Um homem francês de 28 anos teve relações sexuais com uma menina de 11 anos. No entanto, em França, isto não quer dizer que tenha existido necessariamente uma violação.
“Vou ensinar-te a beijar”, terá dito o homem à criança, convencendo-a a ir até sua casa, no passado mês de abril. Já não era a primeira vez que tentava aliciar a menina, mas, desta vez, conseguiu trazê-la para o seu apartamento, nos arredores de Paris. Acabaram por fazer sexo nas escadas do prédio.
Quando chegou a casa, a criança contou aos pais o que se tinha passado. Foram à polícia apresentar queixa – “a nossa filha foi violada”, afirmaram. No entanto, esta semana, os procuradores franceses decidiram não acusar o alegado agressor. A justificação? Não tinham provas de que o homem tivesse sido violento, que tivesse obrigado a menina a submeter-se ao ato sexual ou ameaçado a alegada vítima. Assim, de acordo com a lei francesa, tratou-se de um ato “consentido”. O homem está apenas acusado de abuso sexual de menores e irá a julgamento em fevereiro.
A advogada da menina, Carine Diebolt, condenou publicamente a decisão do Ministério Público, argumentando que o homem foi agressivo com a criança, ameaçando manchar a sua reputação caso falasse sobre o que tinha acontecido. Diebolt afirmou também que uma criança desta idade não tem capacidade para dar um significado concreto a um consentimento numa situação destas. “Existe uma diferença entre ter curiosidade e consentir um ato sexual numas escadas com um homem de 28 anos”, argumentou.
Vários grupos de defesa dos direitos das crianças manifestaram-se contra esta decisão, exigindo uma revisão das leis em causa. “A questão do consentimento ou a falta do mesmo nunca deveria servir como argumento no caso da violação de uma criança”, defende um porta-voz da organização Voz das Crianças, citado pela imprensa.
Como funciona em Portugal?
De acordo com o artigo 164 do Código Penal português, o crime de violação é descrito como aquele em que alguém “por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa: a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos;”, bem como “quem, por meio não compreendido no número anterior, constranger outra pessoa” a sofrer as mesmas situações acima descritas.
Ou seja, a violação implica um constrangimento da vítima, independentemente da idade da mesma. Quem comete este crime em Portugal é punido com pena de prisão de 1 a 6 anos.
O artigo 171 do Código Penal fala de situações parecidas à que ocorreu em França, tratando-se de um artigo específico sobre o abuso sexual de menores.
“Quem praticar ato sexual de relevo com ou em menor de 14 anos, ou o levar a praticá-lo com outra pessoa, é punido com pena de prisão de um a oito anos. Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito anal, coito oral ou introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão de três a dez anos”, lê-se no documento. É também mencionado no artigo os crimes que envolvem importunação sexual de menores e os crimes praticados com intenção lucrativa.
Assim, ambos os casos são formas de violência sexual, mas representam crimes diferentes. O abuso sexual é a prática com crianças com menos de 14 anos de idade, sendo irrelevante que a vítima tenha ou não sido obrigada a praticar os atos sexuais. Já a violação implica o uso da força física, da violência, da ameaça para concretizar o sexual, subentendo-se sempre um não consentimento da vítima.