O mundo ‘laranja’. Nem geracional, nem ideológico: convencional

Se o partido não acaba na bancada parlamentar, há famílias que não se dividem por território, história, idade ou ideia. Há uma Nova Esperança, que ainda não o foi

Não há grandes partidos sem fações e o maior partido do parlamento não é diferente. Norte, sul. Conservadores, liberais. Novos, velhos. Eurocontidos, federalistas. Dentro do grupo parlamentar uma coisa, na estrutura nacional do partido outra coisa. O aparelho não é uma unidade, embora seja único. No caso do PSD, para uns, a discussão – o motivo para a reunião – deixou de ser a ideologia, como mais se vê (ainda que discretamente) no Partido Socialista, passando a ser uma divisão mais etária. “A idade é uma senha na fila de espera. Os anti-corpos que Hugo Soares teve para ser líder de bancada mostraram isso”, clarifica um deputado das últimas filas laranjas. Mas outros, na linha intermédia entre jovens e veteranos, veem a coisa de forma distinta. “Os grupos já não se organizam nem por geração, nem por território, organizam-se por conveniência”, aponta um senador dos sociais-democratas.

Ultimamente, a tendência ao ‘agrupamento’ dentro do PSD não tem sido a maior. Os difíceis tempos no governo (2011/2015) e os tempos menos fáceis na oposição (de ‘15 até hoje) fizeram não só as tropas reunirem em torno do líder em exercício – Pedro Passos Coelho – como o líder segurar as tropas em torno de si. Passos, que se confessou surpreendido com os resultados negativos nas autárquicas, estava antes pronto para ficar, e para poder ficar foi agarrando o aparelho no último ano, preparando-se para a recandidatura à liderança. Com a saída imprevista, as pontas soltaram-se e estão à espera de quem as segure até dia 2 de dezembro: quando os militantes votarão nas diretas para a sucessão. Mas a surpresa da saída de Passos Coelho levou os soldados para campo aberto. A estrutura mostrou-se a si mesma.

Antigos amigos reencontram-se, inimigos de sempre mantêm-se. O ciclo acelerado em que o PSD caiu, provocará fricções desse tipo. O mapa para detetá-las começa no Conselho Nacional, passa pelo grupo parlamentar e necessita de olhar para antigos congressos. Num partido ainda algo separado entre a ala cavaquista/barrosista que sustenta Rui Rio (Manuela Ferreira Leite, Morais Sarmento, Pacheco Pereira) e não gosta do legado menos ortodoxamente social-democrata do ‘passismo’ e entre esse dito legado, qualquer divisão que não a dois pode tornar o resultado da próxima reunião magna imprevisível.

No Conselho Nacional, a lista oficial, com força de direção, elegeu em 2016 trinta e três dirigentes, encabeçada por Luís Marques Guedes. Em segundo lugar, veio uma lista de antigos membros da JSD, com um grupo em que Pedro Duarte (ex-líder da ‘jota’ e este ano derrotado para a Assembleia Municipal do Porto) mantém forte influência. Em terceiro lugar, com sete conselheiros nacionais, veio a lista de Carlos Eduardo Reis (ex-líder da JSD de Braga), que conta com Sérgio Azevedo, vice-presidente do grupo parlamentar na Assembleia e com rostos que fizeram subir o percentil autárquico do partido nas eleições locais deste mês.

Indo ao parlamento, a dança tende a inverter-se. Quando foi noticiado que Luís Montenegro teria que a abandonar este ano a liderança parlamentar por excesso de mandatos, o aparelho tornou a soltar a máscara. Marques Guedes tornou-se o favorito da ala mais próxima a Pedro Duarte, crítica de Passos; Hugo Soares o favorito de Montenegro e de uma ala mais jovem e próxima à herança do ‘passismo’. Nessa ala mais jovem, há rostos conhecidos. É uma ‘Nova Esperança’ que ainda não o foi. O próprio Soares, Duarte Marques e António Leitão Amaro são exemplos. Os últimos dois estiveram com Paulo Rangel em 2010 e transitaram saudavelmente para Passos depois da sua subida à liderança. Os quatro ascenderam na ‘jota’ com Pedro Rodrigues, que deixou de ser deputado em 2011 e se distanciou do ‘passismo’ com um movimento alternativo recente.

Terminando em Lisboa que vem concentrando alguns dos rostos mais autónomos mas de relevância inconstante, veem-se José Eduardo Martins, que foi de crítico do governo PSD/CDS para dar a cara pelo partido nas autárquicas; Mauro Xavier, que saiu de presidente do PSD/Lisboa em rutura com a sede nacional, e Miguel Pinto Luz, o vice-presidente da Câmara de Cascais que vem mostrando que o seu foco passou do nível autárquico para nível nacional. No norte, destaca-se outro autarca com futuro de esperança mais do que local: é Ricardo Rio, em Braga.