Alimentação. Bacon e Salsichas iguais a cigarros e amianto?

Quanto mais sabemos, menos sabemos

É uma das imagens mais fortes do documentário “What the Health”: uma mãe serve aos filhos para pequeno-almoço uma frigideira com cigarros. De onde surge a comparação? De uma revisão publicada em 2015 pela Organização Mundial da Saúde, que declarou que a carne processada é cancerígena e que a carne vermelha é, provavelmente, cancerígena. Salsichas, bacon, presunto e outras carnes processadas passaram a constar no grupo 1 das substâncias cancerígenas, que inclui tabaco, amianto e plutónio – as referências usadas no documentário. Já a carne vermelha integrou o grupo 2A, onde está, por exemplo, o herbicida glifosato. Na altura, os investigadores da Agência Internacional para a Investigação do Cancro da OMS (IARC na sigla em inglês) concluíram que ambas as carnes estão associadas ao cancro colorretal. Por cada porção diária adicional de 50 gramas de carne processada, o risco de cancro colorretal aumenta 18%. “Estas conclusões sustentam as recomendações atuais de saúde pública de que deve ser limitada a ingestão de carne.”

No outro lado da balança, dietas ricas em vegetais e frutas têm sido associadas a um efeito protetor de alguns cancros. O documentário “What the Health” acaba por ir mais longe e defender o vegetarianismo, dando exemplos de alguns doentes crónicos com problemas cardiovasculares que recuperaram depois de tirar a carne da alimentação. No documentário “Forks over Knives” (2011), a mensagem é a mesma, sendo retratados vários casos de pessoas que sofriam alguns problemas de saúde e, quando mudaram por completo a sua dieta, as doenças começaram a regredir. Um dos casos retratados é de um homem com colesterol elevado, diabetes e hipertensão. Tomava cerca de quatro comprimidos por dia e ainda insulina para controlar a diabetes, sentia-se sempre cansado e tinha dificuldades em dormir, até que resolveu mudar a sua dieta por completo.

Ao tornar-se vegetariano, deixou de tomar medicação. Será assim tão vantajoso? Em 1999, o Oxford Vegetarian Study, que seguiu 6 mil vegetarianos e 5 mil não vegetarianos recrutados no Reino Unido entre 1980 e 1984, concluiu que os vegans tinham níveis mais baixos de colesterol total e LDL, o chamado mau colesterol. Vegetarianos e pessoas que comiam peixe tinham valores intermédios. As taxas de mortalidade eram inferiores nas cobaias que não comiam carne, em particular por doença isquémica cardíaca e cancro. Uma outra conclusão foi que os vegetarianos, vegans e pessoas que só comiam peixe tinham metade do risco de precisar de uma apendicectomia de emergência. Por outro lado, alertava para que os vegans estavam em maior risco de carência de iodo.

Quanto à capacidade de a dieta reverter doenças, existem alguns estudos, nomeadamente para a diabetes do tipo 2. “Uma mudança de dieta consegue superar um comprimido”, alertou Susan Levin, uma das autoras da investigação da Faculdade de Medicina da Universidade George Washington. Os investigadores concluíram que pessoas que comiam uma dieta vegan pobre em gordura ou que incluíam ovo e laticínios na alimentação, mas cortavam nas carnes vermelhas, conseguiram baixar os níveis de hemoglobina A1C, que reflete os valores de açúcar no sangue, o que habitualmente se faz através de medicamentos. O incentivo é grande. Por cada descida de 1% nesta hemoglobina, o risco de complicações da diabetes desce mais de 25%. 

O que diz a ciência

Um artigo publicado no “The American Journal of Clinical Nutrition”, em 2009, concluiu que quem faz uma dieta vegetariana tem tendência a ter baixos níveis de colesterol e pressão arterial. O estudo também aponta para que as dietas vegetarianas equilibradas são mais ricas em fibras, magnésio, vitaminas, ferro e calorias, baixando o risco de acidente vascular cerebral, diabetes, obesidade e alguns tipos de cancro. 

O que dizem os peritos

“Existem alguns estudos que demonstram que a dieta vegetariana está associada a um menor risco de doenças cardiovasculares, bem como de mortalidade por este tipo de doenças”, refere Alexandra Bento, completando que uma dieta vegetariana devidamente planeada é uma “opção saudável e nutricionalmente adequada, pode ter efeitos benéficos na prevenção e tratamento de algumas doenças.” Isabel do Carmo concorda: “as dietas vegetarianas podem ser úteis para as doenças cardiovasculares”. Mas a médica endocrinologista deixa um alerta: por vezes, pode ser necessário complementar a alimentação com alguns suplementos de vitaminas, para prevenir carências que podem trazer outras complicações de saúde.