo e perigoso, está muito longe de ser defensivo”, alertou o ministro da Defesa polaco, Antoni Macierewicz. “Não vamos sucumbir à intimidação”, garantiu, por seu lado, o presidente da Letónia, Raimonds Vejonis.

Todo e qualquer exercício militar costuma balizar-se por um teste à capacidade de resposta militar, logística e organizacional de determinada força de combate a uma ameaça genuína, através da simulação e ensaio de situações que se querem o mais reais possível. Numa entrevista recente ao i, o jornalista e escritor Tim Marshall, atestava esta evidência, afirmando que em tempos de paz, “todas as nações do mundo estão a preparar-se para o dia em que a guerra regressará”. Neste sentido, e apesar de um cenário de invasão russa estar (de momento) totalmente fora da equação, compreende-se a apreensão espoletada pela presença russa na região, particularmente numa altura em que as relações entre Ocidente e Rússia atravessam um dos seus mais negros períodos e tendo em conta os sucessivos reforços dos contingentes militares das duas forças, nos últimos meses.

Ainda assim, para o investigador do Programa da Rússia e Eurásia da Chatham House, Keir Giles, mais relevante que a presença de soldados e armamento militar inimigo naquela zona do continente europeu nos próximos dias, é aquilo que os russos por lá podem deixar. “A enorme cobertura que a comunicação social vai fazer sobre aquilo que se passará na Bielorrússia entre 14 e 20 de setembro pode desviar a atenção para a verdadeira história. Quando [os observadores internacionais e jornalistas] saírem da Bielorrússia, uma vez terminado oficialmente o exercício, será difícil de perceber se todas as tropas e equipamento russo também o fizeram. O verdadeiro significado de Zapad pode ir muito para além do que virá nas manchetes”, escreve o Giles num artigo de opinião no Politico.