Joana Schenker: “Se calhar ainda nem cheguei ao meu pico de forma!”

No passado domingo fez história ao tornar-se a primeira atleta portuguesa a sagar-se campeã mundial de bodyboard, mas ficar por aqui é, para Joana, uma não questão 

Sair pela porta grande seria o pensamento lógico de muitos atletas se, aos 30 anos, conquistassem um dos títulos mais importantes da respetiva modalidade. Mas, um dia depois do feito na Praia da Nazaré, Joana Schenker, atleta que, de resto, apresenta no seu currículo vários troféus a nível nacional e europeu, bem como uma medalha de bronze nos ISA World Bodyboard Games, fala da “realização” da vitória e destaca que “há muito mais para evoluir, aprender” e, admire-se… “conquistar”! O i foi conhecer um pouco mais da desportista que se define, nas redes sociais, como uma bodyboarder “de corpo e alma” que passa “cada hora na modalidade a treinar, a ensinar e a competir”. 

Apelido alemão… Filha de mãe e pai alemães?

Sim, sim, são ambos alemães, mas eu já nasci em Portugal. Em Sagres.

Porque é que os seus pais se mudam para Portugal?

Os meus pais gostavam muito de viajar. Passaram, por acaso, pelo Algarve e apaixonaram-se! Era uma terra com uma energia muito boa e acabaram por ficar. Muitos estrangeiros ficam [no Algarve] porque é um sítio mesmo muito bom e era o que todos procuravam quando tentavam escapar da Alemanha. E pronto, os meus pais acabaram por ficar e criaram a família num ambiente muito mais descontraído e natural… 

E quando é que se fixam no Algarve?

Bom [pausa], há mais de 30 anos, sei que foi porque eu tenho 30 e já nasci cá [risos]. Mas [pausa] não lhe sei dizer o ano exato…

Como aparece o bodyboard na sua vida?

O bodyboard é a modalidade de Sagres. Muita gente pratica esta modalidade e é um desporto em que se sagraram uma data de campeões que nos inspiraram. Os meus amigos praticavam bodyboard e eu acabei por experimentar com eles e fiquei colada!

Que idade tinha quando começou a praticar?

Tinha 13 anos! 

Qual foi a reação dos seus pais quando começaram a perceber que o bodyboard estava a tornar-se uma coisa mais séria? Para além daquilo a que se costuma apelidar de atividade extracurricular? 

Apoiaram sempre. A minha mãe, então… Foi incansável, apoiou-me ao longo de todo o meu caminho e com toda a sua força! Levava-me à praia, ficava à minha espera… Ela fez tudo mesmo!

Quando é que o bodyboard passa a ser o único foco?

A partir do 12.o ano. Estudei até ao meu 12.o ano, depois não foi possível conciliar as duas coisas. Não ia funcionar, e escolhi aquilo de que mais gostava.

Foi quatro vezes campeã nacional, a semana passada sagrou-se campeã europeia, também pela quarta vez e, agora, aos 30 anos, tornou-se campeã mundial. Sente que a sua missão foi cumprida?

Neste momento sinto-me realizada porque conquistei tudo aquilo que quis. No entanto, não tenho aquela sensação de que já acabou, antes pelo contrário. Há muito mais para evoluir, para aprender e até para conquistar. Sinto que houve um capítulo que se fechou por ter conquistado um título mundial, que é aquilo que toda a gente deseja conquistar. Estou… realizada! [risos]

Além de conquistar o título mundial, fez história. É a primeira pessoa a atingir este feito. Tem um sabor especial?

Finalmente, este título veio para Portugal e é uma honra que tenha sido eu a consegui-lo. Todo o carinho que recebi, das pessoas que me apoiaram, foi incrível. Não só por mim, mas por todos aqueles que queriam este título para Portugal. É muito especial e estou superfeliz.

Basta olhar para o seu percurso para perceber que conquistas não lhe faltam… Contudo, acha que foi preciso chegar este título para ter uma visibilidade que, se calhar, nunca tinha tido?

