Catalunha. Espanholistas invadem as ruas de Barcelona

Os apoiantes da Espanha una e indivisível fizeram no domingo a sua maior mobilização de sempre. Vindos de todos os pontos de Espanha, provaram que não é sempre verdade a palavra de ordem independentista de que “as ruas serão sempre nossas”. Este domingo, Barcelona foi tomada por espanhóis 

Muitas horas antes de a manifestação começar, já centenas de pessoas estavam junto à sede da delegação do governo de Madrid a confraternizar e a dar vivas às forças de segurança espanholas que guardam o edifício. Vieram camionetas e comboios de toda a Espanha.  A afluência era tão grande que, duas horas antes do início oficial da manifestação, a Praça de Urquinaona já estava a abarrotar de unionistas. 

Centenas de milhares de pessoas desfilaram nas ruas de Barcelona a favor da unidade de Espanha e contra o independentismo catalão, numa manifestação que foi a maior de sempre dos “espanholistas” na Catalunha. Desfilaram pelo centro de Barcelona 350 mil pessoas, segundo números fornecidos pela polícia, e mais de 900 mil, segundo os organizadores, a Sociedade Civil Catalã – uma espécie de equivalente espanholista da Assembleia Nacional Catalã, que organiza as maiores manifestações independentistas.

A marcha deste domingo pretende dar voz aos catalães que se consideram silenciados pelo processo que conduziu ao referendo de dia 1 de outubro, considerado ilegal. Sob o lema “Basta! Vamos recuperar o bom senso”, a organização especificou a intenção de deixar a Praça de Urquinaona ao meio-dia, continuar pela Via Laietana e terminar junto à Estació de França.

A última manifestação espanholista, no sábado anterior ao referendo de 1 de outubro, juntou menos de 5 mil pessoas. Depois de mais uma semana de agitação e perante a possibilidade de o parlamento catalão fazer uma declaração unilateral de independência (DUI), os anti-independentistas quiseram mostrar que também conseguiam ter força nas ruas da Catalunha, que até agora só tinham assistido a grandes manifestações independentistas, com milhão e meio em 2011 e dois milhões em 2012 – e 700 mil pessoas segundo a polícia, milhão e meio segundo os organizadores, no dia da recente greve geral, 3 de outubro. 

A manifestação foi encabeçada, entre outros, pelo escritor peruano Mario Vargas Llosa e por dirigentes do PP, do Ciudadanos, a ministra da Saúde, Dolors Montserrat, o delegado do governo de Espanha na Catalunha, Enric Milo, a presidente da Comunidade de Madrid, Cristina Cienfuentes, e o ex-presidente do Parlamento Europeu Josep Borrell. Durante todo o cortejo ouviram-se gritos exigindo a detenção do presidente do governo da Catalunha – “Puigdemont para a prisão” – e elogios às forças de segurança espanholas: “Viva Espanha e a Guarda Civil”. Por seu turno, as forças policiais autonómicas, os Moços de Esquadra, que garantiam a segurança do cortejo, foram assobiados e insultados com gritos de “traidores”, “vão-se embora”.

Os polícias catalães não foram os únicos a merecer as agressões verbais dos muitos manifestantes. O líder do Podemos, Pablo Iglesias, que estava na estação de Sants de Barcelona para apanhar o comboio para Madrid, foi recebido pelos muitos manifestantes que aí chegavam de vários pontos do país aos gritos de “viva Espanha”, “vai-te embora”, “traidor”.

Apesar da orientação dos organizadores de que só seriam permitidas na manifestação as bandeiras oficiais de Espanha, Catalunha e União Europeia, algumas centenas de manifestantes de extrema-direita levavam bandeiras espanholas com o escudo do tempo do franquismo e bandeiras da falange. Porém, ao contrário da última manifestação espanholista, realizada a 30 de setembro, eram muito minoritários e não tentaram cantar no final o hino franquista, “Cara al sol”. 

Os manifestantes estavam muito aguerridos e ouviram-se várias vezes palavras de ordem anti-independentistas como “vamos a eles”, e a exigir que o governo catalão e os movimentos sociais e partidos independentistas fossem criminalizados e os seus membros detidos. De tal forma que, na sua intervenção, o ex–presidente do Parlamento Europeu Josep Borrell tentou esfriar alguns dos ânimos mais exaltados: “Para a prisão só vai quem a justiça decidir que deve ir.” E contra os repetidos apelos para serem boicotados produtos catalães, ironizou e pediu que os manifestantes também consumissem cava catalã (vinho da região).

O Prémio Nobel peruano Mário Vargas Llosa sublinhou a participação plural e diversificada na gigantesca manifestação: “Está aqui gente de toda a Espanha, até do Peru”, disse, sorrindo. “A paixão pode ser perigosa quando a move o fanatismo e o racismo. A pior de todas é a paixão nacionalista”, disse, no encerramento do desfile, o escritor, entre aplausos e gritos de “viva Espanha” e “somos espanhóis”. “O nacionalismo encheu a história da Europa, do mundo e de Espanha de guerra, sangue e cadáveres”, relembrou, concluindo que “nenhuma conjura independentista destruirá a democracia”. O presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, mandou uma mensagem, pela sua conta de Twitter, a apoiar os manifestantes: “Em defesa da democracia, a Constituição e a liberdade. Preservaremos a unidade de Espanha.” 

Segunda, a escalada continua. Os independentistas têm convocadas uma série de pequenas manifestações até terça-feira, dia que está prevista a ida do presidente catalão, Carles Puigdemont, ao parlamento catalão para discutir “a situação política” – isto se o Tribunal Constitucional de Madrid, mais uma vez, não proibir a reunião, alegando que pode ser usada para ser feita uma declaração unilateral de independência.