Numa breve introdução, este conceituado responsável da Igreja disse, entre outras coisas para refletir e meditar, algo que me despertou a atenção: «Não há problema com o dinheiro, desde que sejamos nós a mandar nele».
Este simples mas profundo pensamento leva-me a perguntar: será que somos nós a mandar no dinheiro ou é o dinheiro que manda em nós? O mundo em que vivemos gira à volta de convicções, de normas e de valores, ou, pelo contrário, à volta de conveniências sempre em função do dinheiro?
A notícia da transferência milionária do jogador de futebol Neymar, trocando o seu clube, o Barcelona, para ingressar num clube francês, numa operação que ultrapassou os duzentos milhões de euros, provando inequivocamente que o dinheiro falou mais alto, diz tudo e mostra bem quem manda neste conturbado planeta. E quase diariamente, um pouco por toda a parte, temos conhecimento de outras notícias ‘bombásticas’ em áreas diferentes, chocando-nos com operações inimagináveis, provando que é de facto o dinheiro quem manda no mundo e que tudo vive em função dele.
Do outro lado da barricada, o panorama não é mais animador. Vemos países designados subdesenvolvidos, com seres humanos sem o mínimo de condições de sobrevivência, onde só existe miséria, proliferam doenças e falta tudo para as combater, ou gente a viver nas ‘trevas’, atingida pelo desemprego, pobreza, falta de família, sem perspetivas de voltar a encontrar a luz nas suas vidas e estendendo a mão à caridade.
É bom não esquecer aqueles que, anónima e desinteressadamente, dedicam a sua vida a cuidar dos outros, em que o dinheiro não manda, mas são donos da maior riqueza que Deus nos pode dar. Desses pouco se fala e são desconhecidos da maioria das pessoas, mas é para eles que vai todo o meu apreço e a minha maior admiração.
Na minha qualidade de médico de família – e com uma vasta experiência de muitos anos no exercício de funções –, poderei destacar algumas situações reveladoras dos tempos que estamos a viver.
O número, talvez crescente, daqueles que vivem sós (não apenas idosos), deitando contas à vida para conseguirem sobreviver devido ao desemprego ou aos baixos salários, com despesas fixas a pagar onde aparece sempre a inevitável conta da farmácia – ouvindo-se cada vez com maior frequência a pergunta de quanto irá custar a medicação (questão que antigamente nem sequer se colocava), quando não mesmo o pedido para ser receitado o medicamento mais barato, contrariando até o critério clínico.
E quantos casos não há de pessoas obrigadas a esperar pelo final do mês para, com a tão desejada pensão, liquidarem na farmácia a conta da medicação já previamente dispensada? E aqueles que abdicam de uma das tomas para o fármaco durar mais tempo?
É este o nosso mundo. De um lado vê-se o dinheiro a mandar nele – e do outro seres humanos sem o mínimo de condições para viverem dignamente. Todos sabemos que não há soluções eficazes para os problemas aqui levantados, mas, pela minha parte, revejo-me na posição defendida por D. João Marcos quando diz que devemos ser nós a mandar no dinheiro e não o contrário.
Afinal, «que mundo estamos nós a construir?». Com todo este cenário desolador, não é fácil acreditar num amanhã melhor mas é preciso manter a esperança de que um outro tempo há de chegar. A mensagem que há muito recebi, e cujo final venho agora partilhar, traça um caminho a percorrer na direção do mundo novo que todos desejamos: «Onde a esperança continue a ter luz e a fé nos seja a força de cada dia». (Joaquim Martins dos Santos).