De certeza que vai ajudar, mas de que forma vai influenciar a minha vida é que ainda não consegui perceber, mas certamente que será bom, tanto para mim como para a modalidade. 

Sente que teve de colocar a sua vida pessoal em standby para se dedicar inteiramente ao bodyboard? Que esse possa ter sido um dos grandes sacrifícios que a modalidade exigiu? Constituir família, agora que já atingiu os mais importantes títulos, começa a tornar-se uma prioridade ?

Não, ainda não. Eu tenho a sorte de o meu namorado [Francisco Pinheiro] ser também o meu treinador há muitos anos. [risos] É um trabalho em conjunto. Ele acompanha-me em quase todas as competições, é um trabalho de equipa. É o nosso estilo de vida, nem eu nem ele queremos mudar isso, pelo menos para breve. Ainda há muito que fazer. Há muitos anos que escolhemos esta vida e, agora, os frutos desse trabalho estão a aparecer.

Até que idade acha que consegue continuar a este grande nível?

Não sei, acho que, se calhar, ainda nem cheguei ao meu pico de forma. No bodyboard, a evolução é constante e contínua, muita coisa aprende-se com a experiência. Nesta modalidade, os atletas mais velhos saem em vantagem. Não sinto de maneira nenhuma que esteja a ficar velha! [risos]

O que é que faz um atleta? Talento, trabalho…

E paixão pelo que se faz. Essas três coisas fazem com que uma pessoa se aguente no desporto, tenha sucesso e desfrute do caminho.

Depois de um título mundial, qual o próximo objetivo que se pode ter em competição?

Manter-me no topo. Se no próximo ano conseguir manter-me no topo, então o meu objetivo será cumprido, mas os meus pensamentos ainda não estão lá! [risos]

Ainda é cedo para perguntar, mas é mais difícil manter o topo ou chegar lá?

Julgo que manter o topo é algo que, se treinarmos e trabalharmos, conseguimos quase automaticamente, mas é sempre um objetivo e um desafio. Há atletas muito boas e, por isso, é um grande desafio.

Já sabe como vai gerir o próximo ano?

Ainda nem pensei no próximo ano. Na quinta-feira vou até às Canárias, onde vai decorrer a última etapa do Mundial. Desta vez, já vou com calma e sem pressão nenhuma. Agora vou descomprimir um bocadinho…

Ficar ligada à modalidade é algo certo?

De certeza que sim. Vou ficar ligada a esta modalidade, provavelmente, até ao fim da minha vida. Todo o meu crescimento foi em conjunto com o bodyboard e nunca me vou desligar disso. Se será sempre a minha atividade principal? Aí já não sei. Neste momento há um projeto em Sagres que tem uma escola de formação onde eu também sou colaboradora. Damos aulas a jovens e iniciamos a sua competição. Esse tipo de trabalhos, eu já faço e é algo que é para continuar. Numa perspetiva futura, não sei o que virá…

Como tem visto o crescimento do bodyboard?

Há cada vez mais pessoas dentro de água, tanto no bodyboard como no surf. Houve um boom em Portugal e no resto do mundo. O mito de ser perigoso e complicado está a desaparecer. É cada vez mais uma modalidade extremamente acessível a toda a gente e isso nota-se na praia. O bodyboard é o veículo ideal para uma pessoa se divertir e é quase impossível sair da água sem um sorriso!

A sua opção de vida levou a que conhecesse muitos sítios do mundo… Sair de Sagres e ir viver num outro país que a tenha fascinado é uma opção?

Não, não! Viajar é das coisas que mais gosto de fazer mas, para viver, só mesmo em Sagres, não me vejo em mais lado nenhum. É a minha terra e o único sítio onde realmente eu digo “eu sou daqui!”. Nem na Alemanha nem no resto de Portugal me sinto tão em casa como em Sagres. Não me vejo a mudar por razão nenhuma!